DEUS  E  ABRAÃO

 

O Deus Supremo tinha prometido que não levaria a alma de Abraão a não ser que o homem quisesse morrer e lhe pedisse isso.

 

Entretanto, quando a vida de Abraão já estava chegando aos 500 anos, Deus o aconselhou que já havia passado muito da hora de ele partir , mas Abraão não aceitava a verdade. Então, Deus decidiu mostrar-lhe a verdade de outra forma e , para tal, enviou um anjo disfarçado como um velho decrépito quase  totalmente incapacitado.

 

O velho parou diante da porta da casa de Abraão e lhe disse: “ Oh Abraão, gostaria de comer alguma coisa”.  Abraão ficou intrigado ao ouvi-lo dizer isto. “Morra”, exclamou Abraão. “Seria melhor para você do que continuar vivendo nestas condições.”

 

Abraão sempre tinha  comida pronta em casa para seus convidados que passavam por lá. Ele deu, portanto, ao velho uma tijela de caldo, com carne e migalhas de pão. O velho se sentou e comeu. Engolia com dificuldade e assim que pegva a comida esta lhe caía da mão, espalhando-se pelo chão. “Oh, Abraão”, disse ele, “me ajude a comer”. Abraão pegou a comida na mão e a levou aos lábios do velho.  Mas ela escorregou por sua barba e sobre o peito. 

 

“Qual a sua idade?”, perguntou Abraão. O velho disse um número ligeiramente maior que a idade de Abraão.  Aí Abraão exclamou: “Oh. Senhor Nosso Deus, leve-me consigo antes que eu chegue á idade deste homem e fique nas mesmas condições em que ele está agora.

 

Assim que Abraão pronunciou estas palavras, Deus se apossou de sua alma.

 

The Book of Arabic Wisdom and Guile - seculo XIII

 

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O MENTIROSO

 

Era uma vez, na Armênia, um rei que, sentindo-se num estranho estado de espírito e precisando se divertir um pouco, enviou arautos por todo reino proclamando o seguinte: “Ouçam todos! Aquele que provar ser o maior mentiroso da Armência receberá uma maça de ouro das mãos  de Sua Majestade, o Rei!”

 

Gente de todas as cidades e aldeias, de todos os níveis e condições, príncipes, mercadores, fazendeiros, sacerdotes, ricos e pobres, altos e baixos, gordos e magros vieram em multidão ao palácio.

 

Não faltavam mentirosos naquela terra, e cada um contou a sua mentira ao rei. Governantes, entretanto, estão acostumados com todos os tipos de mentira, e nenhuma daquelas convenceu o rei de que era a melhor.

 

Ele começou a se cansar com este novo esporte e já estava pensando em cancelar a competição sem declarar um vencedor, quando apareceu diante dele um homem pobre esfarrapado, carregando debaixo do braço uma grande ânfora de barro.

 

“O que posso fazer por você?”, perguntou Sua Majestade. “Senhor!”, disse o homem, ligeiramente espantado, “Sem dúvida, não se  recorda? Deve-me um pote de ouro e vim pegá-lo.” “Você é um grande mentiroso!”, exclamou o rei. “Não lhe devo nada!”

 

“Um grande mentiroso eu sou?”, disse o homem pobre. “Então me dê a maça de ouro!”  O rei, percebendo que o homem estava tentando lhe passar a perna, esquivou-se. “Não, não! Você não é mentiroso!”  “Então, me dê o pote de ouro que me deve, senhor”, disse o homem. O rei se viu num dilema e lhe entregou a maça de ouro.

 

CONTOS E FÁBULAS DO FOLCLORE ARMÊNIO, RECONTADOS POR CHARLES DOWNING, 1993

 

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"A verdade é geralmente vista, raramente ouvida".

 

Baltasar Gracián

 

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Em geral evita-se a verdade porque ela é feia e desagradável. Não apele para o que é verdadeiro ou real se não estiver preparado para enfrentar a raiva que vem com o desencanto. A vida é tão dura e angustiante que as pessoas capazes de criar romances ou invocar fantasias são como oásis no meio do deserto: todos correm até lá, mesmo sabendo que um oásis não passa de um simples oásis!

 

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Texto compilado extraído de livro dos autores Robert Greene e Joost Elffers