OS DOIS CÃES
O tecido social também é um vasto viveiro de ressentimentos e muita inveja. Diariamente tenta-se apagar o brilho alheio com as pedradas da inveja. Em todas as épocas da humanidade, presenciamos pessoas que dominam a arte da dissimulação, da adulação, que cedem aos superiores a fim de assegurarem o seu poder sobre outros de forma dissimulada e leviana. A seguir descrevo uma fábula inspirada nessas pessoas!
BRABOS , o fiel cão de guarda que serve ao seu senhor com dedicação, vê sua velha amiga “JOUJOU”, a cadelinha de estimação de pêlo encaracolado da cor de neve, sentada na janela sobre uma macia almofada de penas.
Sorrateiro, ele se aproxima afetuosamente; e ali, na chuva, debaixo da janela, abana o rabo e saltita. “ Que vida você leva agora JOUJOU, desde que o senhor a levou para a sua mansão? Você deve se lembrar, sem dúvida, de como passávamos fome no pátio. Como é o seu serviço atualmente ?
“ Seria um pecado reclamar da minha sorte”, respondeu "JOUJOU”. Meu senhor me dá toda a atenção possível. Vivo na riqueza e na abundância, e, como e bebo em peças de prata. Brinco com o senhor e, se fico cansada, descanso sobre tapetes ou numa almofada macia. E como você está ?
“Eu?”, responde BRABOS, deixando cair a cauda como um chicote, baixando a cabeça, “Vivo como costumava viver. Passo frio e fome; e aqui, enquanto guardo a casa do meu senhor, tenho que dormir encostado no muro, fico encharcado na chuva e se começo a latir na hora errada sou chicoteado.” .Mas como você – JOUJOU – tão pequena e fraca, conseguiu cair nas graças do senhor, enquanto eu me esfolo inutilmente ? O que você faz?
“ O que eu faço ?, é uma boa pergunta ! respondeu JOUJOU, com ar de zombaria. “ Eu ando sobre as patas traseiras.” Aqui entre os senhores é igual as árvores aí do quintal: “As melhores árvores retas são cortadas, as retorcidas permanecem de pé.”
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Fábulas, Ivan Kriloff, 1768 – 1844.
MORAL:
Querendo agradar ou impressionar, não exagere exibindo seus próprios talentos ou poderá conseguir o contrário - inspirar medo e insegurança nas pessoas acima de você. Faça com que seus mestres pareçam mais brilhantes do que são na realidade e sintam-se confortavelmente superiores. É o que os JOUJOUs fazem.
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Não se deve ser direto demais. Veja a floresta. As árvores retas são cortadas, as retorcidas permanecem de pé.
Kautilya, filósofo Hindu, século 3 a.C.
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É sensato ser polido; por conseguinte, é idiotice ser rude. Criar inimigos com a falta desnecessária e proposital de civilidade é insensatez tão grande quanto tocar fogo na própria casa. Porque a polidez é como uma moeda reconhecidamente falsa, e com a qual é tolice agir com avareza.
O homem de bom senso será generoso ao usá-la... A cera, substância naturalmente dura e quebradiça, pode se tornar macia aplicando-se um pouco de calor , adquirindo a forma que mais lhe agradar.
Da mesma maneira, sendo polido e gentil, você pode tornar as pessoas dóceis e servis, mesmo que tendam a ser rabugentas e malevolentes.
Portanto, a polidez é para a natureza humana o que o calor é para a cera.
Arthur Schopenhauer, 1788 - 1860
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UMA HISTÓRIA REAL PARA REFLEXÃO
Luís XIV, o rei-sol, era um homem orgulhoso e arrogante que desejava ser o centro das atenções sempre. Não suportava ser superado em prodigalidade por ninguém e certamente não por seu ministro das Finanças, o Sr.Fouquet.
Para o lugar de Fouquet, Luís escolheu Jean-Baptiste Colbert, um homem famoso por sua parcimônia e por promover as festas mais insípidas de Paris. Colbert garantiu que todo o dinheiro liberado do tesouro fosse parar direto nas mãos de Luís. Com o dinheiro, Luís construiu um palácio ainda mais magnífico do que o de Fouquet - o glorioso palácio de Versalhes. Ele usou os mesmos arquitetos, decoradores e paisagistas. E em Versalhes, Luis deu festas ainda mais extravagantes do que aquela que custou a Fouquet a sua liberdade.
Vamos examinar a situação. Na noite da festa, quando Fouquet ia apresentando a Luís um espetáculo após o outro, cada um mais imponente do que o anterior, ele imaginava estar demonstrando a sua lealdade e devoção ao rei. Não só ele achava que a festa o faria cair de novo nas graças do rei, como pensava que ela mostraria o seu bom gosto, as suas relações e popularidade, tornando-o uma figura indispensável ao rei e provando que ele seria um excelente primeiro-ministro. Mas, cada novo espetáculo, cada sorriso de apreço dos convidados dirigido a Fouquet, fazia Luis achar que seus próprios amigos e súditos estavam mais encantados com o ministro das Finanças do que com o próprio Rei e que Fouquet estava na verdade ostentando a sua riqueza e poder. Em vez de lisonjear Luis XIV, a sofisticada festa de Fouquet ofendeu a vaidade do Rei. Luis não reconheceria isso diante de ninguém, é claro - pelo contrário, ele encontrou uma desculpa conveniente para se livrar do homem que inadvertidamente, o fizera se sentir inseguro.
É este o destino, de uma forma ou de outra, de todos aqueles que desestabilizam a noção de identidade do mestre, cutucam a sua vaidade, ou o fazem desconfiar da própria superioridade.
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No início da noite, Fouquet estava no topo do mundo. Quando ela terminou, ele estava no chão.
Voltaire, 1694 - 1778
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MORAL:
Não se iluda pensando que a vida mudou muito desde à época de Luis XIV e dos Médici. Quando você se expõe ao mundo e mostra os seus talentos é natural que isso desperte todos os tipos de ressentimentos, invejas e outras manifestações de insegurança. É de se esperar que isto aconteça. Se por um lado, você não pode passar a vida se preocupando com os sentimentos mesquinhos dos outros; Por outro lado, é uma falha de percepção mortal não se preocupar com quem está acima de você. Brilhar mais do que o mestre é um grande erro, na época da aristocracia era mortal.
SOBRE A BAJULAÇÃO
Idiotas em geral gostam de ser bajulados, é inegável. Todo indivíduo que se considera um ser pensante, porém, recusa todas as formas de bajulação, como um insulto a sua inteligência. Quem bajula com certeza quer obter um favor ou alguma coisa que o bajulado possui. O elogio barato é uma espécie de droga que prejudica o raciocínio, o que dá a quem o faz uma vantagem temporária - até que o efeito passe e a vítima desperte, com o coração cheio de ressentimento.
A bajulação não passa de um truque psicológico vulgar que charlatães e desonestos utilizam para levar os outros a um estado de relaxamento, de que se aproveitam para tirar deles alguma coisa. A bajulação é uma das principais ferramentas de todo vigarista. Por meio dela, espiões perigosos ardilosamente conquistam a confiança de autoridades para arrancar-lhes informações.
Mulheres interesseiras e de moral duvidosa empregam a bajulação para quebrar a resistência de homens que não respondem ao simples apelo sexual. Quem se deixa influenciar pela bajulação perde a batalha antes de lutar. De modo geral, os executivos gostam de cercar-se de funcionários que sempre concordem com eles, mas com uma equipe de contestadores estariam bem mais seguros ! O ego humano precisa de proteção, pois é enganador e responde prontamente a qualquer tipo de bajulação.
Um dos erros mais comuns é pedir o conselho de amigos, ainda que corretamente conquistados e influenciados. A razão é que os amigos, por medo de ofender, muitas vezes preferem elogiar a falar francamente e, assim, emitem opiniões que podem levar a decisões equivocadas.