NA CORTE ARISTOCRÁTICA
( A Arte do Engano )
Das razões de elaborar este texto
Diversas vezes me aconteceu sentir algum mal estar causado pela reflexão da triste aventura sobre o que presenciei do comportamento humano nos diversos tipos de ambiente social onde existe competitividade por vantagens pessoais muito desiguais e pela fadiga suportada pelos meus órgãos postos no dever de pormenorizar as respectivas circunstâncias narradas de forma que as pessoas de minha amizade, dignas de confiança, pudessem captar com o auxílio de sua imaginação o lado emocional dos fatos.
Então, a fim de eximir-me do castigo de repetir a minha experiência às pessoas de minha amizade elaborei este texto compilado de diversos livros de diversos autores que tratavam de assuntos relacionados com a mesma visão crítica do assunto aqui tratado.
E, despertando o lado emocional do leitor, espero que esses talvez possam, teatralizando a história e colocando-se no lugar dos personagens, produzir a pedagogia da indignação e educá-los, ao invés de gerar mais insensibilidade.
Uma história contada friamente no microcosmo da sala de aula não estimula o altruismo; piora e não melhora a intelectualidade dos alunos, ao contrário, faz parecer banalidade até mesmo grandes tragédias.
Quantos homens sabem observar?
E, desses poucos que sabem, quantos observam com a luz da sabedoria tanto os outros quanto a si próprio?
A nossa sensibilidade é a identidade que nos distingue dos demais companheiros humanos, é nossa contribuição única para o mundo, nossa missão pessoal.
A cultura ajuda-nos a observarmos e a encontrarmos essa missão que pode ser o trabalho de toda uma vida, mas, mesmo assim, apenas o fato de querer buscá-la a cada dia com mais sabedoria já nos permite vislumbrar saber onde poderemos chegar.
A cultura também ajuda-nos a sermos resilientes ( capacidade de recuperação ).
A resiliência é a arte de navegar pelas adversidades. Se um trauma o transtornou e o conduziu até uma cascata de problemas, numa direção na qual preferia não ter ido, o resiliente recorrerá aos recursos internos impregnados em sua memória e lutará para não se deixar arrastar pelo curso natural das pedradas diárias da ignorância e inveja alheias da vida.
Como disse o filósofo alemão Nietzsche:
"Quando as agressões não nos matam, acabamos ganhando uma experiência essencial que nos ajudará a salvar-nos e a outras pessoas em futuras idênticas circunstâncias."
+++
A QUEM PODE INTERESSAR ESSE TEXTO ?
Para suportar minha seriedade, é necessário possuir uma integridade intelectual levada aos limites extremos. Estar acostumado a viver no cimo das montanhas - e ver a imundície da hipocrisia abaixo de si e ter se tornado indiferente a ela.
Nunca perguntar se a verdade será útil ou prejudicial. Possuir uma inclinação - nascida da força - para questões que ninguém possui coragem de enfrentar; ousadia para o proibido; predestinação para o labirinto. Uma experiência de sete solidões. Olhos novos para o mais distante. Uma consciência nova para verdades que permanecem mudas. E um desejo de economia em grande estilo: economia de acumular sua força, seu entusiasmo, sua auto-reverência, seu amor-próprio, sua absoluta liberdade para com sua consciência....
Muito bem ! Apenas esses são meus leitores, meus leitores predestinados: que importância tem o resto ?
É preciso tornar-se superior em grandeza de alma - em desprezo - à manada na humanidade, sobretudo aquelas que ambicionam ou estão no falso poder com seus falsos valores.
Vamos ao assunto
No passado, o poder público era centralizado nas mãos de um rei e um punhado de seus ministros. Só o Rei e seus "amigos" tinham poder. Com o passar dos séculos, o poder público foi se tornando cada vez mais difuso e democratizado, espalhado e distribuído entre muitas pessoas. Entretanto, o poder mudou em número mas não em essência. Pode haver menos tiranos poderosos exercendo o poder de vida e morte sobre milhões, mas estes poucos foram substituídos por milhares de pequenos tiranos governando 'reinos' menores e impondo a sua vontade indiretamente para demonstrar ou manterem-se sugando os benefícios do poder ou por simples razões pessoais de moral inferior: inveja, vaidade, egoismo,...pois nesta área a natureza humana não muda.
Viver na ilusão de que este tipo de poder centralizado não existe mais é cometer intermináveis enganos, desperdiçar tempo e energia contra si próprio. Gente ambiciosa, sem escrúpulos, fingem que o poder é insignificante e que é dividido entre muitos, mas, por dentro, ficam de olho nos inevitáveis poucos lugares do grupo social que dão as cartas. São esses que eles ambicionam, em geral, para obterem o benefício egoísta do interesse próprio, sem preocuparem-se com o prejuízo de terceiros.
Poder-se-ia deduzir o grau ou a medida em que lhes é detestável a vida de acordo com o modo e a intensidade pelo qual falseiam sua imagem, de certa forma, penosa vingança contra a realidade e, no longo prazo, um tiro no próprio pé, tal como ocorrem com os tantos casos de pobres gastando o que não podem para se passarem por ricos... e, no final, por fugirem da verdade de como deveriam reagir à realidade, terminam verdadeiramente miseráveis...(...)
Creiam, o canibalismo não foi extinto na atualidade, apenas assumiu outras formas dissimuladas. Alguns anulam seus pares em nome de seus dogmas, outros em nome da nação, religião, ideologia, raça, teoria científica, e muitos outros 'nobres' motivos...
Em toda a história da humanidade sempre houve uma “Corte” formada em torno de uma pessoa no Poder na qual todos os seus ocupantes vivem cercados por um bando de "cortesãos" invejosos esperando ansiosamente que um outro caia em desgraça..;
Onde o que prevalece não é a meritocracia e a moralidade, mas sim a imoralidade, o peleguismo e a bajulação servil, a maioria por ser de caráter ruim, Vivem representando como atores felizes à espera de aplausos em um cenário de valores invertidos, mas no íntimo são infelizes, vazios, insatisfeitos e inseguros financeiramente quanto às perspectivas de futuro. Ao invés de se construírem cada vez mais no tempo, sugam-se, e tentam destruir o sucesso alheio.
Naquela época, a figura principal do Poder era a do Rei, Rainha, Vassalos, mas isso ocorria ( e ainda ocorre na época contemporânea ) em diversos níveis de Poder tanto em organizações privadas quanto públicas.
+++
Na época da aristocracia palaciana os homens que pretendessem viver tranquilo, de coração leve, alma em paz, sem nostalgia, sem impaciência, sem nada a provar, sem se importarem em parecer nada; sem nada buscarem de desnecessário na vida; que andassem acompanhados da simplicidade, para prosperar e serem felizes sob um governo imperial e aristocrático deveriam abandonar a Corte ou serem um camaleão capaz de refletir as cores da atmosfera que o circundava – um Proteus capaz de assumir qualquer forma.
Não podiam demonstrar ou comentar nem o ódio, nem o amor. Só podiam ser conduzidos pelo interesse próprio e jamais pelo sentimento. Deveriam enxergar além da cortina de fumaça dos comportamentos e compreender o que estava por detrás das reações de cada cortesão, perceber os becos da alma e as vielas da emoção; ser sutis, flexíveis, secretos, fraudulentos, inescrutáveis, as mulheres insinuantes, egoístas, às vezes, ou melhor, quase nunca sinceros, em muitas vezes pérfidos, sempre escondendo parte do seu conhecimento e sobretudo de suas verdadeiras intenções.
Deveriam comprazer-se em um só tom de voz, ser paciente, suportar em silêncio, senhor perfeito de suas atitudes, frio como o gelo quando qualquer outro homem se inflamaria; deveriam possuir o fulcro da religião apenas no rosto, nos lábios, nos modos, nunca na mente e na alma; se resolvessem ser honesto deveriam saber também que isso não passaria de uma grande hipocrisia.
Não se podia negar o fato de que qualquer pessoa que estivesse apta a subir tão meteoricamente através da rígida estrutura social da Corte Aristocrática deveria entender alguma coisa da natureza humana e agir com base nesta sem qualquer romantismo filosófico moralista.
Os homens cuja alma odiaria tal vida deveriam conhecer e acautelar-se dos cortesãos mestres do disfarce ou deixar a Corte e buscar prosperidade em outro lugar pois lá a progresso pessoal só se fundamentava sobre o blefe, o medo, a bajulação, simples palavras descompromissadas e falsas amabilidades.
A melhor metáfora para descrever as "boas" aparências na Corte Aristocrática Avarenta era a de 'sepulcros fétidos caiados de branco por fora'. Quando esses tipos chegavam ao Poder, revelavam o que realmente já eram há muito tempo, pois antes da objetivação da fraude a decisão de fraudar já nasceu bem antes na mente do fraudador, bajulador, pusilânime e pelega do Rei ( do Poder ).
A franqueza produzia homicídios!
Os maus eram mais conhecidos e mais murmurados que os bons eram aplaudidos

Toda comunicação acaba por tornar, de algum modo, em algum lugar, em algum tempo, “vulgar”.
Para sobreviver na corte aristocrática, era preciso manter-se senhor de 3 virtudes: coragem, sagacidade e a solidão (a alma elevada venera a si mesma, prescinde do reconhecimento alheio) e eleger como companheira inseparável aquele vício impertinente e jucundo da falsidade que se chama cortesia.
Os maus cortesãos (os medíocres, pusilânimes, pelegas) para subirem na escada do Poder necessitavam destruir de forma ardilosa os seus inimigos a quem invejavam . Para tal, criavam falácias difamatórias e caluniosas contra seus inimigos, os invejados . E quem sãos esses inimigos eternos dos medíocres de toda época ?
(1) a força de caráter e o gosto apurado;
(2) a felicidade;
(3) o cepticismo culto;
(4) a altivez dura;
(5) a fria frugalidade do sábio;
(6) o requinte na atitude, na palavra e na forma;
(7) os adaptados à realidade, à natureza humana.
Em suma, os possuidores do que eles invejam e denominam de 'nobreza'.
Quando um ambicioso medíocre chegava ao poder e não conseguia destruir os oponentes como se fazia na inquisição, o principal instrumento de opressão era o de boicotá-los.
Os maus cortesãos medíocres eram mais delicados do que as suas majestades reais e imperiais. Não admitiam qualquer gracejo contraditório.
+++
"Os políticos não conhecem nem o ódio, nem o amor.
São conduzidos unicamente pelo interesse e não pelo sentimento"
Philip Chesterfield
+++
As Cortes eram um caldeirão de ressentimentos e inveja, onde o azedume de uma única pessoa invejada resmungando rapidamente era usada para virar uma conspiração. As regras nas relações interpessoais eram as da prevalência do Poder sobre o convencimento pelo conhecimento; da suspeita sobre a confiança; do medo sobre a esperança; da coerção sobre a cooperação. As melhores ações eram sempre suspeitas; os melhores sentimentos, tratados como equívocos. Àquela época, a sensação de não ter nenhum poder sobre as pessoas e acontecimentos era insuportável para os amigos do Rei que quando se sentiam impotentes sobre os demais servidores e súditos em geral, tornavam-se infelizes.
DIÁLOGO ENTRE UM BAJULADOR DO REI E UM ESCRAVO
Você é um escravo bem-sucedido e eu sou um bajulador fracassado do Rei, meu sucesso limita-se ao ambiente podre da Corte, mas é engraçado que eu valha mais do que você. É engraçado por ser o contrário do que devia ser. O Escravo: É engraçado também porque o seu cérebro não caberia dentro de um copo.
A filosofia maquiavélica, tão adorada pelos maus cortesãos criava uma atmosfera de engano, desconfiança e traição – um lugar onde o medo se mascarava de lealdade.
Em vista de os maus cortesãos mais próximos do rei saberem que a força da Corte aristocrática Avarenta estava baseada no medo de seus membros, tudo que precisavam fazer era se tornarem alguém mais temido ainda ou um grande bajulador.
Para que se colhesse rosas no caminho da vida na Corte, era preciso ser um pérfido cínico. Aqueles que tinham a virtude no coração e como ideal restavam apenas os espinhos. O comportamento cruel, mesquinho e abusivo no ser humano daquela época evidenciava-se à medida que a vítima se mostrava passivo ou indefeso. Se fosse possível a cada um da Corte descrever todos os seus podres, a Corte teria tanto fedor que sufocaria a todos. Na Corte não podia haver honestidade e modéstia em ninguém, só ‘troca de tapas na cara entre todos”. Todo honesto e sincero era considerado, no mínimo, um pateta, se não um tolo pela própria honestidade e sinceridade.
A mentira era a base do sistema político. Riam da verdade, viravam-lhe as costas. A verdade era apenas um vaso de canto, metaforicamente falando. E o pior é que as 'autoridades' do reino transformavam a Razão em vilã, as provas contra quem lhe interessava, seus ‘amigos bajuladores’ em acusações 'falsas', a condição de cúmplice e comandante de crimes de assédio moral em vítima' !! E a população por ignorância, medo ou estado de necessidade engolia tudo, a indignação era coisa supérflua. Denunciar para quê, para quem, se indignar com quê? Fazer o quê? A Corte era podre em qualquer lugar em qualquer aspecto.
A cada vagabundo prestigiado, a cada negação do óbvio, a cada testemunha muda, aumentava a sensação de que as idéias não correspondiam aos fatos !! Pior: que os fatos não eram nada - só valiam as versões manipuladas dos maus cortesãos, dos "amigos" do poder.
Quanto mais importante no ambiente social da Corte, mais insignificante fora dela.
Quanto mais arrogante e dono das verdades na Corte, mais idiota fora dela.
Como dizia o ditado popular: "de perto ninguém é normal". A anormalidade da Corte ultrapassava em muito a "normal" anormalidade. Existiam basicamente dois tipos de cortesãos: os maus e os bons:
Os maus eram os mestres dos disfarces, da simulação e da dissimulação desonesta, só consideravam a si próprios, o seu dinheiro, as vantagens pecuniárias pessoais oferecidas pela Corte, ..(..) tinham uma necessidade neurótica de poder, de demonstrar e ostentar a força de poderem controlar os outros, principalmente os bons cortesãos, de alardearem os próprios feitos, apreciavam ter o mundo aos seus pés, resmungavam o dia inteiro o impacto emocional enorme que sofriam quando alguém os contrariava que correspondia ao reflexo de sentirem-se intocáveis, de não adimitirem ser atingidos.
Os homens podiam ser seus amigos, mas eles não tinham amigos porque possuiam as emoções entulhadas pelo lixo social da cultura social da Corte; Almejavam, como todos os imperadores romanos, que os homens se prostrassem aos seus pés. Não propunham qualquer mudança significante em prol da Corte e de sua comunidade , não questionavam o sistema, não causavam nenhum impacto positivo à Corte. Eram verdadeiros apenas como proteus. Só viam as chagas dos outros, nunca as próprias, só conheciam os objetivos individualistas, por isso não entendiam que os bons cortesãos usavam as idéias, enquanto eles ( os maus ) usavam as armas do poder hierárquico para imporem as suas verdades; evitavam submetê-las ao debate. Os maus cortesãos segregavam-se em seus feudos, os bons lutavam pela espécie humana. Eles também faziam a apologia à honestidade exceto quando ela era voltada contra si próprios, aí ignoravam, difamavam ou puniam aqueles que a utilizaram contra eles. Eram calmos quando sentiam retorno aos seus interesses íntimos, mas explosivos quando turvavam-lhes as suas expectativas. Só amavam aqueles que estavam no pódio.
A sociedade da Corte era hipócrita. Os maus cortesãos, pelegas e pusilânimes, ao mesmo tempo que pregavam a virtude faziam vistas grossas quanto à imoralidade dos “nobres” da Corte. Pregavam condutas morais e éticas para o povo, mas estavam sempre dispostos a comercializá-las em troca de uma melhor posição social e financeira ou simplesmente para não incomodar quem tinha o Poder.
A desmotivação de um grupo de mal cortesãos era reclamada como algo ruim para todo o Reino, mas quando se referia a um grupo de bons cortesãos, isso era bradado pelos maus como um problema pequeno e limitado a um grupo social do Reino..
O prazer do bom cortesão estava em ser quem era, em nunca deixar de ter fé, ao passo que o mal cortesão era ‘punir’, criar dificuldades, não importando o porquê, assim se estabeleciam nas relações de Poder.
Os bons eram tidos como os mais perigosos porque constantemente tentavam inovar, mudar, questionar o 'status quo' da realeza e de seus prepostos, e assumiam com coragem suas responsabilidades , não eram pusilânimes e pelegas. Obviamente, os maus cortesãos planejavam permanentemente se livrarem destes o mais rápido possível, punindo-os, difamando-os, caluniando-os, ignorando-os.
Às vezes é triste fazer comparações, mas para um bom entendimento da cortesania faz-se necessário fazê-la.
Além dos aspectos genéricos que diferenciavam os bons dos maus, havia alguns aspectos pontuais dignos de nota:
A maioria do cortesãos ambiciosos se omitiam da responsabilidade e ficavam como uma macaca pulando na frente de câmeras implorando pela atenção do superior hierárquico, enquanto faziam declarações pseudo engraçadas ou polêmicas e, como pseudo ídolos do rei, se ridicularizavam para fins de agradá-lo.

A covardia era a chave para uma vida tranquila. Na hora do aperto, mesmo com graves injustiças cometidas nas barbas do mau cortesão eles sempre escolhiam se resignar às circunstâncias. Não havia um mau cortesão que em algum momento optasse por se ater a convicções nobres, mas sim sempre apenas ao instinto de salvar a própria pele. Como um substrato desse comportamento, essas pessoas eram agressivas com colegas e subordinados, mas dóceis com figuras de autoridade. Eram calorosos e afetuosos quando sentiam seguros os seus interesses egoístas e mesquinhos, mas hostis quando rejeitados ou ameaçados em seus interesses.
Os maus cortesãos viviam reivindicando maiores remunerações. Eram os primeiros a falarem de dignidade profissional e blá, blá...Mas, na hora de mostrá-la na prática assumindo suas dignas responsabilidades omitiam-se como verdadeiros moleques indignos. Exageravam o escopo de um cargo ou função pública da Corte e a própria importância dentro de um grupo profissional da Corte e do Reino em geral ! Eram mestres na falsa imagem. Os bons cortesãos comumente os maiores responsáveis pelo desenvolvimento econômico e social do reino recebiam as menores remunerações da Corte e as maiores responsabilidades, tal como ocorre contemporaneamente com os professores, médicos, engenheiros e tantos outros cientistas e pesquisadores em geral.
+++
Eis um desabafo de um bom cortesão:
"Detesto essa espécie de animal. O que observei neles, no tempo em que estive na Corte foi o bastante para não os admirar, nem os imitar. São, em geral, de uma lastimável limitação de ideias, cheios de critérios egoístas, supérfluos e desnecessários, curvados aos fortes, a ideias antigas e guiados por conceitos obsoletos e, praticamente, pelo medo e egoísmo.
Creio que o fato de indivíduos comuns e pouco instruídos chegarem ao poder contribui para a arrogância tão marcante na personalidade dos bajuladores do Rei e dos valores do Reino.
Por sua vez, o Rei dava-lhes autoridade pelo fato de os bajuladores explicarem, ou melhor, justificarem muitas injustiças sociais e crueldades aparentes como incidentes inevitáveis para a marcha do progresso do Reino e de mostrarem que a tentativa de modificar os valores do Reino, o estado das coisas, tinha de modo geral, mais chances de causar danos que benefícios.
+++
Os maus cortesãos em ambientes socialmente estranhos ou fora da função de autoridade na Corte eram angelicais, mas ao adentrarem a porta da Corte, abriam simultaneamente as janelas doentias da impaciência, da intolerância, da irritabilidade, apenas com os que considerava não representar ameaça aos seus interesses . .(...);
Os maus cortesãos pertenciam ao rol dos bons profissionais para os interesses da Corte e fora dela pertenciam ao rol dos ignorados, inúteis, comuns, enquanto que os bons cortesãos na corte pertenciam ao rol dos estranhos no ninho e fora da corte ao rol dos bem vistos, bem quistos, úteis.
Os maus cortesãos necessitavam da Corte para sentirem-se importantes. Os bons cortesãos estavam na Corte apenas por necessidade de trabalho, não necessitavam dela para sentirem-se importantes, ao contrário, eles até davam mais significância à Corte.
O maus cortesãos eram inseguros e viviam absortos em seus próprios problemas e interesses, eram incapazes de compreender a psicologia do outro; eles literalmente repeliam. Não tinham consciência do que faziam e não percebiam que incomodavam demais tomando liberdades e pelo exagerado egoismo, faltava-lhes sutileza honesta , sobrava-lhes desonesta. O que movia os maus cortesãos era o desejo de estar acima de seus pares. Já os bons cortesãos eram movidos pelo código do altruismo, pelo desejo de contribuirem para o ambiente ao qual estavam inseridos;
O que movia os maus cortesãos era o desejo de estar acima de seus pares, já os bons cortesãos eram movidos pelo código do altruismo, pelo desejo de contribuirem para o ambiente ao qual estavam inseridos;
Os maus cortesãos adoravam indicar os erros alheios esperando com isso gerar aplausos públicos para si, jamais se importavam em preveni-los porque o máximo que isto produzia era um reconhecimento anônimo da própria consciência. Tal como ocorre com os médicos sanitaristas, raramente lembrados socialmente, mas e se não fossem as suas vacinas ?
Os maus cortesãos desconheciam a arte da dúvida, suas verdades eram inquestionáveis, eram os Deuses da perfeição à procura de servos, enquanto que os bons cortesãos sabiam que eram serem humanos imperfeitos vivendo no ambiente imperfeito da Corte;
Os maus cortesãos queriam ser lideres procurando seguidores bajuladores; os bons cortesãos procuravam ligar-se a grandes pensadores que os questionassem;
Os maus cortesãos obedeciam as ordens dos seus superiores pensando em si próprio, enquanto os bons cortesãos cumpriam-nas pensando na Corte;
Os bons cortesãos eram frequentemente surpreendidos porque desconheciam todas as armadilhas da Corte, enquanto os maus cortesãos viviam rodeados pelos resíduos de suas armadilhas: o fantasma do 'ego', das 'vaidades', dos 'paradigmas rígidos', da 'hipersensibilidade' , do 'ciúme', da 'necessidade neurótica' de ver prevalecer as suas idéias, de estarem sempre certos, de serem o centro das atenções; sempre temendo a todos, conduta esta reflexo do próprio caráter.
Os maus cortesãos usavam o poder do medo e das pressões, eram aptos a cobrar, pressionar, punir, mas inaptos para encorajar e estimular. Só faziam o trivial e só realizavam o esperado para a Corte.
O bom cortesão sabia que os caprichos da "sorte" imerecida alheia são enigmas da providência que não se deve desejar desvendar, mas que jamais nos devem seduzir. A prosperidade do perverso mau cortesão não é senão uma prova à qual a providência submetia os bons , ela é como o raio cujos fogos ilusórios embelezam por instantes a atmosfera apenas para precipitar nos abismos da morte os infelizes a quem fascina. O bom cortesão sabia que a verdadeira felicidade está somente no seio da virtude e que se Deus quer que os humildes da Corte fossem perseguidos na Terra era para preparar-lhes no Céu a mais faustosa recompensa.
Os maus cortesãos estavam sempre abertos para novas ideias, desde que fossem as mesmas de sempre. Viviam justificando suas falhas e seus erros provando 'inconscientemente' que não tinham a intenção de mudar!' Não só lutavam para se manterem estáticos, como também a fim de manter tudo o mais de igual modo, ou seja, de acordo com os seus exclusivos interesses egoistas. Eram totalmente ridículos !
Como bons parasitas social, os maus cortesãos estavam sempre em busca de alguém para explorar. Eram legítimos predadores, que não ficavam felizes sem rondar possíveis presas.
Não cumpriam as mínimas regras de respeito ao próximo e de convivência. Era uma constante a incongruência entre o discurso humano e altruísta e suas atitudes baseadas exclusivamente em interesses pessoais. Violar regras não lhes causavam arrependimento. Eram mestres na arte do engano e não tinham freios morais. Contra eles, era preciso estar atento e forte ! Acredite, não era fácil. Era perda de tempo repreendê-los: como eles não sentiam empatia ou culpa, o efeito era nulo !
Na verdade, os cortesãos 'amigos' do rei eram como um gongo que soa em um cruzamento ferroviário estridente e em vão enquanto o trem passa ! A vida mudava ainda que eles lutassem contra ! As pessoas mais insignificantes eram as mais aptas a demonstrar desdém por outras. Viviam querendo castigar pelas virtudes e só perdoavam sinceramente os erros.
+++
Os cortesãos "amigos" do reino, do rei e de todos os demais cortesãos eram do tipo que faziam questão ( sempre com muita publicidade ) de emprestar um guarda-chuva num dia de sol, que sempre pediam de volta quando chovia
+++
Os maus cortesãos faziam-se de generosos e solidários sempre no abstrato, enquanto a tentação de uma conduta oposta era remota e o desafio era apenas hipotético. Adoravam banhar-se ao sol da autoaprovação e de uma imagem generosa de si mesmo enquanto a tempestade andava longe !!! Conduto, quando o tempo na Corte virava, quando a oportunidade concreta por fim se oferecia para na prática provarem o que eram de fato, a voz que ouviam de si mesmos era sobreposta por ações diametralmente opostas ao que verdadeiramente queriam fazer os outros acreditarem. Ações falam. E o que as ações dos maus cortesãos falavam raramente era o que tentavam acostumar os outros a ouvirem sobretudo enquanto o futuro, as vantagens, eram algo em aberto; a promessa, generosa e o desafio, remoto. De fato, aparentavam até não possuir qualquer consciência do mal, mas sim - e muito - a pretensão ilusória e infundada do autoconhecimento - do imaginar que se é sem sê-lo, da certeza de saber, sem nada saber.
Os bons cortesãos sabiam que o saber nunca é final, mas sim algo condenado a ser eternamente inicial; Que toda vitória é parcial; Que toda conquista, provisória e toda certeza, suspeita. De modo oposto, os maus cortesãos com suas indisfarçáveis hipocrisias com que tentavam enganar de forma cínica e deliberada a todos na Corte não se davam conta da contradição em que tropeçavam seus discursos. Ao negarem enfaticamente seus vícios, revelavam estarem tomados por eles. Eles precisavam mentir para si próprio para evitarem o desprezo por si mesmo. Ao negarem reiteradamente suas falhas de caráter, revelavam estar tomados por ela a tal ponto que não admitiam nem para si mesmo que as possuíam. Precisavam mentir para si próprio para evitarem o desprezo por si mesmo. O auto-engano era de tal ordem que prejudicavam a própria inteligência e a capacidade de enganar o outro. Ao negarem suas falhas de caráter, revelavam estar tomados por ela a tal ponto que não admitiam nem para si mesmo que as possuiam. Precisavam mentir para si próprio para evitar o desprezo por si mesmo.
O auto-engano era de tal ordem que prejudicava a própria inteligência e a capacidade de enganar o outro. De modo que, o mau cortesão, hipócrita social, com frequência, por descuido perdia o pé das pretensões que ostentava, tropeçava na consistência do papel que representava ou se enredava na teia de suas próprias mentiras, perdia o crédito e falia !
E SE ALGUÉM QUISESSE SER SUPER-HERÓI NA CORTE ARISTOCRÁTICA ?
Sim, as coisas não andavam lá muito fáceis para o lado de todos que não eram "amigos" do Rei, mas havia aquele que seria fácil tornar-se admirado em todo o Reino tornando-se super-herói na Corte Aristocrática , mesmo sem os poderes do Batman, do Homem-aranha, do Homem-de-ferro, do Capitão América e todos os outros que já existiram...
A metrópole cinza da Corte só combinava com um tipo de uniforme para Super-herói que caracterizáva-se pela monotonia do marrom com bege, as orelhas de macaco e uma cauda bizarra. Preciso ser franco, o super-herói da Corte "JR" e seu fiel cúmplice "JM" eram na verdade os super-heróis micos da Corte !!!
Certa vez, apareceram todos cheios de si avisando que tinham capturado um "amigo" do Rei da mais alta periculosidade. Diante da cara de surpresa dos policiais até citaram o artigo 301 do Código de Processo Penal da época. Estavam se achando ! Até que lhes perguntaram o que tal bandido tinha feito, e responderam: "Ah! um amigo meu ouviu falar que ele tava planejando botar fogo nos "bobos da corte". Só falta trazer as algemas e bater as fotos !!
A Corte nunca se esqueceu, Homem-mico, da tristeza em seu olhar quando o corregedor da Corte lhe falou que boatos difamatórios e caluniosos configuravam crimes contra o Homem-mico e não contra os difamados e caluniados. Dá para ouvir daí a minha risada malévola ?
A segunda vez também foi um bocado constrangedor. O Homem-mico "J.R" e seu cúmplice "J.M" voltaram a corregedoria da Corte dizendo que possuia provas de vários crimes cometidos por "amigos" do Rei que eram melhores remunerados que os fracos e oprimidos "bobos da corte". Dessa vez, ele estava confiante de que a justiça seria feita, destruindo um rico para igualá-lo a um pobre. Mas, o corregedor mais uma vez informou que nenhuma daquelas provas eram válidas e não poderiam ser aceitas ! E aí, o super-herói homem-mico da Corte sentou e chorou por mais um processo administrativo do Reino .E quem acabou preso foi o Homem-mico e seu comparça , e ainda acabaram processados por calúnia.
Não quero cutucar as feridas de todos os Super-heróis homens-micos de todas as Cortes aristocráticas de todos os tempos ,mas convenhamos, tenha dó !!! Santa infantilidade, santa burrice, santa ingenuidade Batman !!!
A assimetria das informações na Corte é o que permitia os maus cortesãos fazerem do círculo um quadrado na mente de seus interlocutores.
É claro que todos os que conheciam ao menos um pouco o bom cortesão não poderiam acreditar em uma só palavra de todas as acusações de que eram alvo. Entretanto, como era de costume, a maioria se agitava, falava, caluniava e condenava irrevogavelmente. O sucesso da maioria se baseava na desgraça alheia e não no esforço próprio.
Não caberia em um livro inteiro o que as comadres e os compadres da Corte fofocavam a respeito da vida alheia. Havia bons cortesãos recém chegados à Corte que não sabiam quase nenhuma palavra dessas calúnias e fofocas e permaneciam alegres e inocentes como uma criança de 12 anos.
Alguns maus hábitos da classe dos bajuladores, pusilânimes e pelegas da Corte: dissimulação, leviandade, presunção, arrogância, petulância, melindrosos, déspotas. Mentiam sem arrependimento, até mesmo sem desconfiar de que as pessoas achavam que havia algo de ruim neles. Para tudo que era novo na Corte olhavam com desconfiança, inimizade e zombaria. São essas coisas chamadas detalhes que caracterizam a pessoa, haja vista que o principal não é a inteligência, mas aquilo que a dirige, a índole, o coração, as qualidades nobres.
O rei e seus cortesãos puxa-sacos viam todos os seus interesses em tamanho grande, pouco se preocupavam com os indivíduos, contanto que a máquina do governo funcionasse bem de acordo com os seus interesses.
+++
"Nós estamos tão acostumados a nos disfarçar dos outros que acabamos nos disfarçando de nós mesmos".
Duque de La Rochefoucoud
um observador sutil das astúcias e dos mecanismos não racionais da psique humana na vida prática da Corte.
+++
Os humildes camponeses viviam mais despreocupados do que o Rei e seus 'amigos' na Corte porque trabalhando tornavam-se mais livres de preocupações mesquinhas que normalmente ocupava a cabeça dos que não se moviam na Corte. Já os maus cortesãos, ambiciosos por funções de chefia, pareciam o que hoje chama-se de 'louro josé', o louro da Ana Maria Braga, porque enquanto os subordinados se mexiam para trabalhar para a Corte, eles ficavam parados falando 'abrobrinhas', auto-elogios, e outras bobagens mais, como se fossem reizinhos....Repetiam o modelo do Rei de controle centralizado dizendo a cada subordinado o que deviam pensar e fazer !

Os maus cortesãos em função de chefias do Rei estabeleciam um papel de importância exagerada à própria figura de autoridade, de modo que qualquer probleminha era motivo de "pregação". O mais importante no relacionamento - o respeito e o apoio - perdiam a prioridade para o egoísmo, a impaciência e as escolhas mesquinhas.
Distante da Corte havia poucas diferenças hierárquicas e também poucas diferenças entre as avaliações próprias ( autoimagem ) e a dos outros. Quanto mais próximo à Corte, maiores eram as diferenças. O Rei representava o máximo da falta de autoconsciência. A explicação: quanto maior o Poder, menor o círculo daqueles que se dispunham a falar sinceramente com alguém. E ainda havia aqueles que negavam os problemas alheios por mera bajulação. Qualquer que fosse o motivo, os líderes da Corte viam a si mesmos como sendo perfeitos, quase deuses, muito mais eficientes, importantes e necessários à sociedade e ao Reino do que realmente eram e os outros verdadeiramente os viam. Um poeta da Corte uma vez escreveu: "Ah, que os deuses vos dessem o presente de verem a si mesmos como os outros os vêem".
Os cortesãos "amigos" do Rei viviam tão iludidos em sua autoimagem que tal deturpação podia ser resumida pela seguinte frase: "Eu sou o que Eu acho que você acha que Eu sou". Como o verdadeiro autoconhecimento deve começar com uma verdadeira autorevelação e os amigos do Rei sempre se revelavam um falsete social então nunca enxergavam a realidade de si próprio.
A riqueza por si só não fazia o mau cortesão feliz. Ele precisava também de poder para terem oportunidades de humilhar a quem invejavam. O 'status' na Corte fundamentava-se em dois aspectos: Ter mais riqueza e diminuir o 'status' alheio. A ambição pelas funções de 'amigo' do rei não se limitava apenas a uma melhor remuneração com mais vantagens pessoais, representava também fazer o que bem entendesse e que o mundo podia ir para o inferno, ainda que esse 'mundo' significasse apenas os seus subordinados.
Os maus cortesãos gostavam de demonstrar e alardear a força do poder que a função que exerciam na Corte permitia para prejudicar um bom cortesão. Gostavam de alardear os seus feitos. Apreciavam ter o mundo aos seus pés. Almejavam, como todos os imperadores romanos, que os demais cortesãos e súditos se prostrassem aos seus pés.
Os maus cortesãos queriam o pódio da vitória a qualquer preço, mas desprezavam o esforço do trabalho honesto e a coragem no esforço persistênte no caminho do bem. A função de Poder não era uma conquista,mas sim um presente fruto de uma artimanha.
Aliás, quanto ao Poder na Corte vale observar que as crianças da corte nasciam boas, mas, pelo exemplo que recebiam em suas familias cedo despertavam para as delícias do Poder e tornavam-se inebriadas, hipnotizadas enciumadas por ele e invejosas de quem o possuía, que não se importavam com os meios para o sua obtenção.
Na teoria, o Poder por si sempre foi para ser neutro, nem bom nem ruim, qualquer que seja. Mas o seu exercício pode ser para o bem ou para o mal, para o lucro ou prejuízo coletivo, para a harmonia ou desavença,... A história é pródiga em nos mostrar fatos que demonstram essa disfunção da natureza humana, nas mais variadas formas, na conquista e uso do Poder.
A competitividade no ambiente de trabalho nos órgãos públicos do Reino e na Corte onde nos termos da Lei todos tinham iguais obrigações, pelo menos no cumprimento de horário de trabalho, na moralidade, mas que, na prática, quem trabalhava mais ganhava menos e vice-versa, quem era amigo do Rei cumpria menos o que deveria cumprir e vice-versa,...diariamente presenciava-se manifestações de pequeno porte, comumente de forma dissimulada, visando à destruição alheia ou para afastar supostas ameaças ao ‘status quo”.
Eram as estratégias de sobressair diminuindo os outros; atitudes impulsivas irrefletidas de sistematicamente ser do contra, qualquer que seja e de onde viesse a opinião do outro, para desmoralizá-lo, por meios de gestos, palavras e ações pretensamente inocentes, mas com a eiva da maledicência, inveja, rivalidade...
Em vista disso, era comum o detentor do Poder não pautar suas ações pelos objetivos da Corte e ignorar o bem comum a que deveria atender. A função que exerciam passavam a ser trampolins para ambições de Poder mais altos, motivadas exclusivamente em atender ao egoísmo e ao prazer na desgraça alheia.
Todos conhecem o ditado que diz:
"só conhecemos alguém quando lhe damos algum poder".
Na Corte os cortesãos pensavam que seu poder era maior se fosse despótico, que não precisavam dialogar para equilibrar. Eles adoravam ser "inspetores de alunos", impondo seus desejos sem mensurar o certo e o errado e vendo moinhos onde não existiam!!
Para um bom cortesão sobreviver na Corte, era imprescindível possuir um raciocínio ‘multiangular’ porque se fosse igual ao dos maus cortesãos, apenas ‘lógico-linear‘, seriam obstáculos intransponíveis a traição e a frustração pelas mais diversas causas fúteis. Ao contrário, deveria possuir um raciocínio ‘multiangular’ para saber analisar as agressões recebidas em conjunto com o significado das pessoas agressivas, a dimensão das suas causas, pensar nas consequências de seus atos e dos atos alheios com base nos seus próprios princípios e considerar as causas psíquicas e sociais que controlavam os maus cortesãos; tentar entender por múltiplos ângulos o que estava por trás da cortina dos comportamentos agressivos do mau cortesão, sem traços de humanidade e afetividade, saber que eles eram vítimas de uma educação social doente que não desenvolveu a estrutura do “EU” como líder e referência para si mesmo e, por isso, para eles a aprovação alheia dependia sempre do que tinham, do papel que representavam na Corte, etc..
A melhor arma contra um mal cortesão era reconhecê-los e - dentro do possível - ficar ao largo - mas quase sempre eles procuravam quem invejavam a fim de prejudicá-los. Os bons cortesãos não podiam demonstrar reações emocionais, qualquer interesse quer de desagrado por qualquer coisa ou qualquer pessoa, mas sim atitudes de distância e indiferença de tudo e de todos, fazendo-os sentir que suas agressões não tinham a mínima importância. Essa era a fachada defensiva obrigatória da cortesania. Outra era prestar atenção para não se deixar levar pelas aparências.
A confiança era um artigo de luxo que ninguém podia se dar ao luxo de ter.
Todos se viam na Corte durante longos anos e após intermináveis conversas, jamais se fazia amigos. Todos tinham que permanecer alerta contra todos e o 'zumzum' da corrente de alta voltagem de fofocas difamatórias que fluia dia e noite na Corte. Com o passar dos anos a vida na Corte era como um terno muito usado que vai-se tornando cada vez mais esmolambado.
A solidariedade não era a regra no ambiente social da corte, de modo que até para praticá-la devia-se ter cuidado pois, como a falsidade estava tão presente em tudo, comumente era recebida com muita desconfiança.
+++
O homem que conhece a corte é senhor dos seus gestos, dos seus olhos e do seu rosto; ele é profundo, impenetrável; ele dissimula maus ofícios, sorri para os inimigos, controla sua irritação, disfarça suas paixões, desmente o seu coração, fala e age de modo diferente do que está sentindo.
Jean de La Bruyère, 1645 - 1696
+++
A vida na Corte é um jogo de xadrez, sério e melancólico, onde temos que colocar em formação nossas armas e batedores, criar um plano, persegui-lo e nos defender do plano do nosso adversário.
Jean de La Bruyère, 1645 - 1696
+++
A dissimulação social é a arte da administração de impressões. O espectro é enorme. Nos casos mais simples com esconder um mal estar, uma preocupação familiar, falar com discrição e reserva algum assunto particular da Corte, o efeito é inócuo e faz-se necessário para uma boa educação. Mas, na Corte imperava as formas mais graves como a de um falso amigo, nestes casos o dano pode ser tremendo.
Se a fronteira entre a boa-fé e a má-fé, entre a farsa e a seriedade, entre ter ou não ter razão fosse sempre nítida e inequívoca; se o bem e o mal estivesse sempre em campos opostos e bem demarcados, com os dissimuladores e suas vítimas uniformimente cientes da natureza de suas boas ou más intenções, o Mundo não seria como sempre foi. Sempre foi preciso muito cuidado. Acreditar que ninguém praticava o mal de modo deliberado e cinico, como sustentavam alguns bons cortesãos adeptos do romantismo filosófico, era ir longe demais na imprudência!
Naquela época os cortesãos "amigos" do Rei e "defensores" do reino desenvolviam um certo cinismo ao longo dos anos porque se acostumavam ao fato de que as metas não seriam cobradas, etc... Nas empresas privadas odiernas só uma coisa a fazer: manda-se esse pessoas embora; já no serviço público da Corte !!!!
Nem tudo o que se diz se faz e nem tudo o que se faz se diz, mas a presunção de veracidade na maioria das trocas verbais é condição indispensável na comunicação e na sociabilidade humanas. No mundo da cortesania os cortesãos nunca diziam o que queriam dizer e nunca queriam dizer o que diziam. Quanto mais perto do Rei, os cortesãos calculavam as vantagens de mentir ou dizer a verdade todas as vezes que abriam a boca de modo que a comunicação interpessoal era um pandemônio labirintico desnorteante.
A iniquidade e a ganância governavam de tal forma o comportamento geral de modo que qualquer bom indivíduo era forçado a concluir que " a distância entre como viviam e como deveriam viver" era de tal ordem que quem quer que abandonasse o que fazia em nome do que deveria ser feito incorreria em maior chance de destruir-se do que de se salvar a si mesmo, arruinando-se em meio a tantos que não eram bons. Afinal, para que ser o Caxias inútil ou o Quixote ridículo de sua própria integridade, o batalhador ingênuo e mal pago em meio a um bando de aproveitadores e canalhas dissimulados. Ninguém podia se dar ao luxo ou correr o risco de fazer por si mesmo o que seria em tese melhor para todos porque todos ou a maioria não faziam o mesmo.
Tudo tinha que ser obscuro, posicionado e politizado, ou melhor, "politicamente correto", falso. Quem experimentasse ser direto, franco e honesto com a Corte e seus cortesãos, corria o risco de ser decapitado...Ninguém se concentrava no conteúdo do que deveria ser dito, mas sim na verbosidade do que lhe convinha , atitude que aprendia-se na cultura organizacional vendo o que levava aos postos mais altos na Corte.
+++
COMO OBSERVA O ECONOMISTA POLÍTICO VITORIANO MACDONELL:
"A malandragem só pode ser lucrativa enquanto a honestidade é a regra geral"
( Survey Of Political Economy, p.59 )
+++
Vale observar um pouco sobre as "máscaras da Corte".
É bem provável que você não tenha apenas uma, mas várias máscaras. Não me refiro as máscaras tradicionais usadas nos bailes de carnaval, com data, hora e local apropriados, mas sim a que todos nós usamos diariamente, em diversas situações. Não! Não estou falando de falsidade ou manipulação. Costuma-se usar máscaras por diversos motivos, dentre as quais a de ser educado, pelo medo de sermos inadequados e, conseqüentemente, não-aceitos, etc...
Acontece que a Corte era um "baile de máscaras" diário e ninguém tinha apenas uma, mas várias. Só que, o principal motivo do seu uso não era para o bem alheio ou nos seus bailes tradicionais, com data, hora e local apropriados, os maus cortesãos as usavam diariamente, em diversas situações para atender aos seus mais inconfessáveis desejos, mais do que causar verdadeira alegria em quem a usava e também em quem a via, elas causavam muito mais angústia, vazio e distanciamento do que bem estar. Os bons cortesãos também usavam máscaras, mas a finalidade primordial era o da sua sobrevivência na Corte.
Uma das máscaras usadas pelos maus cortesãos era a do “eu sou feliz”. Claro que ser feliz sempre foi muito bom e realmente existiam pessoas felizes no Reino na época dos cortesãos, embora essa fosse inversamente proporcional a distância do Poder.
Em qualquer época da história, deveríamos nos sentir felizes pelo que somos, por nossa família, pelos amigos de longa data, pelo amor que sentimos por algumas pessoas especiais em nossas vidas. Enfim, parece que deveríamos nos sentir gratos por uma felicidade genuína. Pelo simples fato de estarmos vivos, de termos saúde, de conseguirmos superar dificuldades e termos a oportunidade de nos tornar pessoas melhores por conta disso.
No entanto, a felicidade dos maus cortesãos era outra. A máscara do eu sou feliz sustentava um sorriso vazio, um copo de vinho na mão e risadas fáceis demais, sem consistência, sem laços de afeto. Esse tipo de máscara caia perfeitamente bem nas baladas da corte, rodas de cortesãos, ... mas mesmo aí revelava por trás sempre um olhar carente, uma boca triste, um coração sem rumo, solitário sobretudo quando o seu usuário chegava em casa, quando se deitava para dormir...
A moda na Corte era estar sempre bem, de preferência o melhor dos cortesãos. Sem problemas, sem medos, sem grilos ou neuroses. Algo do tipo sobre-humano, encantador à primeira vista. Faz sentido! Na Corte não era possível falar de dificuldades e compartilhar assuntos mais profundos e humanos pois, neste momento, os “amigos” cortesãos mascarados simplesmente desapareciam!!!
Ninguém sentia-se incluído, parte de um grupo, porque quando mais precisava-se das pessoas elas estavam sempre ocupadas demais com seus próprios interesses e morrendo de medo uns dos outros!!
Embora seja mesmo fundamental o uso de máscaras, senão não suportaríamos a constatação de um mundo abarrotado de pessoas morrendo de solidão, cheias de desespero e só falando de desgraças ao nosso redor... Porém, ninguém acreditava nas possibilidades benéficas de seu uso, sobretudo porque ninguém acreditava em ninguém! Ninguém acreditava na possibilidade de ser feliz sem máscaras porque os desejos não eram fundamentados e vinculados a objetivos mais coerentes!
Repetia-se o tempo todo: eu adoro conhecer novos cortesãos, fazer novos amigos. Gente, eu não tenho absolutamente nada contra novos cortesãos na Corte! Mas, infelizmente, isso era incoerente com o praticado, bastava observar-se o que faziam com as pessoas já conhecidas e desprezadas sem qualquer motivo coerente!!! Ninguém se deixava cativar, ninguém aprofundava as relações, criava laços...Isso, de forma honesta, requer falar de coração aberto... Mas o que se fazia era compartilhar a vida de forma superficial e mascarada, nunca de maneira mais profunda e humana. Ninguém estava disposto a cativar e ser cativado.
Assim, sem vínculos, a cada dia precisava-se cada vez de uma nova máscara. E os cortesãos tornavam-se pessoas cada vez mais diminuídas dentro deles mesmos, sentindo-se com medo, solidão, tristeza, desespero, confusão e aflição. E não sobrava espaço para a tão urgente e necessária solidariedade social.
O cortesão era capaz de tudo o que estivesse ao seu alcance para saciar seus “nobres” interesses. Ele agia impelido pela intensidade de suas “valorosas” carências materiais e psicológicas e limitado apenas pelas ameaças e obstáculos com que se deparava.
Os fins perseguidos pelos interesses de todos os maus cortesãos eram essencialmente uniformes ( Poder, maior remuneração, menos trabalho ), os meios dos quais dispunham para persegui-los eram fabulosamente diversificados e incluía peças teatrais de espantosa sagacidade dissimulada, que em seu conjunto caracterizavam “a arte do engano” que correspondia a padrões comportamentais dissimulados capazes de iludir e driblar os sistemas de defesa de outros cortesãos. Entre a máscara que disfarçava e o gesto que ludibriava, havia enganos para todos os gostos.
Onde há vida há também vontade, mas na Corte a vontade que menos importava era a de vida, sobretudo a vida alheia, era a coisa mais desprezada pelos cortesãos. A vontade mais importante era a vontade de Poder ! Poder para poder entrar e sair da Corte sem dar satisfações aos demais cortesãos ao seu lado, Poder para poder ganhar mais gratificações do rei, para prejudicar mais, para desprezar mais, para ser mais temido, já que pelos valores próprios não eram merecedores de respeito, fora da Corte equivaliam a um ninguém e para serem tratados como alguém que importante fosse, ao menos na Corte, necessitavam do Poder. Permaneciam preocupados com a sua remuneração que era muito acima dos demais súditos do Reino: tais como os súditos das áreas da educação, saúde e segurança do Reino. Em resumo, quanto mais próximo do rei, mas podiam agir conforme a "moralidade" do reino e do rei.
Os cortesãos embora encontrassem com sua indústria e arte meios de amansar os temperamentos das mais diversas feras, entrar e sair das selvas sem ferimentos, não conseguiam apreciar nos outros aquilo que neles próprios desagradava, assim, não conseguiam ou não queriam ou não eram afeitos a descobrir artes com as quais beneficiassem a coletividade da corte e, com diligência e estudo, tornassem melhor o seu próprio espírito. Daí nascendo todos os pecados e principalmente aquela falsa presunção que adquiriam de si mesmo pelas influências da corte e, por isso, mantinham-se numa belicosa ferocidade de rapinagem dissimulada. O próprio rei criava regras em seu reino que os estimulavam dando-lhes prêmios para provoca-la, chamando-os de virtude. Neste campo da cortesania, era costume que aquele que não tivesse morto um ‘inimigo’ do rei, não podia beber, nos banquetes patrocinados pelo rei, da taça que circulava entre os cortesãos iguais e solidários companheiros de torpeza.
O Rei distribuía a política do estímulo por meio de "bônus reais" a fim de melhorar a performance de seus súditos na sua finalidade mais valorizada na Corte, refiro-me a avareza. O Rei, mais do que ninguém, sabia que na Corte o dinheiro era a única força motivacional para o trabalho. Os cortesãos não possuiam nenhum interesse intrínseco propriamente dito no trabalho e muito menos pelos interesses do Reino, mas sim apenas pelas vantagens pecuniárias e pelo mau uso do Poder.
Numerosos estudos mostram que as pessoas julgam a razoabilidade de sua remuneração menos em termos absolutos e mais em termos comparativos com os seus pares. Na Corte, o parâmetro para comparação era o de quem ganhava mais ( mais amigo do Rei ) era o que trabalhava menos e vice-versa !!! Chegavam ao ponto de embora precisarem dos serviços de profissionais da área da limpeza, saúde, educação e segurança e , por isso, viam pessoalmente o quanto estes trabalhavam na Corte e pela Corte, não tinham consciência do quanto não eram o que se consideravam se comparados aqueles!
Em decorrência das virtudes cultuadas na corte, os cortesãos mostravam-se valorosos e sábios na guerra que em si é ruim; e mostravam-se ignorantes e tão mesquinhos que nem sabiam desfrutar e cultivar o bem na paz e sossego que são bons. Todos na corte consideravam que quando um cortesão tivesse o poder de fazer o que quisesse, era grande o perigo de que fizesse aquilo que não deveria ser feito a ninguém, haja vista que, praticamente, como regra, quando alcançavam a prosperidade, quando a fortuna lhes sorria, tornavam-se injustos, desregrados e se deixavam corromper pelos prazeres.
Bem diziam os sábios distantes da corte:
“o exercício das funções públicas demonstra quem são os homens, pois, como os vasos enquanto estão vazios, embora tenham algumas fissuras, não podem ser bem avaliados, se for colocado um líquido dentro deles logo mostram onde está a falha; igualmente os espíritos corruptos e viciados raras vezes revelam seus defeitos, exceto quando se enchem de autoridade; porque aí não são capazes de suportar o grave peso do poder e por isso vazam por toda parte a cobiça, a soberba, a ira, a insolência e aqueles costumes tirânicos que trazem dentro de si; daí, sem escrúpulos, perseguem os bons e os sábios e exaltam os maus, não admitem que nas cidades existam amizades, grupos, camaradagens entre cidadãos, mas estimulam os espiões, delatores, sicários, para que assustem e tornem os homens pusilânimes, e disseminam a discórdia para mantê-los divididos e fracos; e desses procedimentos resultam inúmeros danos e desastres para os míseros povos e, frequentemente, morte cruel ou pelo menos temor contínuo para os próprios tiranos que quanto maior o número de pessoas que comandam e quanto mais poderosos, paradoxalmente, mais temem e os inimigos, sobretudo os do tipo falsos amigos.”
Os 'cortesãos' sabiam mais do que ninguém como era perigoso demonstrar suas intenções e sobretudo aqueles que tinham “fome de poder” pois ficavam numa posição muito delicada: tinham de bajular os seus Senhores, mas a bajulação não poderia ser muito óbvia, porque os outros cortesãos não poderiam notá-la, sobretudo os maus, os “envenenadores da boa vontade”, que poderiam agir contra eles. As tentativas de agradar ao Senhor, portanto, tinham de ser sutis. então antes de chegarem ao poder ambicionado, escondiam as suas verdadeiras intenções aparentando serem justos, decentes, agradáveis, democráticos..[..]. Quando no poder, criavam uma espécie de pena deles mesmos, como se as suas responsabilidades fossem um peso e um enorme sacrifício. Como alguém pode invejar um homem que assumiu uma carga tão pesada em prol do "interesse público"? Assim, com a maior cara-de-pau disfarçavam o seu interesse no poder e vagabundagem como uma espécie de sacrifício auto-imposto, em vez de um manancial de felicidade por não trabalharem tanto; Enfatizavam os seus falsos problemas tudo para se protegerem dos demais ambiciosos e simulados cortesãos e transformar o perigo em potencial da inveja numa fonte de apoio moral ( pena ). Nesse contexto, os condes, duques, marqueses, príncipes e outros menos nobres não perdiam a oportunidade lamentarem-se para os seus súditos, que eram 'obrigados' a fingirem que acreditavam. Era a 'arte' contra a 'arte'.
Qualquer pessoa poderia ser alvo dos “cortesãos” bastava apenas ser um simples recém-chegado à Corte que os envenenadores já começavam a planejar macular a reputação deles para que o Rei os visse de antemão, de forma deturpada, era uma forma de destruição preventiva !! Qualquer pessoa de quem o Rei se aproximasse ou vice-versa tornavam-se vítimas das leviandades dos cortesãos e cortesãs que não mediam esforços para serem os preferidos do Rei. Quanto maior fosse a dificuldade para destruí-los maior era também o grau de ardil, fraude , sigilo e planejamento destrutivos.

O cortesãos para tornarem-se poderosos distorciam as palavras e a imagem alheias, sem a mínima vergonha das dádivas que receberam de quem falavam. O joio queria ser chamado de trigo a qualquer preço. Este ritual macabro de expulsão virou uma espécie de rotina para os cortesãos que queriam a todo custo serem os preferidos do Rei e obterem os maiores proveitos possíveis da Corte. Que alegria poder banir aqueles indivíduos irritantes, aqueles geradores de ansiedade dos quais o rei aparentava ter simpatia ou que pelas suas qualidades poderia vir a ter! Enquanto não conseguiam vê-los banidos da Corte, faziam de tudo, todo tipo de intrigas mesquinhas, para que o rei os colocassem no ostracismo para verem humilhada a sua grande reputação e a sua autoridade, como se representasse prelúdio para força-lo a se retirar. Isto é o que a maioria dos cortesãos estavam habituados a fazer com aqueles cujo poder achassem maior ou que tivessem atingido uma importância considerada imprópria, haja vista que não se preocupavam com a coesão de uma corte rodeada de inimigos, que não trabalhavam para a sua glória maior e só pensavam em si mesmos e nas suas próprias ambições e intrigas mesquinhas. Ninguém encontrava absolutamente nenhum motivo para ajudar ninguém, a não ser que lucrassem com isso. E se o bom cortesão forasteiro não tivesse nada que atraísse o interesse dos maus cortesãos, despertava-se nestes a hostilidade, pois aquele era visto como um adversário, mais um para atrapalhar o interesse deles.
Todos eram vítimas da corte. O tempo na corte se encarregava de frustrar e desgastar os seus habitantes. Eles se decepcionavam com os outros, com os acontecimentos, com a realidade do convívio sob os interesses palacianos que em nada combinavam com os interesses dos locais distantes da Corte, que para muitos de seus habitantes ignorantes e arrogantes era considerada uma megalópole .
Dizia o ditado popular: "Quem luta contra monstros deve ter cuidado para não se transformar em um deles". Não era raro que a vida na corte endurecesse os bons cortesãos e até os transformassem em pessoas cruéis. A maioria eram os maus cortesãos embrutecidos pela própria natureza e pela Corte que agiam contra os próprios companheiros, ao passo que existiam pouquíssimos bons cortesãos e praticamente ninguém dividia seu último pedaço de pão.
Vejamos o ocorrido com um bom cortesão:
"Encarregado das finanças da Corte quis de início se comportar como homem de bem e impedir de roubar aqueles que estavam abaixo dele; logo foi acusado de ser o maior ladrão [...] e com grande dificuldade pôde evitar ser condenado. Tendo enfim sido absolvido e continuado em seu cargo por algum tempo, resolveu se comportar como os outros tinham feito antes dele deixando roubar aqueles que tinham o costume de fazer isso, e então foi considerado por todos homem de bem."
A única boa companhia na Corte era o trabalho, embora monótono, repetitivo, sem criatividade, na sua maioria de baixo nível intelectual. Na Corte, havia profissionais de diversas áreas de formação que abandonaram as áresa de suas respectivas formações porque trabalhando como servidor público para os interesses do reino, sem valerem mais tanto relativamente quanto absolutamente do que os demais trabalhadores fora da Corte, ganhavam melhores remunerações do erário real do que os servidores públicos que trabalhavam distante da Corte e mais diretamente para o benefício dos súditos do reino, especialmente os professores e profissionais da área da saúde. Isto era reflexo dos valores morais do Reino, cujo único aspecto profissional que cultuava era o do egoismo e avareza.
+++
'Para que o mal triunfe basta que os bons não façam nada'...
Edmund Burke
+++
"De tanto triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto"
Rui Barbosa
+++
A justiça era muito falada entre os cortesãos amigos do rei.
Os cortesãos que não perdiam a oportunidade de falar que eram justos assemelhavam-se aos entusiastas, mas não era o coração que os entusiasmava e sim a vingança que ardilosamente escondiam atrás da palavra ‘justiça’. E, quando se tornavam refinados e frios, não era pelo o espírito, mas sim pela dissimulação da inveja. Estes cortesãos vingativos eram descobertos pela sua enfática pregação pela igualdade mas que não passava de um delírio tirânico da própria impotência que assim gritava neles por ‘igualdade’; os mais tirânicos secretos desejos de vingança se disfarçavam em palavras de ‘virtude’! Em cada um de seus lamentos ressoava a vingança, em cada um de seus elogios havia injúria; e ser juiz lhes parecia a bem-aventurança. Na corte a cautela determinava que se desconfiasse de todos o que falavam bastante de sua justiça, pois quando eles se denominavam “os bons e os justos”, não se podia esquecer que a coisa que mais sentiam falta era de poder para realizarem seus torpes desejos! E, infelizmente, ainda havia muitos que desejavam ser misturado e confundido com esses cortesãos pregadores da igualdade.
Nada funcionava melhor no serviço público da Corte do que as decisões dos Cortesãos com função nos tribunais inferiores, quase sempre compostos de idiotas, rigoristas imbecis, pusilânimes e pelegas, cuja única segurança que aparentavam era de que outros corrigiriam sua estupidez, nada os detinha quando as desejavam cometer.
Os pareceres dos doutos cortesãos substituiam textos da lei; de excesso em excesso, tornavam-se verbosos em se tratando de coisas fáceis; mudos quanto às difíceis; difusos acerca de assuntos de estreitas proporções e consequências. E sempre voltados aos interesses da Corte, ainda que ilegítimos e imorais.
As decisões eram pautadas não no Direito da época, mas sim na psicologia do medo de decidir a favor da verdade contra o rei e seus pelegas..
As leis eram feitas e as penas aplicadas pelos maiores transgressores.
Só os maus eram agraciados pela vida, só os injustos eram recompensados.
A responsabilidade dos prepostos do rei era digna de nota.
O objetivo básico era o de levar os súditos a fazerem o que eles mesmos deveriam fazer transferindo também para eles as suas responsabilidades. Para isso usavam de diversas artimanhas: Ficavam inacessíveis e ignoravam os súditos e os subordinados bons cortesãos. Tomavam decisões ruins ou simplesmente se omitiam para que com o tempo os bons cortesãos os vissem como um enorme obstáculo ao progresso e mais frustrados com a Corte do que um pica-pau numa floresta petrificada acabavam por fazer o seu trabalho. Outras vezes criavam o que hoje denomina-se de 'equipes autogerenciadas' cujo objetivo dissimulado era o de obrigar os subordinados a fazer suas tarefas e as deles. Era mais ou menos como ensinar as vacas a ordenarem a si próprias.
Certa vez, uma Senhorinha humilde foi até a Corte com uma receita médica para pedir auxílio, em vista de na área onde residir, distante da Corte, não haver qualquer investimento social do Reino. Lá chegando, é recebida pelo cortesão 'amigo' do rei e do 'reino' que meio sem jeito lhe diz: " Sabe Senhora, é que aqui na Corte não temos remédio para dar. A Senhorinha na sua humilde subordinação mas com sabedoria retruca: "É verdade meu filho a Corte e o Reino não têm remédio...
+++
"Se todos os maus cortesãos do Reino recebessem exatamente o que mereciam, sobraria muito dinheiro no Reino"
Autor desconhecido - um provável economista
+++
Quando algum bom cortesão propunha a adoção de condutas que combateriam algumas imoralidades na Corte, havia sempre um mau cortesão 'amigo' do rei para fazer o comentário de que a proposta só podia ser de pessoa que só enchergava o próprio umbigo.
Em outras palavras: esquece-se de que um dia também poderia usufruir das vantagens 'imorais'.
O falso moralismo era a principal arma da falsidade, da ardilosidade, do egoismo dissimulado.
O que se chamava opinião geral reduzia-se para ser preciso à opinião de duas ou três pessoas pusilânimes e pelegas do Rei. As opiniões universalmente válidas no Reino e na Corte Avarenta nasciam em um primeiro momento por meio de dois ou três pelegas que as difundiram, apresentaram ou afirmaram em prol do interesse próprio e que pela benevolência dos bons cortesãos muitos outros acreditavam que fossem frutos de um profundo exame e/ou fosse prejulgando a competência destes e/ou porque a preguiça mental os impelia a crer antes que tivessem o trabalho de examinar as coisas com o rigor intelectual necessário. E assim cresciam dia após dia o número de tais seguidores preguiçosos e crédulos.
De fato, uma vez que a opinião tinha um bom número de vozes que a aceitavam, os que vieram depois supunham que só podia ter tantos seguidores pelo peso concludente de seus seguidores. Os demais bons cortesãos eram odiados por pensarem de modo diferente e eram tachados pelos pusilânimes pelegas do Reino de subversivos , espíritos inquietos que se rebelavam contra as regras, opiniões e práticas consuetudinárias universalmente aceitas no Reino e sua Corte . Mas, na verdade, eram odiados não tanto por suas opiniões diversas das dos 'maus cortesãos', mas sim por serem invejados pela sua audácia, força de caráter de pensar de forma autônoma, independente, julgar por si mesmo, coisa que os pelegas e pusilânimes por fraqueza de caráter nunca faziam e, por dentro, eram conscientes disso !
Em suma, na Corte eram muitos poucos que queriam ou podiam pensar, mas todos queriam ter opiniões ! E que outra coisa restava aos maus cortesãos senão puxar o saco das opiniões universais do reino em lugar de formá-las por conta própria ? Dado que era esta a moral que sucedia, o que poderia valer a voz de centenas de milhões de outros habitantes do Reino e de suas Cortes ? As verdades das Cortes resumiam-se em "Eu digo, tu dizes, ele diz, nós dizemos, vós dizeis, eles dizem" e depois de algum tempo ninguém mais pensava sobre aquilo que dizia e ouvia !!! Todos os pelegas pusilânimes eram como um Siegfried com chifres, imerso na maré da incapacidade de pensar e julgar.
Um dos principais motivos dos maus cortesãos invejarem o caráter dos bons cortesãos e criticarem suas opiniões era a intenção de tornarem os bons cortesãos iguais a eles, fazer dos bons uns sonsos tagarelas, maliciosos, irritados, cinicos, sem consciência e nem inteligência tudo direcionado para neutralizar a diferença qualitativa a fim de manter invertida a hierarquia natural e justa.
Na Corte não reinavam a fidelidade e a lealdade porque o Rei e seus prepostos não as exercia ( o mau exemplo vinha de cima ) e o bem era mal recompensado. A regra para a sobrevivência era pressupor que o outro nunca faria o honesto, logo ninguém poderia se dar ao luxo de fazê-lo também senão seria 'lobo x ovelha' em um quarto escuro e o resultado você já sabe. Pisando em terreno escorregadio temos de nos aproximar dele devagar, mais atenção ainda devemos ter ao caminhar sobre ele.
A simples lembrança desses escorregadios artifícios da estreiteza e da incapacidade do caráter predominante no Reino e suas Cortes irmanadas à teimosia, ao orgulho e à falta de probidade ainda me provoca intensas náuseas.
Quanto mais perto da Corte mais necessário se fazia possuir as suas ‘virtudes’. Mesmo sabendo que um dia poderia ser vítima da Corte, o exemplo moral da Corte era muito admirado por súditos distantes que não a conhecia bem e por todos que possuíam o desejo ardente pelo poder e, assim, dela desejavam se aproximar a qualquer preço. Assim , imitavam as virtudes do Rei e de seus vassalos, para obterem a sua simpatia ..[..].
As virtudes longe da Corte eram comparadas a um amor de mãe. Qual mãe quis ser paga por seu amor pelo filho? Na Corte, a virtude era sinônimo de pagamento, recompensa e retribuição. O próprio rei a fim de controlar os ânimos egoístas de seus cortesãos, mentirosamente, introduziu regras de recompensa e castigo no fundo da alma dos “virtuosos” a fim de estimulá-los a se manterem por exclusivo interesse próprio sempre no caminho da virtude, mantê-los sob controle de seus interesses e até mesmo evitar carnificinas! Em decorrência desta política, havia muitos cortesãos orgulhosos de seu punhado de virtude e, em nome dela e da justiça decorrente dela, cometiam ultrajes contra todas as coisas, de modo que a corte se afogava em suas injustiças. E, quando diziam ‘ sou justo’ , soava sempre igual a “estou vingado! "Havia também aqueles que diziam que a “virtude era necessária”, mas no fundo acreditavam apenas que a polícia da corte era necessária. Havia também os que não podiam ver o que havia de elevado nos outros e chamavam de falta de virtude, vícios, o fato de verem muito de perto o que nos virtuosos havia de baixo: assim, chamavam de vícios alheios os seus próprios mau-olhados.
Todos eram muito solidários, de modo que quando um ‘amigo cortesão’ tinha água até a cintura, estendiam-lhe a mão para salvá-lo; mas, quando estava mergulhado até o queixo, metiam-lhe o pé na cabeça para submergi-lo. Em outras palavras, enquanto não tinham um modo bem seguro para arruiná-los, dissimulavam serem amigos, em vez de outra coisa; contudo, tão logo a ocasião permitisse para poderem, com segurança, lança-los na ruína, fazendo-lhe e dizendo-lhe todos os males, verdadeiros ou falsos que fossem, faziam-no sem reserva, com a arte do engano e tudo o mais que pudessem imaginar.
A HONRA ENTRE OS MAUS CORTESÃOS
Ilustrarei com uma velha anedota da própria Corte.
“Dois <> do Rei e um padre são lançados à deriva num pequeno barco salva-vidas após um naufrágio. A água potável acaba. Não têm alimentos. O Sol bate-lhes implacavelmente. Finalmente, após o 3º dia avistaram um atol. Mas, as correntes são adversas e não conseguem aproximar-se mais do que 250 metros. Para complicar as coisas, há uma autêntica escolta de tubarões a deslizar atrás e à frente entre o atol e o barco.
Todavia, um dos cortesãos << amigos>> do rei, meio louco de sede, solta do barco, começa a nadar para a praia enquanto os dois olham esperando que os tubarões fizessem o trabalho sujo de o fazer em pedaços.
Estranhamente, porém, os tubarões abrem alas e deixam-no continuar a nadar. É milagre diz o padre ! Não – diz o outro cortesão – apenas cortesia profissional.
+++
Cortesia não era propriamente matéria que se via nas escolas da Corte e nas famílias dos cortesãos <> do Rei, mas era um conceito absolutamente fundamental para os cortesãos tornarem as coisas mais fáceis para si próprios e sempre usada pelos maus cortesãos à custa dos outros.
Não economizavam afabilidade quando outra pessoa pagava a conta da sua gentileza, ou ficava com o custo do tempo, do dinheiro e do esforço laboral..
Na Corte, em qualquer situação próxima ao Poder. Dentro de qualquer local e tipo de trabalho, de qualquer nível de prestígio e influência, a dinâmica que prevalecia entre os cortesãos era essencialmente a dinâmica do toma lá, dá cá..
A menos que fossem santos ou tolos, fazia parte da agenda proteger as relações habituais com os demais <>. Nenhum cortesão podia ser tão ingênuo ao ponto de não se aperceber disso.
COMO OS MAUS CORTESÃOS FAZIAM OS BONS CORTESÃOS PARECEREM MAUS
Isso sempre ocorria quando havia dinheiro em jogo; misteriosamente muitos passavam a ser pessoas de outra espécie.
Enquanto os cortesãos estavam numa situação onde ambos se beneficiavam, por se fazerem um ao outro parecer bons, eles esforçavam-se por assim proceder. De modo oposto, quando havia disputa punham-se na disposição de ofender, difamar, caluniar os outros..
A ideia, nesses casos, era de impugnar a qualidade do trabalho do outro e não importava que solidez tivesse realmente esse trabalho, ele era sempre impugnado.
+++
O clima organizacional da corte fazia com que as pessoas que venerassem a verdade, desejassem o bem alheio, praticassem o altruísmo, fossem tachados de insubmissos, radicais e outros adjetivos da espécie e isto porque expunham de forma contundente a inação, a omissão e as falhas dos cortesãos amigos do rei que sempre tinham um lado autoritário mal resolvido que buscavam compensar com o prejuizo alheio. Desta forma, a cultura da corte só favorecia aqueles que se escondiam no conforto da omissão, assim agia todos os considerados 'sábios da corte'. Já o veraz - aquele que vai para desertos sem deuses e na areia amarela e queimado do sol, olha de soslaio, sedento, para as ilhas ricas em fontes de águas cristalinas, onde seres vivos descansam sob as sombras escuras das árvores frondosas, mas sua sede não o convence a se tornar como esses confortáveis. Ainda que famintos, solitários, redimido de deuses e adorações apenas da boca para fora como os sábios da corte, preferem a solidão do deserto ao conforto de onde moram os bem nutridos - os animais de tiro - aqueles que puxam, como asnos, arreados, a carroça do rei, ainda que resplendam com arreios de ouro.
O método de ensino escolar na corte era digno de ser comentado: Era direcionado para preparar os filhos desde cedo às regras da cortesania, ou seja, era centrado na competição e nunca na colaboração pelo interesse coletivo. Em geral, funcionava assim: o professor ficava de pé diante da classe e fazia perguntas a fim de que as crianças da corte ficassem ansiosas para responder, torcendo para serem escolhidas e mostrarem sua inteligência. O professor escolhia um aluno a fim de ver olhares de decepção e desânimo nos rostos dos demais que perderam uma chance de obter a aprovação do professor amigo do rei. O procedimento era altamente competitivo. Além disso, esse processo educacional garantia que as crianças, futuros cortesãos, não aprendessem a gostar dos outros. Com o passar dos anos, crescia a torcida dos que não eram escolhidos pelo erro dos escolhidos.
O objetivo principal do ensino na corte não era a difusão do conhecimento mas tornar as crianças mentirosas, falsas, oportunistas, ardilosas, soberbas, puxa-sacos, invejosas etc.. Os estudantes puxa-sacos por sua vez eram utilizados pelo rei e seus “amigos” como ferramenta para ofenderem os cortesãos “menos” brilhantes, ou seja, que não eram puxa-sacos!
As crianças e os adolescentes aprendiam a ler e a escrever, mas não a imaginar. Aprendiam a calcular, mas não a observar; Aprendiam a acumular dados, mas não a deduzir e expandir o raciocínio esquemático; aprendiam a repetir informações, mas não a construir algo novo. Aqueles que não se submetessem ao sistema de ensino eram alijadas do sistema social da Corte.
O ensino refletia o ambiente social da Corte que priorizava o acúmulo de informações e não o debate de idéias. Priorizava respostas prontas e não a arte da dúvida. O templo da 'cortesania' não era menos rígido nem dogmático do que certos templos religiosos, não obstante seus mentores se dissessem religiosos e admiradores de Jesus Cristo que por sua vez possuiu uma borbulhante capacidade de estimular o debate de idéias e a arte de pensar. A competição predatória, o controle do pensamento e a proibição do debate de idéias eram os pilares da governabilidade das Cortes e da realeza. Na Corte, só havia espaço para a cultura informativa que por si marginalizava a sabedoria e o desprendimento. Todos os grandes artistas das mais diversas artes eram importados de locais distantes da Corte.
O AMBIENTE ESCOLAR REFLETIA TAMBÉM O AMBIENTE FAMILIAR DOS MAUS CORTESÃOS:
-Era comum um Pai de 50 anos ser expulso duas vezes seguidas do jogo de futebol do filho por ter gritado com os outros meninos de 13 anos !!
-Uma cortesã solteira sabia que o filho de 13 anos não gostava que ela fizesse festa com os amigos no quintal até tarde da noite nos fins de semana, mas ela não se importava;
-Uma casal de cortesãos costumava ter brigas feias, eles se xingavam e atiravam objetos um no outro, mas ficavam perplexos quando o filho era castigado na escola por ser violento;
-Uma adolescente não conseguia ser a solista na apresentação de final de ano da escola e do palácio real e sua frustração só piorava quando seus pais reclamavam com seus professores subordinados , que eles consideravam como se fossem seus escravos;
-Os pais compravam jogos de guerra e comemoravam toda vez que o filho "matava" alguém quando jogavam juntos;
-As críticas feitas nos ambientes de trabalho da corte era fruto do que imperava no ambiente familiar, fazendo com que as crianças sintam como se não conseguissem agradar.
Os melhores alunos ao concluírem o estudo escolar estavam aptos para:
![]() |
|
1.Tornarem-se fechado, herméticos, rígidos, austeros;
2.Darem as mesmas respostas para os mesmos problemas. Repetirem os mesmos erros com frequência elevada;
3.Construirem um raciocínio uniangular, linear, lógico, exclusivista. Tornarem-se especialista em julgar e não em acolher.
4.A verem os seus problemas como intransponíveis. A serem vítimas do ciúme e da inveja. A incomodarem-se com o sucesso dos outros.
5. Tornarem-se insatisfeito. Viverem entediado, presos nas tramas da mesmice.
Os maus cortesãos eram adultos que não aprenderam a controlar a raiva durante a própria infância e passavam os seus maus hábitos para a geração seguinte. Tal comportamento criava um círculo vicioso que só terminava quando alguém resolvesse dizer: " Isso acaba aqui".. Infelizmente, nunca houve ninguém tão nobre para isso !!!
ISTO EXPLICAVA O CONFLITO COM OS BONS CORTESÃOS QUE ERAM CRIADOS POR FAMILIAS LONGE DA CORTE E REALIZARAM SEUS ESTUDOS IGUALMENTE EM ESCOLAS DISTANTES DA CORTE, PORQUE ESTES APRENDERAM:
1.A pensar sob múltiplos ângulos, a considerarem fatos históricos, sociais, psíquicos, existenciais, na organização esquemática do raciocínio;
2.A exercitarem diariamente a libertação do pensamento multiangular, antidialético ou imaginário. A lutar contra toda forma unifocal, uniangular e fechada de pensar;
3.A Usarem a arte da dúvida para questionarem verdades absolutas e paradigmas rígidos. A treinarem abrir o máximo de janelas da memória nos focos de tensão;
4.A superarem a armadilha do conformismo e do medo de ousar. A terem coragem para percorrer caminhos inexplorados.
5.A desengessarem a mente humana. A enxergarem o caos como oportunidade criativa. A não terem medo de pensar diferente.
Os bons cortesãos necessitavam inibir a própria generosidade, o amor ao debate, ao mundo das idéias para ficar de acordo e poder sobreviver ao sistema educacional e de valores doentio da Corte. Ter idéias diferentes, propor novas linhas de pesquisa, quebrar paradigmas, que atualmente são motivos de aplausos nas universidades de países ditos por socialmente desenvolvidos, era motivo de ardentes desejos de vinganças e perseguições.
O ditado que diz: "em terra de cego quem tem um olho é rei" surgiu de um mau cortesão porque se pensarmos bem sobre ele, veremos que, na maioria das vezes, é objeto de ameaça, inveja e escárnio com a ignorância alheia.
Também se usavam métodos para a rápida disseminação da discórdia:
separavam-se os estudantes em grupos, depois os misturavam de novo sob a chama da competição constante. Resultado: o ódio intergrupal no seu ponto máximo. Os piqueniques geravam guerras de comidas; programas de entretenimento transformavam-se em concursos de xingamentos; filas no refeitório degeneravam em empurrões, etc.. Não era raro que surgisse na corte um rei, um duque, um conde, um marques tipo “frankesntein” que ninguém conseguia controlar. Em suma, só havia dois grupos de pessoas felizes na corte: as crianças em fase pré-escolar e os mortos.
Os melhores alunos eram toscos, agressivos, rudes, instintivos, reagiam sem pensar, eram péssimos gestores do seu psiquismo, não tinham traços de altruismo nem sombra de resiliência.
Por falar em morte, a religião na corte também era assunto digno de nota.
Havia poucos cortesãos que pouco falavam de religião, quando o faziam quase sempre se diziam agnósticos ou até mesmo ateus. Estes eram conhecidos como os homens da face vermelha porque impunham a si próprio não envergonhar e sim ter vergonha diante de todos que sofriam, já os demais, os fervorosamente religiosos, os de face pálida – a maioria - agiam desavergonhadamente entre os cortesãos como se fossem animais selvagens. Chamavam Deus a tudo que lhes causava dor e não podiam destruir. E não sabiam amar seu Deus de outra forma senão pregando na cruz o ser humano ! Em suas falas sentia-se o mau cheiro das câmaras mortuárias. O espírito desses cortesãos era feito de lacunas; em cada lacuna tinham postos suas ilusões, seus tapa-buracos que chamavam de religião, principalmente os da doutrina espírita que apenas a tinham da boca para fora, uma cortina de fumaça para esconder o seu real caráter, nunca no coração. Quando se inflavam e inchavam de compaixão, sempre boiava na superfície uma grande tolice. Zelosamente planejavam ardilosamente empurrar o seu rebanho sobre a estreita ponte de seus interesses próprios. Gostavam de parecer desprendidos do dinheiro, condenavam o materialismo, mas no fundo o amavam silenciosamente. Viviam endividados. Era só colocar algum dinheiro a mais em suas mãos que o monstro da cobiça hibernado despertava.
Ali estavam os ‘falsos humildes’: era necessário passar por eles em silêncio e com a espada na bainha !” Também entre eles havia heróis, muitos deles sofreram muito - : assim, queriam fazer outros sofrerem. Eles eram os piores inimigos: nada escondia maior caráter vingativo do que sua falsa humildade. E, por isso, sujava-se facilmente aqueles que os atacavam. Esses falsos humildes também causavam pena. Cadeias de falsos valores e palavras ilusórias ! Longamente dormia neles a fatalidade até que despertada, comia e engolia os que sobre ela construíram suas choupanas.
Entre os muitos sacerdotes de Júpiter, contratados para invocar as bênçãos do céu, alguns havia sábios e eloqüentes, mas milhares lascivos e ignorantes; Contudo, todos preenchiam os requisitos que podiam ocultar sua preguiça, luxúria, avareza e orgulho, pelos quais eram tão famosos quanto alfaiates por sonegar retalhos e marinheiros por rum. Alguns, magros e pobremente vestidos, rezavam misticamente por pão, com isso querendo dizer uma farta despensa, contudo, literalmente, não recebiam nada além. E, enquanto esses santos labutadores passavam fome, Alguns preguiçosos a quem serviam abandonavam-se ao ócio, com todas as graças da saúde e da fartura nas faces.
Na corte era comum viver-se ao lado de muitos mentirosos destrutivos e simulados sem que alguém os confrontasse fosse simplesmente por não serem percebidos, haja vista que se camuflavam muito bem atrás do fingimento permanente da falsa benevolência e sensibilidade com os problemas alheios fazendo com que as pessoas de boa consciência fossem enganadas pelo próprio bom sentimento – equivocado - de culpa gerado por achar tão absurdo o próprio raciocínio a favor de acreditar na hipótese da sociopatia como também eram bajulados por estes na tentativa de escaparem das suas agressões ...[..]. Era visível o paradoxo de que quanto maior fosse o potencial destrutivo do cortesão pela sua falta de caráter, maior era a sua bajulação pelos demais cortesãos de bom caráter ao invés de isolá-lo e bani-lo. Talvez pela simples intenção de escaparem das suas agressões ...[..].
As formas de ardil, de dissimulação, eram das mais variadas possíveis, havia aquele que escondia a verdadeira intenção do prejuízo alheio por trás da aparência de uma imensa simpatia e solicitude aos problemas alheios, ria da dúvida alheia por qualquer que fosse , quase igual a um “bobo da corte” mas tudo não passava de uma enorme falsidade para sutilmente passar-se por superior. Quando lhe era pedido alguma ajuda, estava sempre pronto a dar grandes gargalhadas, ironizando o problema alheio assim fazendo a propaganda de que a dúvida em questão era não só banal para ele mas também coisa de idiota para quem perguntava, além do que a ajuda deveria tomar o aspecto da maior publicidade possível, não poderia jamais passar despercebida ..[..]. Isso tinha que chegar ao Rei, de qualquer forma, se por razões honestas ou desonestas, isso era insignificante porque ele sabia que o Rei distante jamais perceberia a sua face da desonestidade...
Todo bom cortesão que caminhasse pelas estradas da corte necessitava da cautela de ter no ânimo a preocupação de observar os maus cortesãos, ou seja, aqueles com muito menor fogo do que de fato tinham. os que simulavam satisfazerem-se com o que lhe parecia pouco, dissimulando desejos, ciúmes, ansiedades e prazeres, rindo muitas vezes com a boca enquanto o coração chorava, mostrando ser prodigo naquilo em que é excessivamente avaro; e tais coisas, que fazem fronteira com o impossível, são tão difíceis de serem levadas a cabo. Por isso, se o cortesão quisesse sobreviver, deveria manter suas opiniões, intenções, e tudo o mais, em segredo.
+++
“Nenhum mortal consegue guardar um segredo.
Se os lábios se calam, ele fala com a ponta dos dedos; trai-se por todos os poros”
SIMUND FREUD
+++
Um segredo entre três pessoas só existe se duas estiverem mortas
San Giancana
+++
Sempre com discrição e prudência ao falar, portanto, sem causar desagrado por serem ouvidos, diziam apenas palavras que importavam e em voz alta todas as outras que podiam adequar-se a diferentes propósitos sem importância. Quem não fosse bastante discreto cometia erros que pareciam pequenos para quem os fazia, todavia corria-se o risco de ofender terceiros ou possibilitar difusões maledicentes.
Para colocar os invejados em situação desfavorável, enquanto não houvesse algum outro modo melhor de arruiná-los, falava-se mal deles, contudo, jamais deveriam se lamentar da corte com ninguém.
Os cortesãos gananciosos ( condes, duques, marqueses, e outros senhores ) aproveitavam-se do privilégio de serem “amigos” do Rei e elaboravam suas campanhas vingativas por meio de mentiras dissimuladas destrutivas, insinuações e malícias maldosas a respeito de outra(s) pessoas, a fim de macular as qualidades morais que invejava nelas que por não poderem roubá-las, tais como a inteligência, o sucesso, o caráter reto forte, procuravam maculá-las de modo que os invejados as perdessem no ambiente social onde conviviam ou, no mínimo, não pudessem ser capazes de aproveitá-las por completo. O seu prazer era o de privar e não de esforçar-se para possuí-las por mérito próprio. Assim, seu objetivo era o de diminuir os outros. A vingança contra quem não percebia que virou seu alvo era a atividade mais importante na vida desses cortesãos e cortesãs sociopatas, sua prioridade absoluta na Corte. Infelizmente, a atividade reptiliana era imperceptível para quase todos para quem a doença não era de notória clareza e isto tornava a abordagem da realidade comprometida fazendo-os achar que era a própria imaginação, que estavam exagerando ou até mesmo que tinham alguma responsabilidade pelo comportamento da cortesã que, por sua vez, como lobo em péle de cordeiro, estudavam-nos para saber como manipulá-los, usá-los, adulá-los, a fim de conseguir o objetivo de destruição da sua presa.
+++
A política desconhece valores, princípios e arruína o caráter ! ! !
"O poder tende a corromper.
E o poder absoluto corrompe absolutamente".
Lord Acton
+++
Todo Rei era rodeado de seus cortesãos profetas. Eles sempre diziam ao Rei: "Se você não fizer isto ou aquilo, mil coisas terríveis irão acontecer". "Possivelmente, já estamos atrasados".. Era evidente que esses tipos de maus cortesãos não tinham um verdadeiro interesse pelo Rei, pelo Reino ou pela Corte, eles estavam interessados apenas em criar situações em que não corriam riscos eles mesmos e de obterem algum crédito pelo êxito antecipado e de se protegerem contra fracassos futuros !
Os Reis e seus diretores-executivos ( Condes, Marqueses, Duques ) não raro distanciavam-se do que realmente acontecia no Reino e suas subdivisões de poder. Conversavam o tempo todo com as mesmas pessoas, em geral, os titulares bajuladores de cada divisão administrativa.
O rei e seus bajuladores não conheciam as pessoas que estavam dois degraus abaixo de si. Por isso, não tinham visão de futuro e uma boa compreensão do presente, até que a revolução social deu início as decapitações !!!
Metaforicamente: Uma das maneiras de se perder dinheiro nos negócios é ser vítima da síndrome de grandeza.
No Reino parecer bom tornou-se preferencial a ser bom.
Nunca se devia subestimar um preposto do Rei. O jogo na Corte nunca terminava. Não havia líderes insuperáveis. O mau cortesão tinha sempre tempo para recuperar. A competição na Corte era um processo ativo e constante de dominação.
A vida social na Corte exigia conhecer quanto melhor possível o concorrente - as suas forças, as suas fraquezas, os seus hábitos, a sua tática a fim de se defender, muitas vezes a própria vida.
Até um espirro do rei tinha grande significado para os seus bajuladores maus cortesãos ambiciosos dissimulados. Embora a fortuna tenha imensa força nas opiniões dos homens, às vezes acontecia de um fidalgo, por melhores condições que tivesse e mesmo dotado de muitas graças, não desfrutasse da simpatia do rei e isso sem nenhuma causa que se pudesse compreender, salvo por ser vítima de inveja e difamação. Assim, embora se mostrasse contido nos gestos, nas maneiras, nas palavras e em tudo que conviesse, ao ser percebido pelos demais cortesãos que o rei o estimava pouco, resultava logo na adaptação destes à vontade do Rei e todos passavam a amplificar o tratamento dado pelo rei a fim de parecer exageradamente que aquele cortesão não tinha valor, nem haveria quem o apreciasse ou estimasse seus ditos agradáveis ou tivesse qualquer consideração por ele; ao contrário, começavam a burlar-se dele e não o deixavam em paz; a esses coitados ainda que fossem os mais valorosos do mundo, seriam vítimas de críticas e chacotas.
Entretanto, se o rei se mostrasse simpático à alguém muito ignorante, que não soubesse dizer nem fazer, eram muitas vezes os costumes e os modos daquele, por mais idiotas e ineptos que fossem, elogiados com exclamações e admirações por todos e parecia que toda a corte o admirava e observava, todos riam de seus motejos e de certas argúcias camponesas, frias e sem graça, que antes deveriam provocar vômitos do que riso, a tal ponto que comprovava como os cortesãos eram firmes e obstinados – não pela verdade – mas pelas opiniões que nasciam dos favores e desfavores do rei e de suas autoridades. Era assim também, de autoridade para autoridade; quando os maus cortesãos se referiam a um outro mais amigo do rei, encontravam sempre eufemismos para as suas faltas e atribuiam-nas a sua alegria e honorável ambição.

Por natureza, os “cortesãos” eram mais propensos a criticar os erros do que a elogiar as coisas bem feitas e as pessoas, e parece que por uma certa maldade inata, muitos apesar de claramente conhecerem o bem, se esforçavam com todo estudo e engenho para pilhar o próximo em erro, ou em similitude de erro. Alguns pareciam ter como único prazer o de molestar e perturbar feito moscas e faziam questão de contradizer despeitosamente a todos que se aproximavam do rei, sem nenhum respeito. Preocupavam-se, a cada dia, demonstrar possuírem os valores que interessavam ao rei e empenhavam-se com todos os pensamentos e forças de seu espírito a simular que o adoravam para serem adorados pelo rei a quem aparentavam "servir" acima de qualquer outra coisa. Todas as suas vontades, costumes e maneiras eram dirigidas nesse sentido, ainda que muito desconfiassem de que o rei, por ter sido cortesão, considerava-os ‘nobres aduladores’ que – em verdade - não amavam ninguém exceto a si mesmo.
O rei representava o pior dos celerados e depois deste, vinham os seus vassalos preferidos: duques, condes, marqueses; completamente alheios à religião e a todo bom costume e quando a sua vida dissoluta lhes era recriminada, debochavam e riam de quem lhes falava disso, e, pela ‘autoridade’ que representavam, quase tornavam seus vícios em objeto de louvor, paradigmático para os humildes e incautos que os conheciam de longe.
Quando conseguiam a graça do Rei e se encontram numa situação que superasse a mediania, isso lhes subia tanto a cabeça que ficavam inebriados; a tal ponto que pareciam não saber o que fazer com as mãos e os pés, e punham-se a chamar os amigos para que viessem vê-los e se congratulassem com ele, como se fosse coisa com a qual não estivessem acostumados. Logo após, com o poder subindo a cabeça, começavam a desprezar o mundo, queriam com uma austeridade incômoda ditar regras a todos e, além de serem litigiosos e fora de propósito nas menores coisas, censuravam aquilo que não faziam e encontravam sempre motivo para lamentarem-se dos ‘amigos’.
Os cortesãos também observavam e valorizavam mais a opinião dos outros do que a própria, sobretudo porque quase a totalidade dos cortesãos assim agiam. Certa vez foram apresentados alguns versos com o nome de Sanazaro, a todos pareceram excelentes e receberam loas com exclamações de maravilhamento; depois, quando se soube que pertenciam a outro, logo perderam a reputação e pareceram menos que medíocres. E, quando se cantou um motejo na presença da rainha, não agradou nem foi considerado bom, enquanto não se soube que se tratava de uma composição de Josquin de Pris. Que sinal quereis mais claro da força da opinião e da mentira na Corte?
Frequentemente na corte não se confiava naqueles que tinham muita autoridade, porque comumente não diziam a verdade de maneira tão consumada mas, ao contrário, dava-se total credibilidade ao que uma autoridade falava quando o assunto era a depreciação de outro; e os cortesãos ouvindo contar coisas desonestas de outras pessoas, demonstravam ( ou melhor, fingiam ) perturbarem-se, não acreditarem e julgavam quase uma monstruosidade, a fim de simuladamente fazerem crer que, parecendo-lhes tão grave aquele defeito, que não o cometiam! Não obstante, de outra forma, estavam sempre investigando a vida dos outros e os relatavam tão minuciosamente e com tanta alegria que não conseguiam dissimular a inveja e o desejo de que todos soubessem do mal alheio ( em geral inventado ) para que não lhes atribuíssem o mesmo por engano; e assim se punham a rir, com certos modos que indicavam sentirem imenso prazer em deixarem no espírito de cada um dos ouvintes aquela falsa má impressão que davam dos invejados ou inimigos.
A honestidade e a confiança mútuas eram tão cultuadas na corte que certo dia o rei preparando-se para comer, retirou dos dedos anéis preciosos para não os molhar ao lavar as mãos, entregando-os ao primeiro que acorreu, quase sem olhar quem fosse. Esse cortesão pensou que o rei não tivesse prestado atenção para quem os dera e que devido aos pensamentos de maior importância seria fácil que se esquecesse completamente do fato; maior certeza teve disso ao ver que o rei não os pedia de volta; e, ficando dias, semanas, meses sem ouvir uma palavra, pensou estar seguro. E, quando ia completar um ano do ocorrido, numa outra manhã, também quando o rei se preparava para comer, tornou a apresentar-se e estendeu a mão para pegar os anéis; então o rei, encostando-se no ouvido dele, disse-lhe: “Contenta-se com os primeiros, pois estes serão úteis para outro.”
![]() |
![]() |
Com o passar dos séculos, o mundo da cortesania privada e pública ficou cada vez mais cheio de trapaças, intrigas e artimanhas. Café com lactopurga, balas de chupar que soltam gosma de cor violeta na boca do incauto, grampo telefônico, microcâmera no botão da camisa, relógio-gravador, aperto de mão elétrico, clips de papel pra abrir qualquer fechadura, batata chips, caneta capaz de filmar quatro horas seguidas, esponja molha-dedo embebida em veneno. Mensagens interceptadas, enigmas, ordens de serviço impublicáveis, resoluções confidenciais, pareceres secretos, vigilância eletrônica.
O preço de toda falsidade em qualquer época é a eterna camuflagem. Por isso, na Corte, os maus cortesãos não se incomodavam quando eram chamados de hipócritas , leva-e-trás maneiro…(...)
Nas reuniões de planejamento, os cortesãos amigos do rei limitavam-se a informar que uma mudança muito, muito, radical se aproximava, mas que no momento ele não possui informações detalhadas, mas era o que soube de um cortesão amigo do rei mais poderoso do que ele.
A informação vital para o rei e seus amigos era inimiga dos holofotes, circulava em bilhetinhos, era sussurrada em salas blindadas, e principalmente nos gabinetes, após o retorno da missa. De vez em quando, alguma inconfidência escapava no intervalo do cafezinho, no banheiro ou nos corredores. Cedo ou tarde, a informação crucial, devidamente classificada e sigilosa, explodia deturpada como uma bomba.
A diferença entre um mau cortesão agente secreto e um mau cortesão agente esperto era notada analisando-se as camadas de conhecimento que um tem do outro – é o que se chama de metaespionagem. No primeiro momento, o mau cortesão secreto (“A”) e o mau cortesão esperto (“E”) se apresentavam para o jogo; no segundo movimento, o agente “A” pensava que sabia o quanto o agente “E” sabia; no terceiro momento, o agente “A”, por pensar que conhecia o quanto o agente “E” conhecia, pensava também que sabia o quanto o agente “E” sabia a seu respeito (de “A”), e assim, sucessivamente. O sucesso do pior cortesão dependia sempre da técnica do despiste, da trapaça e da antecipação – em algum momento, o que o outro acha que sabe do adversário não corresponderá com a realidade. Como a maioria é tolo e julgam pela aparência, o segredo estava em portar-se de forma a provocar na mente alheia o pensamento que se desejava que o outro tivesse de você, como faziam os caçadores usando uma mascara de porco para caçarem o tigre. Normalmente, tratando-se de segredos da Corte , o perdedor era o bom cortesão que revelava a um suposto amigo a informação que deveria esconder do oponente.
A "consideração" dos cortesãos do rei com os súditos camponeses desprovidos de poder era também imensa.
Certa vez um humilde camponês que recebera uma forte pancada num olho procurou auxílio com um médico da corte e este ao vê-lo, embora soubesse ser impossível curá-lo, mas para arrancar-lhe dinheiro das mãos como a pancada lhe arrancara o olho da cabeça, prometeu curá-lo; e assim, todos os dias lhe pedia mais dinheiro, garantindo que dentro de cinco ou seis dias começaria a recuperar a visão. O pobre camponês lhe dava o pouco que possuía; porém, vendo que a coisa demorava, começou a queixar-se com o médico do rei, dizendo que não sentia nenhuma melhora, nem enxergava com aquele olho mais do que veria se não tivesse nenhum. Por fim, verificando o médico cortesão que pouco mais poderia tirar-lhe, disse: “Meu irmão, é preciso ter paciência: perdeste o olho, não há mais nenhum remédio; e Deus queira que não percas também o outro.” Ouvindo isso, o camponês se pôs a chorar e a condoer-se, dizendo: “Mestre, vós me assassinastes e roubastes o meu dinheiro; vou queixar-me ao senhor duque”; e dava os maiores gritos do mundo. Então o médico cortesão amigo do rei, furioso, e para safar-se daquela disse: “Ah, vilão traidor e ainda gostaria de ter dois olhos como os citadinos e os homens de bem? Passa fora” ; e essas palavras foram acompanhadas de tanta fúria que aquele pobre camponês se calou e, quieto, foi com Deus pensando estar errado.
|
A inveja também era marcante nas relações entre as cortesãs.
Certa vez uma mulher passou a amar um homem fervorosamente e, crescendo o amor a cada dia com as demonstrações que o jovem lhe fazia e não havendo como pudessem conversar, tomada a mulher de grande paixão revelou seu desejo a uma outra mulher, por meio da qual esperava obter algo. Esta não era inferior à primeira em nobreza nem em beleza; daí aconteceu que, ouvindo falar tão afetuosamente daquele jovem, a quem jamais vira, e sabendo que aquela mulher, discretíssima e muito inteligente, o amava tanto, logo imaginou que ele fosse o mais belo, sábio e discreto, em suma, o homem mais digno de ser amado que havia no mundo; e assim, sem o ver, tão intensamente se apaixonou, que não pela amiga mas por si mesma começou a trabalhar para conquista-lo e fazer com que correspondesse a seu amor, o que conseguiu com pouca fadiga, pois em verdade era muito mais mulher de ser rogada do que de rogar. Escutai agora a bela história. Pouco depois, aconteceu que uma carta, escrita por esta última ao amante, chegou às mãos de uma outra também nobilíssima, raridade pelos costumes e beleza, e sendo ela, como é comum entre mulheres, curiosa e desejosa de saber segredos, em especial de outras mulheres, abriu a carta e, ao lê-la, compreendeu que era escrita com extremo amor; e as palavras doces e cheias de fogo que leu primeiro lhe provocaram compaixão por aquela mulher, pois sabia muito bem de quem vinha aquela carta e a quem se destinava; depois, tamanha força tiveram que, revolvendo-as no espírito e imaginando como deveria ser aquele que pudera despertar tanto amor naquela mulher, logo se enamorou também ela; e fez a carta talvez um efeito maior do que se tivesse sido mandada pelo jovem. E, como às vezes sucede que o veneno em alguma comida preparado para um mata o outro primeiro que o engole, assim essa infeliz, por ser demasiado gulosa, bebeu o veneno amoroso que fora preparado para outrem. A coisa se tornou pública e continuou de modo que muitas mulheres, além dessas, em parte para provocar despeito nas demais, esforçaram-se com todos os meios para gozar do amor daquele homem, e durante algum tempo o disputaram, como fazem as crianças com a s cerejas.
E tudo teve início com a primeira opinião que fez aquela mulher, vendo-o tão amado por outra.
As más cortesãs eram tão alheias a verdade que como ovelhas desejavam fazer o que viam ser feito por outra, bem ou mal que fosse, além de serem tão invejosas umas com as outras que mesmo se esse homem fosse um monstro teriam querido roubá-lo uma da outra.
+++
O ideal de beleza do sapo é a sapa.
Assim, os semelhantes se atraem.
+++
Por isso, era necessário que o verdadeiro cortesão fosse cauteloso em cada um de seus atos; tudo que dissesse e fizesse deveria ser sempre acompanhado de muita prudência, considerando sempre muito bem os seus atos, o lugar onde estivesse, a presença de quem, a ocasião, a causa que o levasse a fazê-lo, a idade do interlocutor, a profissão, o fim para o qual tenderia e os meios que àquilo poderiam leva-lo; e assim, com tais advertências, deveria se dispor discretamente a tudo aquilo que pretendesse fazer ou dizer, pois assim também agiam os simuladores maledicentes.
Governar-se bem nesse domínio consistia numa dose grande de prudência e num certo juízo de escolha, em conhecer o mais e o menos que nas coisas se acrescenta e se subtrai para executá-los oportunamente ou não. E mesmo que tivesse tão bom juízo que pudesse discernir tais diferenças, não queria isso dizer que ser-lhe-ia mais fácil alcançar o que buscava pelo bem e para o bem. Deveria abrir o pensamento com preceitos para as vias e bases em que deveria se fundar, não poderia se ater apenas ao conhecimento geral da natureza do comportamento humano, deveria prestar atenção aos mínimos detalhes. Assim eram os dias na Cortesania, uma constante luta da arte da simulação ( arte do engano ) contra a arte da dissimulação para se manter vivo!
Para se conseguir favores, a regra longe da corte era a de fazer honestamente por merecê-los, obtê-los por merecimento, jamais motivado por inveja, nunca por meios viciosos ou vias desonestas e quem os almejava aguardava que lhe fossem oferecidos ao invés de buscá-los presunçosamente. Contudo, a experiência na Corte demonstrava com clareza o contrário, os poucos favorecidos eram os presunçosos, bajuladores e pusilânimes que - competindo por favores - não esperavam que lhes fossem oferecidos e iam buscá-los com tal avidez que se não os conseguissem pareciam que iriam perder a vida; e se por acaso sofressem algum desfavor ou vissem outros serem favorecidos ficavam tão agoniados que de modo algum conseguiam dissimular a inveja. Muitos quando favorecidos e encontrando-se numa situação que superasse a mediania, isso lhes subia tanto à cabeça que ficavam inebriados; a tal ponto que pareciam não saber o que fazer com as mãos e os pés, e esquecendo-se dos cuidados da corte punham-se a chamar os amigos para que viessem vê-los e congratularem-se com eles, como se fosse coisa com a qual não estavam acostumados.
Ninguém ascendia na Corte com respeito ao próximo, modéstia e humildade. Comumente, desejavam o poder com tal avidez que, se não os conseguissem, pareciam que iriam perder a vida; e se por acaso sofressem algum desfavor ou vissem outros serem favorecidos, ficavam tão agoniados, que de modo algum conseguiam dissimular a inveja.
O Rei, muitas vezes, favorecia qualquer um outro só para ofender os valorosos. Tal como Calígula ao nomear seu cavalo cônsul Romano para ofender o Senado.
Outros aproveitavam-se do mínimo esforço alheio em prol da solidariedade e altruísmo para fazer o comentário leviano de que tal atitude era porque havia “segundas intenções” ....
Outros cortesãos aproveitavam-se da mínima oportunidade em que alguém fizesse algo mais por outra pessoa, sem ordem, para comentar que fulano ou ciclano está se excedendo ..[..], porém , quando o fato se originava dele é porque era muito gentil....
Outros cortesãos e cortesãs quando viam alguém descansado, imediatamente tachavam de ‘preguiçoso’, mas quando eram eles que descansavam, era simplesmente porque tinham estado muito ocupados.
Outros cortesãos e cortesãs quando viam alguém decidir a favor de um ponto contrário aos interesses do Rei, imediatamente tachavam de ‘cabeça dura’ e ‘teimoso’, mas quando eram eles que decidiam, era simplesmente porque eram firmes e prova de grande caráter.
Outros cortesãos e cortesãs quando viam alguém progredir, imediatamente tachavam de que foi apenas porque houve oportunidade, mas quando eram eles que progrediam, era simplesmente porque foi fruto de muito trabalho.
A decapitação simbólica também muito servia aos cortesãos e cortesãs levianos porque eles sabiam que muitos dos que não possuíam as virtudes da corte, frequentemente, abandonavam a Corte e assim os cortesãos levianos só precisavam comentar com o Rei que os que abandonaram o seu Reino ou a sua Corte não fariam falta porque não prestavam mesmo, eram isso, aquilo,...[..]
Até mesmo o Rei e os Senhores hábeis, capazes e conscientes da existência de tal sutileza fraudulenta também tinham que se preocupar em protegerem-se dos seus ‘cortesãos' porque na imensa maioria das vezes esses também eram invisíveis para eles, mas sabiam que ‘em tese’ , mais cedo ou mais tarde mesmo os momentaneamente mais distantes, também tramariam para tira-los do caminho, quando estivessem perto, era apenas uma questão de tempo e oportunidade..
[..].
As cortes vistas de fora e ao longe eram grandes palácios, de perto cavernas de luz falseada, de ar abafado onde a alma não podia voar até suas alturas. Quem criou tais cavernas? Foram aqueles que queriam se esconder e se envergonhavam diante do céu puro.
Os cortesãos que de perto não valiam nada tinham os seus defeitos reduzidos por quem os via de longe e de maneira inversa tinham as suas supostas virtudes ampliadas pela distância . Por isso, para aqueles que conheciam a “corte” de longe, supunham que ela representasse o auge da civilização e dos melhores valores, até porque, os “cortesãos”, fossem envenenadores da boa vontade ou não, publicamente, desaprovavam as atitudes violentas ou declaradas de ambição pelo poder e sobretudo diziam-se a favor da caridade, em especial aquelas sempre acompanhada de muita publicidade.
Enquanto isso, o Rei que habitualmente por simples arrogância, vaidade, falta de humildade, ou seja lá qual fosse os outros motivos fúteis que o norteava, mantinha-se informado - sem sair do castelo - com os comentários de pessoas de sua confiança, assim, distante dos acontecimentos, via tudo conforme o interesse de seus "amigos" como se estivesse vendo de uma platéia distante uma corrida de cavalos. O seu Reino era uma grande corrida de cavalos. Os que assistiam à corrida de perto e até mesmo dela participavam , viam a tensão, o esforço dos cavalos e de quem os controlava. Mas, o Rei de longe, apostando na corrida só com os palpites de seus bajuladores, só via a elegância dos corredores cortando leve o ar, e a ‘enorme facilidade’ com que as coisas aconteciam, como os seus súditos trabalhavam felizes, como tudo era fácil e assim considerava ainda que todas as reclamações que a ele chegavam eram descabidas, ..[..].
![]() |
![]() |
Assim também eram as festas na corte. Para se obter o favor do rei era preciso que este a conhecesse a pessoa que busca ser favorecida e tivesse contentamento com suas ações e condutas. Assim, gente de todas as cidades e aldeias, de todos os níveis e condições, príncipes, duques, condes, marqueses, sacerdotes, ricos, pobres, altos e baixos, gordos e magros, todos iam em multidão ao palácio, alguns para serem vistos bajulados pelos seus súditos na frente do rei e também o bajularem e outros para simplesmente o bajularem.
Os cortesãos reunidos, de longe, aparentavam membros de uma virtuosa congregação religiosa; de perto, um emaranhado de serpentes selvagens, que raramente têm sossego estando juntas - então saem cada qual por si em busca de presas pela Côrte, querendo causar-lhe dor com aquilo que lhes causava dor. Sofria e queria o igual sofrimento alheio.
+++
O CAMELO E AS VARETAS FLUTUANTES.
O primeiro homem que viu um camelo de longe fugiu ; o segundo se aventurou a chegar perto; o terceiro mais perto ainda ousou passar um laço pelo seu pescoço.
Nesta vida, a familiaridade muda tudo, pois o que pode parecer terrível ou bizarro de longe, quando nosso olhar tem tempo para se acostumar, torna-se comum.
E por falar nisso, ouvi dizer que umas sentinelas que vigiavam a praia contra a invasão dos VIKINGs vislumbravam ao longe algo flutuando, não resistiram e gritaram: “Uma vela! Uma vela! Um poderoso navio de guerra pilotado por um grande VIKING!” Cinco minutos depois era um barco a vela pilotado por um único pirata, depois um esquife, em seguida um fardo e, finalmente, algumas varetas flutuando!!
INTERPRETAÇÃO
Há muita gente a quem a distância amplia, mas que de perto não valem nada.
É da natureza humana procurar o que , a distância, parece uma grama mais verde.
JEAN DE LA FONTAINE, 1621 – 1695.
+++
Com o cortesão sucedia o mesmo que com uma árvore. Quanto mais queria alcançar as alturas e a claridade, tanto mais suas raízes se inclinam para a escuridão das profundezas da terra, para baixo, para as profundezas do mal.
+++
A dificuldade da persuasão está em conhecer o coração do persuadido para assim adequar a ele as minhas palavras. Por essa razão, quem tentar persuadir o rei, deve observar cuidadosamente os seus sentimentos de amor e ódio, os seus desejos e temores secretos, antes de poder conquistar o seu coração.
HAN-FEI-TZU, FILÓSOFO CHINÊS, SÉCULO TERCEIRO a.c
+++
A corte, como sempre, refletia os gostos do governante.
Uma característica marcante da Corte e de suas festas é que esta era um lugar onde todos ficavam tristes, alegres ou indiferentes de acordo com o rei; ou, se alguém não se sentisse assim, tentava parecer que se sentia da melhor forma possível. Todos procuravam ao máximo imitar o Senhor, sem saber que não ultrapassavam o mediano. Esse comportamento era feito com muita facilidade, naturalidade, porque os cortesãos não se preocupavam com o futuro da corte onde viviam - todas as suas energias estavam voltadas para encantar o rei, tentando obter ardilosamente títulos que lhe dessem pensões vitalícias e funções no governo que exigissem pouco trabalho e pagassem muito bem. Os parasitas afluíam à corte. Vejamos um exemplo: "Encarregado das finanças de Paris quis um raro cortesão de início se comportar como homem de bem e impedir de roubar aqueles que estavam abaixo dele; logo foi acusado de ser o maior ladrão [...] e com grande dificuldade pôde evitar ser condenado à guilhotina. Tendo enfim sido absolvido e continuado em seu cargo por algum tempo, resolveu se comportar como os outros tinham feito antes dele deixando roubar aqueles que tinham o costume de fazer isso, e então foi considerado por todos os barões, duques, condes, e demais amigos do Rei, homem de bem."
O verdadeiro guia dos maus cortesãos era o lema:
"Que se dane a corte, quando eu não estiver mais aqui."
O rei, em raros momentos de lucidez, por sua vez, refletia sobre quando haveria alguém que lhe diria como as coisas realmente eram; quando alguém pararia de dizer só fantasias; quando parariam de disfarçar sua dor; quando alguém estaria presente naquilo que falava; quando as pessoas passariam a ser e deixariam de não ser.
Como as respostas a essas perguntas eram muito duras, ninguém se atrevia a mostrá-las ao Rei. Os cortesãos preenchiam esse vazio com constantes falastrias inúteis .
Como escreveu Erasmus no seu "elogio à loucura": 'às vezes é preciso ser louco para dizer o óbvio, para dizer que todos os problemas que nos são mostrados são falsos para que não sejam vistos os reais'.
Tal como, hoje, todas as propagandas com fotos bonitas nas revistas representam verdadeiros enganos de consciência, na época da aristocracia palaciana , o “normal” era ser adequado ao palco do teatro do Rei e de seus prepostos, para a peça escrita pelos seus “amigos”, por roteiro definido por terceiros prepostos do Rei , e, ao final, como o último ato teatral - a morte - que sempre foi solitária, era vivida sem as palmas de ninguém, apenas acompanhado de uma biografia vazia e absolutamente infeliz.
O cortesão prudente frequentemente e principalmente nas reuniões sociais palacianas necessitava mostrar não entender aquilo que perfeitamente entendia; por conseguinte, respondia àquilo que não dizia àquele com quem falava ou demonstrava acreditar que tivesse feito aquilo que não fez e devia ter feito ou a fazer, etc... Era a “arte do engano” praticada por mestres na cortesania palaciana. Pessoas que deveriam ser espontâneas e boas de conversa tornavam-se submissas e banais na relação com os cortesãos com posição de autoridade acima da sua, tanto quanto eram arrogantes com aqueles sem tal posição, os quais eram comumente desprezados. As opiniões que deveriam desencadear um diálogo animado e espontâneo, passavam a gerar declarações prolixas e empoladas de falsa concordâncias.
As ações eram mais influenciadas pela função que a pessoa representava na corte do que pela própria natureza da pessoa. Perplexo com o fenômeno da capacidade de como um símbolo de autoridade influenciava o comportamento que, além de tornar os estranhos mais submissos, também fazia com que alguns súditos vissem um cortesão ‘amigo’ do rei como uma pessoa mais alta do que realmente era, muitos preferiam não presenciar tal fato nas festas já que eram obrigados a presenciá-lo diariamente nos horários de trabalho na corte.
Tal como em algumas sociedades de animais inferiores em que a posição é atribuída com base no domínio, então havia a ambição pela chefia do setor "A", "B" ou "C"... que representavam sinais externos de poder e 'tamanho' embora pudesse representar algo falsificado. O culto ao falso tamanho era um importante fator a determinar que animal ( cortesão ) atingirá determinado nível no grupo social da corte e para evitar os efeitos prejudiciais do conflito físico, empregava-se nas agressões mais sutileza de forma do que de franqueza direta.
![]() |
Era comum na corte pessoas que usavam a mídia da época ( fofoca e difamação, ... ) para difundir suas ideias na defesa de interesses próprios por meios de argumentos pouco ou nada definido, sem conteúdo, comercializando idéias sem ideais, tentando impor os seus interesses como se fossem a coisa mais importante do mundo. Assim era comum, ouvir-se ecologistas que nunca viram um pé de couve; educadores que nunca educaram nem mesmo seus filhos; psicólogos que precisavam fazer análise; padres falando da educação de filhos, como se fossem pais experientes, e dando conselhos de vida conjugal; economistas que não conseguiam gerenciar nem o orçamento pessoal; especialistas em segurança da corte que tinham medo de sair às ruas...E ainda havia muitos outros que defendiam varias outras coisas que nem eles sabiam o que era, mas que o diziam com tanta convicção que ainda conseguiam vários outros ferrenhos defensores para elas.
A insegurança para não perderem a posição social na Corte fazia com que os maus cortesãos amigos do rei ficassem reduzindo o valor de súditos que acreditavam podiam lhe ameaçar. Fazendo um paralelo com a atualidade, digamos por exemplo: o súdito fez mestrado em física quântica na Universidade de Stanford e o cortesão preposto do rei era ‘quase formado’ em qualquer outra coisa insignificante para o interesse público, então procurava arduamente descobrir e corrigir os pequenos erros inúteis de seu súdito ou de outro cortesão a fim de demonstrar – relativamente – o seu valor. E caso o súdito reclamasse a tensão era desfeita usando o processo da intimidação, sem qualquer risco em vista do poder que tinham, com a conivência do rei, para acusarem um inocente.
Certa vez, registraram a conversa entre um súdito e um ministro do rei: o ministro: um bom relatório... mas acrescente uma frase dizendo que o pombo-correio é uma tecnologia viável . O súdito ( servo impotente ): mas é exatamente o contrário do que estou dizendo ! se acrescentar essa frase, o relatório inteiro será uma confusa e absurda perda de tempo ! o ministro: tudo bem pode assiná-lo mas não vou deixar ninguém vê-lo !!!!
É verdade que muitas coisas parecem boas à primeira vista, mas se revelam más à observação cautelosa. E muitas que parecem más, são boas. Assim é a “Arte do Engano” e assim era tanto na Corte quanto longe dela. A incompetência vista de longe sempre parece melhor do que a incompetência que nos cerca, não importa quanto estúpidos e ineficazes os subordinados sejam. Havia cortesãos que apesar de extremamente ardilosos também eram igualmente tolos e como os artistas praticantes da ‘arte do engano’ se baseiam nas falsas aparências, estes mesmo quando estavam na companhia de seu maior amigo, ao encontrarem outro mais bem vestido logo se juntavam a este; e se surgisse outro melhor, faziam a mesma coisa. Também para demonstrarem ascensão social, tentavam vestir-se como o rei e uns preocupavam-se com cuidado exagerado no penteado, outros só na barba, outros no chapéu, etc.. como se esquecessem do resto e assim acontecia que aquelas poucas coisas mais refinadas parecessem emprestadas a eles e todas as que fossem idiotas se identificassem com eles.
Uma das coisas mais difíceis na Corte era o de falar com o rei. Nem todos os 'amigos do rei' nasciam amargos e ressentidos. Eles eram treinados para atender os interesses do rei. E valia a pena para o rei pois com os seus prepostos moldados como um pit bull de duas cabeças cuspindo veneno, os bons cortesãos o deixavam em paz e, assim, o rei criava tempo para o lazer na hora do trabalho.
E quando o Rei passava nas festas pelas praças, igrejas ou outros locais públicos, os cortesãos abriam caminho a poder de cotoveladas até chegarem ao lado dele; e, mesmo que não tivessem nada a dizer, queriam falar-lhe e prolongavam a conversa vazia, riam, batiam as mãos e cabeça, para demonstrarem aos incautos que os viam à distância terem assuntos comuns de importância a fim de que o povo os vissem com bons olhos. Naquela época o 'olho' era o Juiz. Os cortesãos não sabiam que em relação aos homens o que se vê de fora é o de menos. Agiam justamente como a fábula daquele asno que imitava um cachorro a fim de chamar a atenção para brincar com o patrão.

Quando o rei sentava-se corria o risco de amassar a cabeça de um deles. Era comum o estiramento muscular do pescoço de tanto balançarem a cabeça concordando com o que o rei falava. Eles imitavam tão bem os seus gestos e aparência que o rei podia usá-los como espelhos para localizar ou remover casquinhas de feijão dos dentes. Eles fantasiavam que o rei fosse notar o brilho especial nos olhos deles, a ‘sabedoria’ das suas palavras e que o rei fosse lhes implorar para serem consultores para assuntos especiais. Por sua vez, o rei dava a chance de ficarem falando sem parar sobre assuntos inúteis ou pouco interessantes aos seus interesses pessoais e nunca os encorajavam de falar de assuntos relevantes ou interessantes fosse para eles ou para a corte porque o objetivo da oitiva era a falsa comunicação e não a transferência de informação.
A maioria do cortesãos ambiciosos ficavam como uma macaca pulando na frente de câmeras implorando pela atenção do superior hierárquico, enquanto faziam declarações pseudo engraçadas ou polêmicas e, como pseudo ídolos do rei, se ridicularizavam para fins de agradá-lo.
Os súditos tentavam falar com os cortesãos amigos do rei de coisas importantes para eles, tais como salário, níveis e reorganizações da carreira fora da corte que, por sua vez, negavam sempre ter qualquer informação sobre estes assuntos, embora esses fossem praticamente o único assunto que verdadeiramente os amigos do rei se interessavam em tratar com o rei na Corte. Eles alegavam também que esses tópicos eram desmotivante para o rei por sua própria natureza e deviam ser evitados em conversa com ele e lembravam aos subordinados do ambiente competitivo na Corte que os negócios da Corte tinham que continuar como sempre foram, inclusive a distribuição desigual de vantagens remuneratórias de distribuição e execução dos trabalhos reais. Tal como era a disparidade das remunerações de professores e cirurgiões nos campos de batalhas distantes da Corte e a dos '"cortesãos'' próximos aos interesses da política do reino e das suas Cortes, ou, tal como hoje ,mais absurdo ainda, um motorista do Congresso em início de carreira ganhar mais do que um Almirante, General ou Brigadeiro, após 40 anos de serviço público ,etc...
O contexto refletia a política de liderança do Rei e de seus ‘amigos’ cortesãos que era digna de nota. Era praticamente sinônimo de egoísmo. O exemplo vinha de cima. Era comum pedirem que os súditos sacrificassem a vida pelos negócios do Rei; os que não estivessem dispostos para tanto, eram agarrados pelo braço e colocados à frente dos negócios do rei sempre que alguém quisesse lhe dar um tiro. As ferramentas de persuasão eram quase sempre o ‘medo’ e a ‘intimidação’, mas havia também outras mais ardilosas táticas, tais como: “certificados de falso apreço”; “promessas falsas de promoção”; “chances de tornar-se um cortesão ‘amigo’ do rei”; “prêmios em dinheiro por coisas que aconteceriam de qualquer maneira”.
A consequência imediata da política da corte era a de que os cortesãos vivessem em permanente competição porque eram induzidos a considerar que as suas vantagens pessoais dependiam de driblar o outro para ser o primeiro, conduta esta aprendida deste o jardim de infância, de modo que embora tivessem uma aparência humana, sentiam-se frustrados, estressados, cheios de manias e agindo permanentemente como cães pit bulls bêbados.
Embora o clima organizacional da corte tornasse os cortesãos fortes candidatos a ataques cardíacos, para o rei e seu reino, era uma competição saudável, haja vista que poucos se aposentavam com as teóricas vantagens remuneratórias oferecidas pelo rei.
Havia competição também pela busca de funções na corte associadas a menos trabalho e maior remuneração.
Estas eram distribuídas para os amigos do rei e de seus condes, duques, barões, marqueses, ...Além da melhor remuneração, havia as vantagens de que os únicos riscos que corriam eram os de:
1. Revelar-se ser um ‘terno vazio’, do tipo "garçon do Congresso" ;
2. De ser atingido por um raio quando estivesse jogando futebol;
3. Apenas o rei faria um relatório sobre ‘seus amigos’;
4. e o maior e mais preocupante risco era o de ter que conviver com outros ‘amigos do rei’.
O status na corte era diretamente associado ao Poder, ao dinheiro e, sobretudo, a posições sociais que permitisse humilhar os súditos. Para compensar todos esses riscos, os ‘amigos’ do rei tinham o direito de receber vantagens obscenas. Em contraste, os súditos que efetivamente carregavam a corte nas costas fazendo a totalidade dos seus trabalhos ganhavam menos porque corriam menos riscos, assim dizia a lei da corte feita pelos amigos do rei ( condes, duques, marqueses, ...) e sancionada por ele.
Uma visita a qualquer setor da Corte aria qualquer um com o estômago embrulhado ao ver o que o Rei e os seus "preferidos" faziam com o dinheiro dos súditos, tal como lutero sentiu-se ao ver de perto o que faziam no Vaticano. Na Corte avarenta grande parte do trabalho para o qual eram pagos era desnecessário, ao passo que o trabalho necessário era feito com grande burocracia e ineficiência pelo subordinados dos amigos do rei que correspondiam ao que hoje conhecemos como "louro José" que fica imóvel falando bobagens - sem nenhum constrangimento ou vergonha - enquanto os demais trabalham arduamente.
A maior inversão de valores do reino avarento era representada pela inversão da remuneração. Os professores que representavam a fonte da sabedoria eram os mais miseravelmente remunerados. De modo oposto, os cortesãos 'amigos' do rei cuja atividade laboral avarenta pouco significava para o interesse público de reinos mais desenvolvidos, menos avarentos, mais éticos, eram bem melhores remunerados.
Certa vez, registraram a conversa em um almoço entre um súdito e um ministro do rei: O ministro fala: Eu poderia espremer você como um inseto, há, há, há, há! Quero que saiba que sou um cara comum; Ah, sem dúvida ganho mais, e tenho uma sala bonita e mais confortável....; E, é claro, sou muitíssimo mais ardiloso, quero dizer, inteligente! O rei promove esses almoços para descobrir o que os súditos estão pensando, pode falar a vontade. O súdito responde: tudo bem.. parece que está faltando liderança e direção na corte. Os cortesãos amigos do rei são sempre cheias de melindres, não podem ouvir uma pequena crítica, são pelegos do rei, pusilânimes e reprimem todas as iniciativas ameaçando quem se arrisca a expressar suas opiniões; os subordinados deveriam ser tratados com respeito, dando importância ao que fazem, criando uma atmosfera de confiança e mantendo a motivação. Eu acho que as coisas não precisavam ser do jeito que são..(..). O ministro responde: Você não me dá outra escolha senão jogar esta batata gratinada na sua testa. O súdito responde: E olha que você não é dos piores !
+++
Era preferível ouvir um cão latindo para um corvo a um cortesão jurando que era amigo de alguém
+++
Em resumo:
as únicas sugestões aceitas eram aquelas inofensivas aos interesses do rei, dos seus amigos e as idiotas. Nada era mais desmotivante e ofensivo aos cortesãos amigos do rei que que a mais pura e simples verdade. As instruções sobre assuntos polêmicos eram praticamente verbais a fim de que o cortesão amigo do rei que a ordenou pudesse desmenti-la, se necessário e acusar o executor de “pessoa inconveniente à corte” e talvez maluco.
Quanto aos prêmios reais, só alguns ‘superstars’ do reino poderiam ser convidados para concorrer ao prêmio, senão perderia o valor. Só as realizações tidas por ‘superiores’ às expectativas normais eram consideradas merecedoras de prêmio. À primeira vista, muitos súditos candidatos à cortesão amigo do rei poderiam achar que faziam muito mais do que deviam. Então competia ao cortesão amigo do rei para assuntos econômicos redefinir sempre os objetivos a fim de incluir tudo aquilo que fosse humanamente impossível fazer ou, na melhor das hipóteses, metas que só podiam ser alcançadas mediante um esforço incrível acrescido do constante apoio apenas psicológico dos amigos do rei mas que ficavam com o total da fama, quando boa é claro. Esta manobra atualmente é chamada de ‘empowerment’ e desde a idade média tem economizado muito dinheiro em prêmios.
O rei patrocinava exercícios para construção de equipes. Certa vez, a fim de testar a confiança entre os cortesãos, amarrou um deles na árvore para servir como isca de urso e quando este aparecia fazia com que os demais cortesãos decidissem em não mais do que ½ minuto se comiam alguns biscoitos ou se salvavam o ‘amigo’ do urso ! Sim, claro, todos optaram pelo biscoito.
+++
O TROFÉU
O que fazia o cortesão querer conquistar o troféu e considerá-lo como algo que vale a pena possuir, era a visão dos outros competidores. Alguns, movidos por um espírito de bondade podem querer recompensar a todos pela tentativa, mas o troféu assim perde o valor. Na Corte, ele representava não apenas uma vitória, mas a derrota de todos os outros.
+++
A confiança era muito cultivada na corte, todos se preocupavam em usá-la como se fossem uma enorme e inescrupulosa doninha inclinada a abusar do seu poder para obter ganhos pessoais e, para tal, usavam muito as ferramentas chamadas “mentira”, “medo” e “intimidação”. O rei e seus ‘amigos’ questionavam permanentemente se os súditos eram merecedores do ar que consumiam na corte. Quem não quisesse colaborar com o reino era considerado um ‘tapete’ desmotivado e a explicação dos cortesãos para o rei era a de que a falta de motivação era causada por alguma falha profunda de caráter da qual o súdito ( tapete ) deveria sofrer. O rei, por sua vez, dizia que isso não era problema seu e que não era psiquiatra.
A demonstração permanente de falta de confiança era um dos instrumentos ardilosos utilizados para controle pelo terror, pelo medo. Declarações que deveriam ter reconhecida a sua fé pública, ainda que de assuntos irrelevantes, eram objeto de ameaça de sindicância.
Todos os recursos da corte eram distribuídos em benefício próprio do rei e seus ‘amigos’ cortesãos, de modo que era comum que os súditos tivessem que economizar até mesmo com o barbeiro a fim de sobrar mais recursos para o ‘reino’!
As festas terminavam com um discurso do rei que reiterava aos seus duques, condes, marqueses, etc..e estes reiteravam para os seus respectivos súditos que uma só cabeça anima milhares de corpos, mostrando nitidamente que os seres humanos não passam de máquinas descartáveis. Em suma, a submissão à autoridade era a ação preferida no ambiente social da corte e, nestes termos, só eram prestigiados aqueles dispostos a adotarem a obediência automática porque a corte deveria refletir os gostos do governante.
O interesse em obter o favor do rei se apresentava de vários modos: por proveito próprio, por ambição e vaidade de honras, pelo desejo de comandar, por inveja, para prejudicar e ludibriar os outros, e algumas outras tantas nobres finalidades. O rei, entretanto, estava acostumado com todos os tipos de mentira, pois também já foi "cortesão", e era difícil convencê-lo de alguma informação verdadeira.
E como bom "cortesão" que foi, tal como Calígula que nomeou seu cavalo cônsul romano, conferia 'graus e ofícios ao favor, antes que ao mérito", objetivando primordialmente ofender os "valorosos" utilizando-se dos "indignos".
+++
O invejoso oculta-se com o mesmo zelo do pecador secreto e lascivo e se torna um inventor de infindáveis truques e estratagemas que usa para se esconder e disfarçar. Assim, ele consegue fingir que ignora a superioridade dos outros que lhe corrói a alma, como se não visse, não a ouvisse, não tivesse dela consciência, nem tivesse escutado comentários a seu respeito. Ele é um mestre da simulação.
Por outro lado, ele tenta com todas as suas forças ser conivente e, por conseguinte, impedir o aparecimento de qualquer forma de superioridade em qualquer situação. E quando ela surge, lança sobre ela a obscuridade, a hipercrítica, o sarcasmo e a calúnia como o sapo cuspindo veneno de dentro da sua toca. De outra forma, ele louvará infinitamente homens insignificantes, pessoas medíocres e até aquele que lhe é inferior no seu mesmo ramo de atividade.
ARTHUR SCHOPENHAUER, 1788 - 1860
+++
Os sábios que viviam nas montanhas longes da Côrte sabiam que o mais curto caminho entre as montanhas é aquele entre um cume e outro, mas para aproveitá-lo tem de ter pernas compridas. Assim também são as verdades e a sabedoria, pois aqueles a quem são ditas devem ser igualmente grandes e altos.
Como praticamente a regra geral naquela época era a de pessoas pequenas que não enxergavam além das aparências, os “envenenadores da boa vontade” conseguiam com muita facilidade esconder por trás das aparências a falta de coerência, a falta de essência, em suma, a falta de verdade e do caráter. Assim, com maestria o cortesão daquela época aparentava ser o próprio modelo de elegância, justiça, decência, agradabilidade e democracia, ao mesmo tempo que escondia as suas verdadeiras emoções escusas – a ganância, a inveja, o ódio, a infelicidade pessoal.[..], e a de ser o mais esperto em frustrar os movimentos dos seus adversários tudo da maneira mais ardil , sutil – dissimulada – possivel.
Com o tempo, os cortesãos aprenderam a agir sempre de forma “indireta”; se apunhalava o adversário pelas costas com comentários levianos a seu respeito, deixando a possibilidade de interpretações ambíguas, irresponsáveis, sobre a vida alheia de quem pretendia difamar, injuriar, ..[..] o fazia com luva de pelica na mão, e, pela frente, no rosto, sempre com o mais gentil dos sorrisos. Ao invés de coagir ou trair explicitamente, os cortesãos conseguiam o que queriam usando algumas de suas virtudes para seduzir, enganar, persuadir o Rei, às vezes, usando o charme, mas sempre de comum a todas as estratégias sutis usadas estavam a opinião fraudulenta e o sigilo, sempre planejados com muita antecedência. Como as crianças , usavam a aparência da ingenuidade para controlar os que estavam ao seu redor, outros passavam-se até mesmo por afeminados ; usavam mínimas situações do dia-a-dia para usá-las fazendo alarde ou dando demonstrações de inocência ou neutralidade o tempo todo, chamando a atenção para os seus ‘nobres’ valores, frisando em alto e bom tom que ‘isso’ ou ‘aquilo’ ele jamais faria porque é imoral, desonesto, e blá, blá, blá....e sobretudo quando conseguia imputar uma atitude ‘em tese’ errada a alguém de seu interesse destruir. Mas verdadeiramente eram os menos inocentes e neutros de todos os demais cortesãos.
A vida na ‘corte’ era um jogo interminável que exigia vigilância constante dos cortesãos de verdadeiro bom caráter, porque era extremamente raro existir cortesãos que preferiam ser fieis aos bons valores a fazerem carreira na corte. As opiniões sinceras motivadas pelas melhores das intenções eram ardilosamente, propositalmente, mal interpretadas, e retransmitidas para o Palácio Real equivocadamente.[..]. Era uma guerra dissimulada na qual só não se exauria o cortesão “envenenador da boa vontade” porque este era o seu trabalho o qual fazia com muito amor e dedicação, [..].
Quanto aos 'amigos' do rei e seus prepostos ( Duques, Condes, Marqueses,...) ninguém os alertava , ou eles entre si, de seus erros, tal como ocorria entre os simples súditos nas aldeias e, geralmente, a razão era o interesse em obter graças e favores. Assim, só se preocupavam em propor coisas que agradavam e lhes davam prazer, embora comumente fossem más e desonestas; de modo que, de amigos passavam rapidamente a aduladores e, para obterem vantagens dessa relação estreita, falavam e agiam sempre de modo complacente e, em geral, abrindo o caminho com mentiras que, no espírito do rei geravam ainda mais ignorância das coisas mais extrínsecas. Nas cortes daquela época, havia muitas outras coisas que, se nelas fossem aplicadas dedicação e estudo, haveriam de gerar muito maior utilidade na paz e na guerra do que a 'cortesania' por si só que resultava sempre apenas em proveito próprio e prejuízo alheio, sobretudo porque infectavam com veneno mortal não apenas uma taça onde só uma pessoa haveria de beber, mas sim a fonte pública que seria utilizada por todo o povo, ou grande parte deste.
Disso decorria que o rei e todos os demais que detivessem algum poder sobre outros, além de nunca ouvirem a verdade sobre coisa nenhuma, inebriados por aquela licenciosa liberdade que a dominação traz consigo, submerso nos prazeres, tanto se enganavam e se corrompiam, ao se verem sempre obedecidos e quase adorados com tanta reverência e louvores, sem nunca serem repreendidos nem contrariados, que dessa ignorância passavam a uma presunção extrema, a tal ponto que não admitiam mais conselhos nem opiniões alheias; e, por acreditarem que saber reinar era coisa facílima e que, para tanto, não era necessária outra outra arte ou disciplina além da força, dirigiam o espírito e todos os pensamentos para a manutenção desse poderio de que dispunham, presumindo que a verdadeira felicidade era poder fazer aquilo que quisessem. Por isso, quase todos odiavam a razão e a justiça, pois parecia-lhes que elas constituíam um freio e um meio para reduzi-los à servidão e e diminuir o prazer e a satisfação que tinham em reinar; e que seu domínio não seria perfeito nem íntegro se fossem obrigados a obedecer ao que fosse justo e honesto, pois consideravam que aquele que obedecia não era verdadeiramente um senhor do poder. Por isso, seguindo tais princípios e deixando-se levar pela presunção, tornavam-se soberbos e, com expressão imperiosa e costumes arrogantes, com ares de petulância, e quase nunca se deixando ver em público, acreditavam conquistar autoridade entre os súditos e quase serem considerados deuses. Eram como os colossos construídos em Roma, que do lado de fora assemelhavam-se a grandes homens, mas dentro estavam cheios de estopa e trapos. Os cortesãos amigos do rei desse tipo eram muito piores, pois os colossos se mantinham de pé graças ao seu enorme peso, enquanto eles, sendo mal equilibrados por dentro e postos sem medidas precisas sobre bases desiguais, ruíam devido ao próprio peso e um erro os conduzia a inúmeros outros, porque suas ignorâncias, acompanhada pela falsa opinião de não poderem errar e de que o poder que tinham derivava do seu saber, os levava por todas as vias, justas ou injustas, a ocupar territórios inescrupulosamente, desde que pudessem. Conduto, se decidissem saber e fazer aquilo que deviam aos governados, empenhar-se-iam em não governar como se empenhavam porque saberiam quão grave e pernicioso são os súditos serem mais sábios que os governantes.
Mas quisera Deus que o rei e seus prepostos acompanhassem seus pecados de tantas virtudes como os antigos que, embora errassem, não evitavam as lembranças e os ensinamentos de quem lhes parecia capaz de corrigir os erros; ao contrário, se o rei, ou um conde, duque, marques encontrassem pela frente um severo filósofo ou quem quer que fosse, o qual abertamente e sem arte nenhuma quisesse mostrar-lhes aquela horrenda face da verdadeira virtude e ensinar-lhes os bons costumes e que vida deveriam levar um bom rei, ..., tinha-se a certeza de que seria abominado à primeira vista, como uma serpente ou então zombariam dele como se fosse desprezível.
Os princípios eram tão corrompidos pelos maus costumes, pela ignorância e falsa presunção sobre si mesmos, tendo se tornado tão difícil falar a verdade e induzir à virtude, tamanha era a influência dos cortesãos mentirosos, aduladores que com maneiras tão viciadas viviam para conquistar-lhes favores, que ninguém ousava conhecer e seguir a austera estrada da virtude.
Àquela época também muitos funções em cargos públicos próximas ao Rei eram cobiçadas não para que os seus ocupantes cuidassem com mais poder da real necessidade pública mas sim porque eles buscavam a sensação de que abaixo deles ficariam aqueles com menor poder de prejudicá-los e acima ficariam cada vez menos, fato este que alimentava a sensação de que todos os inimigos eram conhecidos.
A maioria dos ocupantes de funções próximas ao Rei eram respeitados pelo potencial de favor ou prejuízo que podiam fazer aos que dele dependiam ao invés de o serem pela respectiva moral, honestidade, dignidade e caráter com que lidavam com os problemas em suas respectivas competências. A ambição era também uma necessidade de auto defesa .
O Rei possuía o poder maior de nomear súditos em funções de duques, condes, marqueses,.. distribuindo-lhes gratificações, incorporações de vantagens pessoais e “menos trabalho” aos supostos "amigos". Tais funções eram distribuídas praticamente mais ao favor do que ao mérito, objetivando também ofender os “valorosos” utilizando-se dos indignos, tal como Calígula nomeou seu cavalo cônsul romano para ofender o Senado, pois raramente se observava nestes algum valor meritório exclusivo, exceto o de submeterem-se à prática da bajulação, da subserviência e a do interesse próprio acima do interesse comum e público. Tal atitude também servia como prelúdio para força-lo a se retirar da Corte aparentando ter sido uma decisão 'espontânea e livre'
O grande dilema dos cortesãos ‘verdadeiramente’ civilizados , decentes, democráticos , justos e escrupulosos era o de que se obedecessem com muita rigidez as regras da decência, honestidade, civilidade..[..], se as tomasse de uma forma por demais literal, seriam esmagados ( decapitados ) pelos cortesãos “envenenadores da boa vontade”, que estavam sempre ao redor, e temiam que lhes acontecessem o que escreveu o grande cortesão e diplomata renascentista florentino – Nicolau Maquiavel :
“ O homem que tenta ser bom o tempo todo está fadado à ruína entre os inúmeros outros que não são nada bons"
Ainda que possuindo a grande habilidade de esconder as suas verdadeiras emoções, eventualmente, alguns cortesãos envenenadores da boa vontade eram detectados pela maneira como ostentavam - sempre com publicidade – as suas qualidades morais, sua piedade, o seu raro senso de justiça, que usavam para aparentarem um ar de superioridade moral, visando a distrair os demais de suas verdadeiras intenções !
O Rei sabia “em tese” da existência de tais pessoas perigosas em seu reino e sabia também que se ele desse espaço para essas pessoas agirem, muitos sucumbiriam a sua influência e ele mesmo poderia ser decapitado !! O Rei sabia que não se poderia esperar que os problemas que eles causavam se multiplicassem, que não poderia negociar com eles porque eram pessoas irredimíveis . Sabia também que a única forma de não sucumbir a sua influência era “isolando-os” ou “banindo-os”. Naquela época todo Rei sabia do princípio de que “inimigo bom era o inimigo morto”. Infelizmente, a maneira como agiam os “envenenadores da boa vontade” os tornavam uma fonte de prazer para o Rei, tornando-o dependente de suas habilidades e desejoso de sua presença!!!! eles faziam com que o REI não só os preferisse aos demais como até mesmo mandasse decapitar os demais cortesãos.
Como não se pode impedir que o que já foi feito não fosse feito, levando em consideração o futuro, a fim de que aquele que errou não erre mais, ou, então, com o mau exemplo, não possa levar outros a errar, e julgando que as virtudes também podem ser aprendidas..., foram criadas leis pelas quais quem não tivesse justiça e vergonha seria, como pestífero para a cidade, exterminado e morto e, assim, o rei passou a divulgar uma mudança de plano nas vantagens pessoais e remuneratória na corte com base em que este deveria depender do sucesso em equipe de cortesãos para que isto mudasse o foco em prioridades pessoais para a coletividade na corte, e assim, além de ter sido decapitado pouco tempo após implantar o novo sistema, as cortes aristocráticas caminharam para o seu fim !!
E assim foi as Cortes da idade média e do renascimento por muitos anos .. até que em Paris o próprio Luis XVI, desprezando os bons, também sucumbiu na guilhotina..!
A HISTÓRIA PODE PIORAR ?
Não só pode como está piorando diariamente a passos largos. Hitler tornou-se lider da sociedade que mais havia ganhado prêmios Nobel até a década de trinta. Uma sociedade que havia produzido Kant, Hegel, Schopenhauer e tantos outros brilhantes pensadores. Outros Hitleres aparecerão? Infelizmente, sim. Se surgiu um tirano seduzindo uma sociedade inteligentíssima, qual seria o impedimento para um outro psicopata seduzir outras sociedades menos aptas intelectualmente, tal como a nossa onde servidores da educação, saúde e pesquisadores em campos de batalhas distante da "Corte", em condições insalubres, com pífia remuneração, abrem os braços para acolher os problemas alheios, enquanto os 'cortesãos bajuladores' da Corte, muitos com remuneração relativamente vergonhosa pelo que valem e fazem, são os primeiros a apontar os dedos, julgar, denunciar falhas, atirar pedras e nunca abrem os braços para acolher, exceto se for algo relativo a aumento de suas remunerações.
O canteiro de violência em que se converteu a humanidadeé reflexo de que apenas a exceção desenvolveu o código do altruismo. Sem esse código é impossível desenvolver relações sociais saudáveis.
+++
O DEPOIMENTO DE UM EX - CORTESÃO
A água sagrada da corte eles envenenaram com a lascívia e, ao chamarem de prazer seus sonhos imundos, envenenaram também as palavras.
Os diferentes se foram da corte tal como os que foram para o deserto e passaram sede com os animais de rapina apenas para não se sentarem em torno da cisterna com os sujos cameleiros; para não sentirem aquele incômodo que sentem todos os bons que servem aos maus.
Então perguntou indignado: A corte, no sentido estrito, ou a vida, no sentido amplo, necessita de ‘cortesania’? São necessárias fontes envenenadas, fogos malcheirosos, sonhos emporcalhados e vermes no pão da vida ?
Não fui devorado pelo meu ódio, mas pelo meu nojo. Nojo por ter que conviver próximo de pessoas apenas por obrigação de trabalho, de sobrevivência, e de ter que presenciar diariamente o egocentrismo, a ausência total de altruismo, de tolerância, da capacidade de se colocar no lugar dos outros, a inversão total de valores morais e da remuneração pelo trabalho público realizado, verdadeiros vampiros emocionais.
Em qualquer lugar do mundo e em qualquer época da história, sempre teremos que enfrentar gente difícil - os inseguros crônicos, os teimosos incuráveis, os histéricos que não param de se queixar,...além das mais variadas formas dissimuladas de falta de caráter. Diante de todos os monstros da Corte, os infinitos intrigantes e traidores, fui forçado a conviver com:
Os anti-sociais que questionado ou flagrado nunca se responsabilizavam por suas ações e omissões. Sempre se achavam inocentes ou vítimas do mundo, do qual tinham de se vingar. O outro não existia para eles e não sentiam nem remorso nem vergonha do que faziam !
histéricos passivos-agressivos que se comparavam o tempo todo aos demais e não queriam ver suas vítimas levando vantagem ou por considerarem-nos supostamente mais alegres ou mais felizes consigo mesmo e fazem de tudo para deixar seus invejados cansados e desanimados.
Obscessivos-compulsivos que estressavam quem estivesse perto com suas intolerâncias fúteis, só eles faziam certo.
Os narcisistas, egocêntricos, egoistas, gravitando apenas na órbita das suas necessidades corporais fúteis de natureza animal ou instintiva, demonstravam a sua personalidade infantil reagindo com agressividade apenas por verem contrariados o seu egocentrismo; preocupados mais consigo mesmo só procuravam melhorar o corpo e 'entrar em contato' com seus próprios sentimentos com o auxílio de um espelho, agiam como agentes de exclusão alheia e de si próprios, seus únicos amigos fora de si mesmo eram os retratistas que pela habilidade de criarem fantasias, revelavam as "nobres" qualidades que existiam nos narcisistas, enquadravam-nos num mito, faziam-nos sentirem-se divinos, imortais pendurados em uma bela moldura na parede. No mais claro sentido da palavra, eram emocionalmente débeis, frágeis, infantis. Possuidores apenas do raciocínio lógico-linear, cultivavam a crença em verdades absolutas, frustravam-se e irritavam-se com a arte da dúvida alheia, cultivavam apenas a arte do fisiculturismo, eram incapazes de decifrar o código da autocrítica;
Os sádicos cujo prazer era o de usarem o poder para fazer os outros infelizes, de promoverem a discórdia, cultivarem o mal-estar, projetavam a sua auto agressividade e infelicidade em quem estivesse ao redor.
Como não se conhece os sociopatas pela voz, pela dimensão das palavras, pelo discurso em circunstâncias não estressantes, eles se esforçavam para falar com alarde as coisas mais belas da corte, a diferença entre estes e os bons cortesãos é que eles podiam matar e ferir com grande facilidade e sem peso na consciência e isto porque eram desprovidos de autocrítica e desconheciam a arte da dúvida alheia. De modo que, as palavras e os discursos objetivavam sempre um autoelogio e preparativo, um disfarce, para a traição. Quanto mais floreado e eloquente fosse, mais ardilosa era a intenção do mau cortesão . Por isso, aos poderosos, voltei as costas, ao ver que o que chamavam de poder era: regatear, bajular, ludibriar, mercadejar pelo poder com a gentalha do poder!
E como os hábitos se formam em nós segundo nossas ações e como em agir consiste a virtude, entre os cortesãos de valores ‘estrangeiros’ vivi com ouvidos tapados para que a língua do seu regatear continuasse estrangeira para mim. E prendendo o nariz percorria todo o ontem e o hoje da corte. Como um aleijado que se tornou surdo, cego e mudo.
A capacidade de desarmar essas pessoas requeria uma habilidade, um esforço e uma resiliência inestimáveis. Era necessário aparentar ser gentil, porém cauteloso: se fosse passivo demais, eles passavam por cima de você; se fosse assertivo, tornaria ainda piores as qualidades monstruosas deles. Era necessário aparentar ser gentil, adaptar-se aos humores deles, entrar no espírito deles, mas por dentro, calcular e esperar que as maças podres caíssem do pé. A rendição era uma estratégia, não um estilo de vida.
Assim, vivi muito tempo, para não viver com a gentalha do poder pois equivaliam a um livro cheio de emendas e erros, e mais necessitado de um cancelamento geral do que de mudança ou qualquer correção, por não ser possível retirar-lhes aquela mancha da tirania, com a qual tanto tempo já se macularam, parecendo que eram de todo úteis apenas dentro da corte.
+++
Explorei quem tinha fome de poder e estava disposto a conviver comigo em esquemas nos quais achavam que iam tosquiar os outros. Eles queriam o poder e o dinheiro pelo poder e dinheiro. Eu, pelo luxo e pelos prazeres que ele poderia me dar. Eles raramente estavam preocupados com a ética nas relações humanas. Pouco sabiam – e se interessavam menos ainda – sobre seus semelhantes. Se tivessem estudado melhor a importância da ética na vida social, se tivessem dedicado mais tempo a serem companheiros e menos a correr atrás do poder e do dinheiro, não teria sido tão fácil dominá-los e eles não se interessariam ou teriam prazer em viver na corte.
Desabafo de um Rei renascentista
+++
“As Cortes são, inquestionavelmente, as sedes da polidez e da boa educação; não fosse assim, elas seriam a sede de matanças e desolação. Os que hoje sorriem e se abraçam, se enfrentariam e se apunhalariam, se os bons modos não se interpusessem......”
Cortesão Sir. Lord Chesterfield , 1694 – 1773.
+++
![]() |
![]() |
+++
A vida na corte é um jogo de xadrez sério e melancólico, onde temos que colocar em formação nossas armas e batedores, criar um plano, persegui-lo e nos defendermos dos planos dos nossos adversários. Às vezes, entretanto, somos forçados a arriscar e fazer a jogada mais caprichosa e imprevisível.
Jean de La Bruyère, 1645 - 1696
+++
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
+++
O homem que conhece a corte é senhor dos seus gestos, dos seus olhos e do seu rosto; ele é profundo, impenetrável; ele dissimula maus ofícios, sorri para os inimigos, controla sua irritação, disfarça suas paixões, desmente o seu coração, fala e age de modo diferente do que está sentindo.
Jean de La Bruyère, 1645 - 1696
+++
Os maus cortesãos pensavam em galgar as eminências da glória terrena sem haver prestado seus serviços à causa da verdade mas exclusivamente ao interesse próprio, sem terem experimentado, para tal fim, as provas difíceis da vida em prol do interesse comum, sem terem triunfado nas lutas, sem terem vendido o mundo da cortesania com suas enganadoras miragens.
Os maus cortesãos não sabiam que os perenes primeiros lugares não eram aqueles da Corte em que eram falsamente honrados, mas aqueles em que deveriam se colocar para honrarem o próximo; Não eram aqueles em que se colocavam para serem servidos, mas aqueles que lhes dariam o ensejo de servir. Muito embora, da boca para fora cultuassem o Filho do Homem que não veio ao mundo para ser servido, mas para servir e, ainda, vissem o triste destino dos cortesãos quando se aposentavam e perdiam o falso poder que a Corte lhes conferia !
![]() |
+++
As precondições do poder totalitário devem ser buscados em nível mais profundo, pois eles são o resultado do entendimento falho que o homem tem de si mesmo.
No final dos "anos de aprendizado" um cortesão de nome Wilhelm contempla o espetáculo de sua vida e os olhos dele se detêm assombrados numa selva de erros e desvios, semelhantes aos de uma criança incapaz de crescer. Todas as suas experiências lhe parecem um inútil emaranhado de gestos, palavras, ações e passos inúteis. Toda a sua existência lhe parece um só erro imperdoável: algo para ser renegado e jogado fora, como um gesto de bater de ombros.
Acredito que é precisamente devido à esse voltar-se para mirar de novo as "águas perigosas" da Corte que tantas depressões ocorriam depois que os maus cortesãos deixavam a Corte. Era um momento crítico que coincidia com uma torrente de reflexão retrospectiva que causavam intensa depressão. Em contraste, todos os bons cortesãos concordavam em apontar que casos de "maus cortesãos" com depressão enquanto na Corte eram raríssimos. A situação dos bons cortesãos era oposta a dos maus.
Assim como, ao que dizem odiernamente, a lingua dos esquimós possui um riquíssimo vocabulário para denotar diferentes tipos de neve; o inglês para a chuva; o hebraico para o pecado; o português do brasil tem para nomear as sutilizas e a diversidade do engano nas suas diverssas organizações sociais, seria redundante detalhá-las
+++
QUANTO MAIS PRÓXIMO AO PODER MAIS OS ATRIBUTOS ABAIXO INDICADOS ESTAVAM PRESENTES NOS CORTESÃOS E CORTESÃS.
1 |
Ocultar ou encobrir com astúcia e safadeza;
|
2 |
Disfarçar com a maior cara de pau e cinismo;
|
3 |
Não dar a perceber, apesar de ululantes e genuínas evidências;
|
4 |
Mentir;
|
5 |
Fingir, simular inocência angelical;
|
6 |
Usar de dissimulação;
|
7 |
Proceder com fingimento;
|
8 |
Hipocrisia;
|
9 |
Ocultar-se, esconder-se, fugir da responsabilidade;
|
10 |
Tirar da reta, atingindo sempre alguém mais próximo ainda que seja amigo (antes ele do que eu); |
11. |
Encobrir, disfarçar, negar sem olhar para os olhos das pessoas;
|
12 |
Fraudar, iludir;
|
13 |
Afirmar coisa que sabe ser contrária à verdade, acreditar que os fins justificam os meios;
|
14 |
As ações estão sempre baseadas na reciprocidade. Não faz nada se não tiver a visão de um retorno de ganho pessoal pelo ato praticado.
|
15 |
Vive praticamente em função maior de si próprio. Todos os seus atos têm o seu próprio benefício como fim.
|
16 |
Os impulsos egoístas impede-o de fazer a vontade de outros, apesar de achar certo o que eles necessitam. Só o faz se vislumbrar obter ganhos egoisticamente.
|
17 |
É pequeno e só consegue sentir–se grande pisando, tripudiando outros que considera melhor .É pessoa amarga, doente e espera vencer a qualquer preço.
|
18 | Nunca ajudavam por misericórdia ou gratidão ou benevolência. A prática do altruísmo era proibida. Só ajudavam, se pudessem se beneficiar. |
O cortesão perfeito prosperava num mundo onde tudo girava em torno do poder e da habilidade política. Eles dominavam a arte da dissimulação; eles adulavam, cediam aos superiores e asseguravam o seu poder sobre os outros da forma mais gentil e dissimulada.
Para aqueles que não quisessem se submeter às leis da Corte, deveriam seguir as regras abaixo indicadas sob pena de morte se não o fizessem.
REGRAS PARA SOBREVIVER NA CORTE
Não podiam reagir emocionalmente a qualquer situação.
Tratava-se de um erro que custava muito mais do que qualquer satisfação temporária que pudesse ser obtida expressando o que se sentia. Poderia custar a própria vida. De fato, em qualquer época, as emoções embotam a razão e se você não consegue ver com clareza não pode estar preparado a reagir com controle das inúmeras situações de agressões ardilosas.
Não podiam preocupar-se com aqueles que por fora parecem justos, mas que por dentro estão cheios de hipocrisia e iniqüidade.
Não podiam preocupar-se com aqueles que têm a bondade como 'máscara'. Tendo-a apenas nos lábios e,verdadeiramente, o interesse egoísta no coração.
Não podiam preocupar-se com os indiferentes, os hipócritas, os convíveres apenas por dever de ofício, os orgulhosos e os egoístas.
Não podiam preocupar-se com aqueles que estão sempre dissimulando um bom interesse , mas que verdadeiramente estão sempre nos amaldiçoando com suas palavras de ódio, maldição e sarcasmo dissimulados .
Não podiam preocupar-se com aqueles que vivem de enganar e seduzir.
PORQUE naquele mundo imperavam o dolo e a mentira nas relações sociais;.
PORQUE a imoralidade campeava em todas as esferas;
PORQUE o egoísmo se apossara da maioria dos homens;
PORQUE o OURO era o ímã das boas ações motivadas pelos desejos.
PORQUE essa era a verdade da realidade da sociedade nas Cortes do século XVII.
+++
ALGUNS ASPECTOS DA PERSONALIDADE NEGATIVA QUE OS CORTESÃOS PERFEITOS ESCONDIAM COMO NENHUMA OUTRA PESSOA.
A inveja e o ódio são características que inviabilizam uma personalidade agradável. O semelhante atrai o semelhante. Aquele que odeia será odiado, por mais que tente disfarçar, aparentando delicadeza.
A Raiva, seja na forma ativa ou passiva, é uma característica que desperta antipatia e antagonismo.
A constante insatisfação é característica de quem vive procurando falhas nos outros e nas situações e torna-se com isso muito desagradável. Deveria aproveitar melhor o tempo examinando os próprios defeitos.
A maledicência - quem leva a traz. Quando não podem escapar, as pessoas ouvem as "fofocas", mas não gostam do fofoqueiro.
O mentiroso é persona não grata em qualquer ambiente, doméstico ou profissional. Para alguns, a mentira torna-se um hábito que destrói a confiança e desperta antagonismo.
É melhor contar apenas uma parte da verdade do que "aumentar" a história. O exagero gera desconfiança.
A vaidade só existe de forma aceitável quando for para expressar ideias por meio de ações úteis e não de palavras. A autoconfiança é uma das características mais desejáveis e necessárias, mas deve ser controlada e dirigida para objetivos específicos, por meio de métodos que não despertem antagonismo. Todas as formas de autoelogio são facilmente reconhecíveis como indícios de complexos de inferioridade. Portanto, o lema deve ser: "Atos e não palavras".
A pessoa teimosa nunca é agradável. Claro que determinação e capacidade de defender opiniões são características essenciais, mas só devem ser demonstrada em momento oportuno e de forma branda.
Ninguém gosta do egoísta. Embora essa característica traga prejuízo essencialmente ao egoísta, ela também atrai muita oposição.
O hábito de inventar desculpas para fugir à responsabilidade pelos próprios erros também é desagradável. É melhor assumir a responsabilidade pelos erros alheios do que habituar-se a lançar sobre os outros a responsabilidade pelos seus.
A ganância é difícil de esconder e comumente anda junto a deslealdade e a desonestidade.
+++
É sensato ser polido; por conseguinte, é idiotice ser rude.
Criar inimigos com a falta desnecessária e proposital de civilidade é insensatez tão grande quanto tocar fogo na própria casa.
Porque a polidez é uma moeda reconhecidamente falsa, e com a qual é tolice agir com avareza.
O homem de bom senso será generoso ao usá-la... A cera, substância naturalmente dura e quebradiça, pode se tornar macia aplicando-se um pouco de calor , adquirindo a forma que mais lhe agradar.
Da mesma maneira, sendo polido e gentil, você pode tornar as pessoas dóceis e servis, mesmo que tendam a ser rabugentas e malevolentes.
Portanto, a polidez é para a natureza humana o que o calor é para a cera.
Arthur Schopenhauer, 1788 - 1860
+++
Socialmente não se comenta que um homem é um grande ator? Não se está dizendo o que ele sente, mas que é ótimo simulador, embora não sinta nada.
Denis Diderot, 1713 - 1784
+++
COMO DISSE DIDEROT
"o mau ator é aquele que é sempre sincero. As pessoas que estão sempre expondo a todos o que sentem são aborrecedoras e constrangedoras. Apesar da sua sinceridade. é difícil levá-las a sério. quem chora em público pode temporariamente despertar simpatia, mas a obsessividade dessas pessoas tranforma logo a simpatia em desdém e irritação - elas choram para chamar atenção, é o que achamos, e um lado malicioso em nós não quer lhes dar essa satisfação.
Nenhum governante ou líder seria capaz de representar esse papel se todas as emoções mostradas tivessem de ser reais.
Portanto, aprenda a se controlar. Adote a plasticidade do ator, que consegue expressar no rosto apenas as emoções necessárias."
+++
O Deus grego Marinho, Proteus.
O seu poder estava em ser capaz de mudar de forma à vontade, de ser o que a ocasião exigia. Quando Menelau, irmão de Agamenon, tentou capturá-lo, Proteus se transformou em leão, depois em serpente, pantera, javali, água corrente e, por fim, numa árvore frondosa.
+++
Saiba como ser todas as coisas para todos os homens. Um Proteus discreto - um erudito entre eruditos, um santo entre santos. Essa é a arte de conquistar todos, pois os iguais se atraem. registre os temperamentos das pessoas que você conhece e se adapte a cada um deles - passe de sério a jovial, mudando de humor discretamente.
Baltasar Gracián, 1601 - 1658
+++
INTERPRETAÇÃO
Infelizmente, o Mundo em que vivemos é como uma gigantesca Corte fraudulenta e não adianta optar por ficar fora dela, ela está em todo lugar, em quase tudo. Em Órgãos públicos onde quem ganha mais trabalha menos e vice-versa, a distribuição de funções mais e menos gratificadas, chefias, etc.. Em grandes empresas privadas onde a estabilidade depende da politicagem diária, locais estes onde milhares trabalham e enfrentam um terrível paradoxo: Ao mesmo tempo em que muitos foram educados para serem civilizados, decentes, democráticos e justos, mas se obedecerem com muita rigidez a essas regras, se as tomarem de uma forma por demais literal, correm o grande risco de serem esmagados pelos que estão ao seu redor que não seguem as regras da civilidade.
No mundo contemporâneo, não é mais uma questão de morte, é claro, mas pode ser de exílio. E se não for possível banir o 'perfeito cortesão' para longe de você pelo menos saiba como ele age e não dê credibilidade aos seus gestos fingidos de amizade. A sua arma numa situação dessa é a sua própria cautela.
Como escreveu o grande cortesão e diplomata renascentista, Nicolau Maquiavel:
"O homem que tenda ser bom o tempo todo está fadado à ruína entre os inúmeros outros que não são bons".
Como relatou Friedrich Nietzsche ( 1844-1900 ) que participou de um julgamento de uma contenda ocorrida entre um cortesão ovelha e um cortesão ave de rapina: Não é de se estranhar que as ovelhas não gostem de aves predadoras, mas isso não é motivo para culpar as grandes aves predadoras de carregarem as ovelhas. E não há nada intrinsecamente errado no argumento das ovelhas quando elas sussurram entre si: "Essas aves predadoras são más, não podemos dizer, portanto, que o oposto de ave predadora deve ser a ovelha ? Por sua vez, as aves predadoras ficam um tanto intrigadas e dizem: "Não temos nada contra essas boas ovelhas; de fato, nós gostamos muito delas; nada é mais saboroso do que uma ovelha de carne macia". E após sentenciou: Não existem princípios, apenas fatos. Não existe o bem e o mal, apenas circunstâncias. O homem superior apoia fatos e circunstâncias a fim de guiá-los. Se houvesse princípios e leis fixas, as nações não as mudariam como mudamos de camisa, e não se pode esperar de umas poucas ovelhas que sejam mais sábias do que uma nação inteira de aves de rapina. E, assim, prevaleceu a justiça da ave de rapina.
+++
O CORDEIRO
Tão macio e afetuoso. Com dois ele dá suas cabriolas; em uma semana está brincando de "Siga o Mestre".
Sua fraqueza faz parte do seu encanto.
O Cordeiro é pura inocência, tão inocente que desejamos possuí-lo, até mesmo devorá-lo.
+++
UM ÚLTIMO CONSELHO
Pense no conforto de ser fiel às suas idéias a ter uma divida impagável com sua própria consciência.
Para auxiliá-lo nessa árdua tarefa, desenvolva o atributo da resiliência que lhe possibilitará sobreviver ao canteiro de violência em que cada dia mais se converte a sociedade brasileira, quem sabe a humanidade, especialmente nos ambientes sociais de poder hierarquizado e benefícios remuneratórios absurdamente díspares e imorais.
Na vida privada, nas profissões autônomas, ainda há lugar para o sucesso ligado diretamente a um elevado caráter.
O indivíduo educado é aquele que aprendeu a conseguir o que lhe é necessário sem violar os direitos alheios.
A educação vem de dentro.
Consegue-se com empenho, esforço e propósito.
+++
Texto extraído de segmento ilustrativo em livro dos autores: Robert Greene e Joost Elffers.
MEMÓRIAS, GIOVANNI CASANOVA, 1725-1798
com alterações do original
adaptado também com textos e idéias de diversos outros autores:
+++
"Manual de Gerência Dogbert - a falta de princípio Dogbert." , do autor Scott Adams
+++
"O Cortesão", do autor Baldassare Castiglione.
+++
"Assim falou Zaratustra" , do autor Friedrich Nietzsche
+++