O DINHEIRO E O PODER
O TIPO PEIXE VORAZ
A pessoa excessivamente ambiciosa não vê o aspecto humano do dinheiro. Insensível e cruel, ela só vê o frio balancete; considerando os outros apenas como peões ou obstáculos na sua busca de riqueza. Ela atropela os sentimentos alheios e afasta aliados valiosos. Ninguém quer trabalhar com um peixe voraz e, com o passar dos anos, ele acaba sozinho, o que é a sua ruína.
É desses peixes vorazes que se alimentam os trambiqueiros: atraídos pelo dinheiro fácil, eles engolem a isca, anzol, linha e chumbada. São fáceis de enganar porque passam tanto tempo lidando só com números ( e não com pessoas ) que não entendem mais nada de psicologia, nem da própria. Evite-os antes de ser explorado.
A LEI TRANSGREDIDA
Depois que Francisco Pizarro conquistou o Peru, em 1532, o ouro do Império Inca começou a jorrar na Espanha, e espanhóis de todas as classes começaram a sonhar com a possibilidade de fortuna rápida no Novo Mundo. Logo se espalhou a história de um chefe indígena, a leste do Peru, que uma vez por ano se cobria ritualmente de ouro em pó e mergulhava num lago. O boato não demorou a transformar o El Dorado, o “Homem Dourado” num império chamado El Dorado, mais rico do que o inca, onde as ruas eram pavimentadas e os prédios cobertos de ouro. A história inventada parecia plausível, porque um chefe capaz de desperdiçar ouro em pó num lago certamente deveria governar um império dourado. Em breve os espanhóis estavam buscando o El Dorado por toda a América do Sul.
Em fevereiro de 1541, partiu de Quito, no Equador, a maior expedição nesta aventura liderada por Gonzalo, irmão de Pizarro. Resplandescentes nas suas armaduras e sedas coloridas, 340 espanhóis dirigiram-se para o leste, levando quatro mil indígenas para transportar suprimentos e servir de patrulheiros, quatro mil porcos, dezenas de lhamas, e quase mil cachorros. Mas a expedição foi logo atingida por uma chuva torrencial que apodreceu os equipamentos e estragou a comida. Nesse meio tempo, os índios que Gonzalo Pizarro ia interrogando pelo caminho e que pareciam não querer dar informações, ou nem tinham ouvido falar do fabuloso reino, eram torturados e entregues aos cães.
A notícia da violência assassina dos espanhóis se espalhou rapidamente entre os índios, que perceberam que a única maneira de escapar da ira de Gonzalo era inventar histórias sobre El Dorado e mandá-lo para bem longe. Seguindo as orientações dos índios, Gonzalo e seus homens eram obrigados a se embrenhar cada vez mais na floresta. O ânimo dos exploradores arrefecia. Os uniformes há muito já tinham virado farrapo; as armaduras enferrujadas; os sapatos desmanchavam-se e eles eram obrigados a andar descalços; os escravos índios morreram ou desertaram; os porcos, os sabujos e as ilhamas foram todos comidos. Viviam de raízes e frutas.
Percebendo que não poderiam continuar assim, Pizarro decidiu arriscar uma viagem pelo rio, e construíram uma balsa com madeira podre. Acampado na beira do rio, Gonzalo mandou os patrulheiros na frente com a balsa para ver se encontravam aldeias indígenas com comida, e esperou até descobrir que tinham decidido desertar. A chuva continuava sem parar. Finalmente, em agosto de 1542, pouco mais de cem homens, de uma expedição originalmente com milhares, conseguiram encontrar o caminho de volta.
Para os habitantes de Quito, eles pareciam saídos do inferno, enrolados em peles e farrapos, os corpos cobertos de feridas, irreconhecíveis de tão magros e abatidos. Durante mais um ano e meio eles marcharam num círculo enorme, três mil e duzentos quilômetros a pé. Todo aquele dinheiro, esforço e tempo investido na expedição não deu em nada.
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INTERPRETAÇÃO
Não só a busca do El Dorado custou milhões de vidas, como ajudou na ruína do império espanhol. O Ouro se tornou uma obsessão para a Espanha. O ouro que retornava à Espanha era novamente investido em mais expedições, ou gasto em luxos, não na agricultura ou em qualquer outro empreendimento produtivo. Cidades inteiras na Espanha ficaram vazias quando seus homens foram embora atrás de ouro.
Propriedades agrícolas se arruinaram e não havia recrutas no exército para combater as suas guerras na Europa. No final dp século XVII, toda a população do país estava reduzida á metade; dos 400 mil habitantes da cidade de Madri restavam 150 mil. Com seus esforços durante tantos anos rendendo cada vez menos, a Espanha entrou em declínio e não se recuperou mais.
A prosperidade exige autodisciplina. A perspectiva de riqueza, principalmente a riqueza fácil, rápida, é devastadora sob o aspecto emocional. Quem enriquece de repente sempre acha que pode ficar ainda mais rico. Nesta ilusão, os gananciosos descuidam de tudo aquilo de que o poder realmente depende: autocontrole, a boa vontade dos outros, e outras coisas mais. Compreenda: a não ser a morte, nenhuma outra mudança permanente no destino acontece de uma hora para outra. A riqueza repentina raramente dura, porque não tem uma base sólida. Não permita que o fascínio pelo dinheiro o tire da fortaleza protetora e duradoura do verdadeiro poder. Faça do poder a sua meta e o dinheiro um instrumento. Deixe o El Dorado ( em todos os sentidos ) para os otários.
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DEPOIMENTO
Se explorei quem tinha dinheiro e estava disposto a entrar comigo em esquemas nos quais achavam que iam tosquiar os outros. Eles queriam o dinheiro pelo dinheiro. Eu, pelo luxo e pelos prazeres que ele poderia me dar. Eles raramente estavam preocupados com a natureza humana. Pouco sabiam – e se interessavam menos ainda – sobre seus semelhantes. Se tivessem estudado melhor a natureza humana, se tivessem dedicado mais tempo a serem companheiros e menos a correr atrás do dólar poderoso, não teria sido tão fácil enganá-los.
YELLOW KID WEIL, 1875 - 1976
O TESOURO ENTERRADO
Muita gente tola nas cidades espera descobrir riquezas debaixo da terra e lucrar com isso. No Maghrib existem muitos ‘estudantes’ berberes incapazes de ganhar a vida normalmente. Eles mostram para as pessoas ricas alguns papéis rasgados nas margens e com textos redigidos numa língua diferente do árabe, ou então dizem ser a tradução de um documento escrito pelo proprietário de um tesouro dando a pista do local secreto onde ele foi enterrado. Assim eles procuram se sustentar, convencendo os ricos a mandá-los cavar para achar o tesouro.
Ocasionalmente, um destes caçadores de tesouros dá uma informação estranha ou faz algum truque notável de mágica para que as pessoas acreditem no que ele vai continuar dizendo, embora não entenda nada de mágicas e de como elas funcionam [...] O que foi dito sobre caça ao tesouro não tem base científica, nem se baseia em informações reais.
Deve-se perceber que, embora se encontrem tesouros, isto só acontece raramente e por acaso, nunca sistematicamente... Quem se ilude ou aflige com essas coisas deve pedir a Deus que o proteja da sua incapacidade de se sustentar e da sua preguiça nesse sentido. As pessoas não devem se ocupar com histórias absurdas e mentirosas
O MUQADDIMAH, IBN KHALDÚN, 1332-1406
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O TIPO DEMÔNIO DA PECHINCHA
Gente que tem poder avalia tudo pelo seu custo, não apenas em dinheiro, mas em tempo, dignidade e paz de espírito. E isto é exatamente o que o demônio da pechincha não consegue fazer.
Desperdiçando um tempo precioso atrás de uma pechincha, ele está sempre pensando no que poderia achar por um preço mais em conta em outro lugar. Para culminar, o que ele acaba comprando quase sempre está em mau estado, talvez precise de um conserto que vai sair caro, ou terá que ser substituído muito mais rápido do que um artigo de boa qualidade. Os custos dessa busca – nem sempre em dinheiro ( e o preço da pechincha quase sempre é uma farsa ), mas em tempo e paz de espírito – desencoraja a pessoa normal, mas para o Demônio da Barganha ela é um fim em si mesma.
Estes tipos parecem prejudicar apenas a si próprios, mas suas atitudes são contagiantes: se você não resistir, eles também o farão se sentir inseguro achando que deveria ter procurado melhor para encontrar um preço mais barato. Não discuta com eles, nem tente modificá-los. Basta somar mentalmente o custo, em tempo e paz interior além do custo financeiro embutido, da busca irracional de uma pechincha.
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O SOVINA
O sovina, querendo proteger seu patrimônio, vendeu tudo que tinha, transformou numa barra de ouro e escondeu num buraco no chão, e ia sempre lá ver como estava. Isto despertou a curiosidade de um dos seus operários que, desconfiando haver ali um tesouro, assim que o patrão virou as costas foi até lá e roubou a barra.
Quando o sovina voltou e viu o buraco vazio, chorou e arrancou os cabelos. Mas um vizinho, assistindo a essa extravagante tristeza e sabendo o motivo, disse: “Não te angusties mais, pega uma pedra e coloca-a no mesmo lugar e pensa que é atua barra de ouro; pois como não pretendias usá-la nunca, vai lhe servir tão bem quanto a outra.”
O valor do dinheiro não está na sua posse, mas no seu uso.
ESOPO, século 6 a.C
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O grande homem sovina é um grande tolo, e para o homem que ocupa altos postos não há vicio pior do que a avareza. O sovina não conquista terras nem domínios, pois não possui amigos suficientes a quem impor a sua vontade. Quem quiser ter amigos não deve se apegar às suas posses, mas conquistá-los com belos presentes; pois da mesma forma que o ímã atrai sutilmente o ferro, o ouro e a prata com os quais um homem presenteia atraem os corações dos outros homens.
THE ROMANCE OD THE ROSE, GUILLAUME DE LORRIS, 1200-1238
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DEPOIMENTO
Quando jovem, eu era mais sugestionável por fatores externos - dinheiro, poder, deslumbramento. Mas, à medida que fiquei mais velho e, teoricamente, mais sábio, passei a dar importância ao caráter e a outras qualidades interiores e a enxergar a relativa insignificância da preocupação exagerada com o brilho externo, sejam da fama, da posição ou das aparências.
Ademais, as pessoas que se impressionam com as superficialidades deveriam ser alertadas para o fato de como é fácil serem iludidas pelas falsas aparências.
As pessoas revelam frequentemente os seus 'eus' mais profundos nas situações mais inocentes.
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O HOMEM QUE DAVA MAIS VALOR AO DINHEIRO DO QUE A VIDA
Era uma vez um velho lenhador que subia a montanha quase todos os dias para cortar madeira. Dizia-se que era um homem avarento que guardava as suas moedas de prata esperando que virassem ouro, e que ele dava mais valor a esse metal do que a qualquer outra coisa no mundo.
Um dia ele foi atacado por um tigre e, por mais que corresse, não conseguiu escapar e o animal sumiu com ele. O filho, vendo o pai em perigo, correu para tentar salvá-lo. Levou uma faca comprida e, porque corria mais rápido do que o tigre que tinha que carregar um homem. Logo os alcançou. O pai não estava muito machucado porque o tigre o agarrara pelas roupas. Quando o lenhador viu o filho prestes a esfaquear o tigre, gritou assustado: “Não lhe estrague a pele ! Não lhe estrague a pele ! Se puder matá-lo sem furar a pele poderemos trocá-la por muitas moedas de prata. Mate-o, mas não o corte.
Enquanto o filho ouvia as instruções do pai, o tigre saiu em disparada para a floresta, levando o velho até onde o rapaz não pudesse alcança-los, e o matou.
DIANE DI PRIMA, ORG., 1960
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[...] Disse ainda dom Augustino Bevazzano que um avarento, que não quisera vender o trigo enquanto estava caro, ao ver que o preço baixara muito, enforcou-se por desespero numa viga de seu quarto; e, tendo um empregado ouvido o estrépido, correu e viu o patrão enforcado e rapidamente cortou a corda. Livrando-o assim da morte; depois, tendo voltado a si, o avarento exigiu que o serviçal lhe pagasse a corta que cortara.
Segmento de texto extraído do livro “O Cortesão”,
do autor Baldessare Castiglione, 1478-1529
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O RIO
Para se proteger ou salvar o seu patrimônio, você constrói um dique. Em breve, porém, as águas ficam lodosas e pestilentas. Só as formas mais repulsivas de vida conseguem viver nessas águas estagnadas; nada trafega sobre elas, todo o comércio fica interrompido.
Destrua o dique. A água que flui e circula gera abundância, riqueza e poder em círculos cada vez maiores.
O rio deve causar inundações periodicamente para que boas coisas possam florescer.
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A HISTÓRIA DE MOISÉIS E O FARAÓ
Está escrito nas histórias dos profetas que Moiséis foi enviado ao faraó com muitos milagres, pródigos e honras. Ora, a ração diária na mesa do faraó era de 4 mil ovelhas, 400 vacas, 200 camelos e uma quantidade correspondente de galinhas, peixes, bebidas, frituras, doces e outras coisas.
Todo o povo do Egito e todo o seu exército costumavam vir comer nesta mesa todos os dias. Durante 400 anos ele havia afirmado ser divino e jamais deixou de proporcionar esse alimento. Quando Moiséiws rezou dizendo, “Oh Senhor, destrua o faraó”, Deus respondeu às suas preces e disse: “Eu o destruirei na água, e concederei a você e ao seu povo toda a sua riqueza e a dos seus soldados”.
Vários anos se passaram depois dessa promessa, e o faraó, condenado à ruína, continuava vivendo em toda a sua magnificência. Moiséis estava impaciente para que Deus destruísse logo o faraó, e não suportava mais esperar. Então ele jejuou durante quarenta dias e foi para o Monte Sinai. No seu encontro com Deus disse: “Oh Senhor, prometestes destruir o faraó, mas no entanto ele ainda não abandonou nenhuma das suas blasfêmias e pretensões. Quando destruirás?” Uma voz veio da verdade dizendo: “Oh, Moiséis, queres que eu destrua o faraó o mais rápido possível, mas um milhão de servos querem que eu não faça isso, pois usufruem da sua bondade e da tranquilidade do seu governo. Por meu poder, juro que enquanto proporcionar alimento e conforto em abundância à minha criação, não o destruirei”. Moiseis disse: Então, quando a Vossa promessa se cumprirá?” “A minha promessa se cumprirá quando ele deixar de alimentar as minhas criaturas. Se ele começar a restringir a sua generosidade, saiba que a sua hora se aproxima.”
Aconteceu que um dia o faraó disse a Haman:
“Moiseis reuniu a sua vbolta os filhos de Israel e está nos deixando preocupados. Não sabemos o que vai nos acontecer. Devemos manter nossas reservas cheias para não sermos apanhados sem recursos. Portanto, devemos cortar pela metade nossas rações diárias e economizar o resto”.
Ele deduziu duas mil ovelhas, 200 vacas e 100 camelos, e a cada dois ou três dias reduzia similarmente a ração.
Moiséis então soube que a promessa da Verdade estava próxima de ser cumprida, pois economia em excesso é sinal de declínio e mau agouro.
Os mestres da tradição dizem que no dia em que o faraó se afogou só duas ovelhas foram mortas na sua cozinha.
Nada é melhor do que a generosidade [...] Se um homem é rico e deseja, sem um título de nobreza, agir como um senhor; se ele quer que os homens se humilhem diante dele, o reverenciem e o chamem de senhor e príncipe, então diga-lhe para colocar todos os dias uma mesa repleta de víveres.
Todos os que ficaram famosos no mundo, foi principalmente por meio da hospitalidade, enquanto o sovina e o avarento são desprezados em ambos os mundos.
THE BOOK OF GOVERNMENT OR RULES FOR KINGS
NIZAM AL-MULK, SÉCULO XI
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O TIPO SÁDICO
Sádicos financeiros fazem jogos perversos de poder com o dinheiro como uma forma de afirmar o seu poder.
Eles podem, por exemplo, deixar você esperando por uma quantia que lhe é devida ou se contratam você para trabalhar para eles, se metem em tudo, fazendo objeções e lhe dando úlceras gástricas.
Os sádicos parecem achar que o fato de estar pagando por alguma coisa lhes dá direito de torturar e agredir o vendedor.
Eles não sentem o elemento bajulador no dinheiro. Se você tiver o azar de se ver envolvido com um tipo desses, aceitar uma perda financeira pode ser melhor, a longo prazo, do que deixar enredar nos seus destrutivos jogos de poder.
A LEI TRANSGREDIDA
No início do século XVIII, não havia ninguém em posição mais privilegiada na sociedade inglesa do que o duque e a duquesa de Marlborough. Em 1704, o triunfo do duque na Batalha de Blenheim o consagrou como a figura mais celebrada da Inglaterra e, para homenageá-lo, a rainha Anne lhe concedeu uma grande extensão de terra na cidade de Woodstock e fundos para a construção ali de um grande palácio. E assim começou a construção no verão de 1705, com muitas fanfarras e esperanças.
O projeto do arquiteto contratado - John vanbrugh – seria um monumento ao brilhantismo e ao poder de Marlborough e deveria ter lagos artificiais, pontes enormes, jardins complicados e outros toques fantásticos.
Desde o primeiro dia, entretanto, nada satisfazia a duquesa: ela achava que Vanbrugh estava esbanjando dinheiro com mais fileira de árvores, queria que o palácio ficasse pronto o mais rápido possível. A duquesa torturava Vanbrugh e seus operários sem deixar passar um só detalhe. Preocupava-se com questões mesquinhas; embora o governo estivesse pagando a construção, ela contava cada tostão. Até que as suas reclamações, sobre a construção e outras coisas mais, acabaram gerando um atrito irreparável entre ela e a rainha Anne, que, em 1711, a despediu da corte mandando-a desocupar seus aposentos no palácio real. Ao sair furiosa com a perda da sua posição e também do seu salário real, ela levou tudo, até as maçanetas de cobre.
Depois disso, durante dez anos, as obras foram suspensas e retomadas várias vezes, conforme crescia a dificuldade de conseguir que o governo as custeasse. A duquesa achou que Vanbrugh estava querendo arruiná-la. Ela criticava cada carregamento de pedra e alqueire de cal, contava cada metro a mais de grade de ferro ou centímetro de mabri, gritando com os operários, empreiteiros e supervisores perdulários. Marlborough, velho e cansado, só queria se instalar no seu palácio para ali viver os seus últimos anos de vida, mas o projeto estava atolado num pantanal de litígios. Os operários processavam a duquesa porque atrasava os salários, a duquesa, por sua vez, processava o arquiteto. No meio desta disputa interminável, o duque morreu.
Depois da morte de Marlborough, descobriu-se que ele possuía um vasto patrimônio, valendo mais de dois milhões de libras – mais do que o suficiente para terminar o palácio. Mas a duquesa não cedia:recusava-se a pagar os salários de Vanbrugh e dos operários, e acabou despedindo o arquiteto. O homem que o substituiu terminou a construção em poucos anos, seguindo à risca o projeto de Vanbrugh, que morreu em 1726 proibido de entrar no palácio pela duquesa, sem ter colocado os pés na sua maior criação. Prenunciando o movimento romântico, o Palácio dera início a uma nova tendência na arquitetura, mas para o seu criador foram vinte anos de pesadelo.
INTERPRETAÇÃO
Para a duquesa, o dinheiro servia para jogos de poder sádicos. Para ela, perder dinheiro era perder simbolicamente o poder. No caso de Vanbrugh, sua distorção foi ainda mais profunda: ele era um grande artista e ela invejava o seu poder criativo, o seu poder de conquistar uma fama para ela inalcançável. Ela não tinha o talento dele, mas tinha o dinheiro para torturá-lo e violentá-lo por mesquinharias – para arruinar a sua vida.
Essa forma de sadismo tem um preço terrível. Fez uma construção que duraria dez anos demorar vinte. Envenenou muitos relacionamentos, afastou a duquesa da corte, magoou profundamente o duque, gerou inúmeros processos judiciais e tirou anos de vida de Vanbrugh. E também, no final, a posteridade ficou com a última palavra: Vanbrugh é reconhecido como um gênio, enquanto a duquesa ficou para sempre na lembrança por sua consumada mesquinhez.
O poderoso deve ter grandeza de espírito – não pode se mostrar mesquinho. E é na relação com o dinheiro que melhor se vê a grandeza ou a mesquinhez. É preferível ficar conhecido como uma pessoa generosa, o que no final lhe trará grandes dividendos. Não deixe que detalhes financeiros o impeçam de ver o que as pessoas pensam a seu respeito. O ressentimento delas vai lhe sair mais caro a longo prazo. E se você quiser se meter no trabalho das pessoas criativas que contratou, pelo menos pague-as bem.
O seu dinheiro comprará a submissão delas melhor do que as suas exibições de poder.
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O TIPO DOADOR SEM CRITÉRIO
A generosidade atrai as pessoas, as amolece, as transforma em aliados. Mas, o Doador Sem Critério, por sua vez, é generoso porque quer ser amado e admirado por todos. E a sua generosidade é tão pouco criteriosa e seletiva que não produz o efeito desejado: se ele dá indiscriminadamente, por que a pessoa que recebe deve se sentir especial? É preciso ser prudente em relação ao local, ao tempo e às pessoas as quais se presenteia para não cair na bufonaria nem sair de certos limites. Qualquer envolvimento com este tipo lhe trará o peso adicional de suas carências emotivas insaciáveis.
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O TIPO DOADOR CRITERIOSO
ESTE TIPO SE CONFUNDE MUITO COM OS VIGARISTAS
CUIDADO COM O QUE LHE INSISTEM EM DAR DE GRAÇA
O que é oferecido de graça pode ser perigoso, pode ser um ardil ou ter ali uma intenção oculta de criar obrigação. Favores sem pagamento, mais tarde poderão lhe custar muito mais caro do que a quantia que poderia ter sido paga na época. Então, se tem valor, vale a pena pagar. Pagando você se livra de problemas de gratidão e culpa. Também é prudente pagar o valor integral – com a excelência não se economiza. Seja pródigo com seu dinheiro e o mantenha circulando, pois a generosidade é um sinal e um imã para o PODER.
Tudo deve ser julgado pelo seu custo e tudo tem um preço. A barganha esconde problemas materiais e psicológicos. O que se recebe de graça, ou a preço de banana, quase sempre vem com uma etiqueta de preço psicológico – sentimentos complicados de gratidão, concessões na qualidade, a insegurança originada por essas concessões, e outras coisas mais.
Os poderosos aprendem desde cedo a proteger o que têm de mais precioso: independência e espaço de manobra. Pagando o preço real, eles se livram de envolvimentos arriscados e preocupações. Aprenda a pagar, portanto, e bem.
Os vigaristas, em questões de dinheiro, também conhecem o quanto vale a falsa generosidade, o velho truque de ‘dar antes de tirar’. Presenteando de forma adequada, eles colocam a vítima em situação de devedora. A generosidade amolece as pessoas e, infelizmente, também para serem enganadas. Conquistando fama de pródigo, o vigarista ganha a admiração das pessoas sem deixar que elas percebam o interesse torpe. Esbanjando estrategicamente a riqueza, eles encantam os outros, gerando prazer e fazendo preciosos aliados.
O pão-duro não é atraente. Quando envolvido no jogo da sedução, Casanova entregava-se totalmente, não só a si mesmo, mas também a sua carteira. Os poderosos sabem que o dinheiro tem uma carga psicológica e que ele também é o veículo da polidez e da sociabilidade. Eles fazem do aspecto humano do dinheiro uma arma.
Ninguém dez isso melhor do que o charlatão de maior sucesso da nossa era, Joseph Weil, conhecido como “The Yellow Kid”. Desde cedo ele aprendeu que a ganância dos seus semelhantes é que tornava as suas fraudes possíveis. Ele escreveu certa vez:
“Este desejo de conseguir alguma coisa de graça tem custado caro para muita gente que fez negócio comigo e com outros trambiqueiros.... Quando as pessoas aprenderem – e duvido que aprendam – que é impossível ter alguma coisa sem dar nada em troca, a criminalidade diminuirá e viveremos com mais harmonia”.
Durante vários anos, Weil inventou meios de seduzir as pessoas com a perspectiva do dinheiro fácil. Ele lhes oferecia terra ‘ de graça’ – quem resistiria a tal oferta? E depois os otários pagavam caro pelo ‘falso registro da venda !!! Como a terra era ‘de graça’ , pagar tanto por um documento parecia valer a pena. E Yellow Kid fez milhares de dólares com os registros falsos. Em outras ocasiões, ele falava de uma corrida de cavalos combinada, ou de uma ação que daria 200 por cento em poucas semanas, ou por uma pequena quantia vendia conselhos de como ficar milionário,.... A lógica é simples: As pessoas são essencialmente preguiçosas e preferem que o dinheiro lhes caia no colo a ter de trabalhar. A ganância é tão forte que as suas vítimas não enxergavam mais nada. Como dizia Yellow Kid, metade da graça está em dar um lição de moral ensinando que a ganância não compensa.
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Não há situação em que se gaste dinheiro com mais proveito do que quando se é lesado;
pois de um só golpe compra-se a prudência.
ARTHUR SCHOPENHAUER, 1788-1860
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Para cada um que sabe jogar com o dinheiro, VIGARISTA OU NÃO, milhares de outros fecham-se numa recusa suicida de usá-lo com estratégia e criatividade.
Estes são o extremo oposto do poderoso, e você deve aprender a reconhecê-lo – seja para evitar suas naturezas venenosas ou para não ter prejuízo com a sua inflexibilidade.
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Existe um provérbio no Japão que diz:
"Tada yori takai mono wa nai" , ou seja:
"Nada custa mais caro do que aquilo que é dado de graça".
THE UNSPOKEN WAY. MICHIRIRO MATSUMOTO, 1988
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UM PEIXE DE PRESENTE
Kung-yi hsiu, primeiro ministro de Lu, gostava muito de peixe.
O Povo de todo o país, portanto, comprava peixe sempre e queria lhe dar de presente.
Mas kung-yi não aceitava presentes.
Contrário a essa atitude, o irmão mais novo protestou dizendo:
“Você gosta de peixe, por que não o aceita de presente?”
Em resposta, ele disse:
“É porque gosto de peixe que não o aceito de presente. Na verdade, se eu aceitar o peixe, ficarei na posição de devedor. Uma vez nessa posição, às vezes terei de alterar a lei. Se alterar a lei, perco o meu cargo de primeiro-ministro. E, desempregado, talvez não possa mais comprar o peixe. Mas, se eu não aceito o peixe que querem me dar e não for despedido, por mais que goste de peixe, poderei sempre comprar o meu próprio peixe.”
HAN-FEI-TZU, FILÓSOFO CHINÊS, SÉCULO 3 a.C.
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A DOAÇÃO CRITERIOSA
O CASACO FLAMEJANTE
Durante a campanha de Cambises no Egito, muitos gregos visitaram esse país por um motivo ou outro: alguns, como era de se esperar, para fazer comércio, outros para servir no exército, e outros ainda, sem dúvida, por simples curiosidade, para ver o que pudessem ver. Entre esses estava Aeces, filho de Siloson, o irmão exilado de Polícrates de Samos. Enquanto ele estava no Egito, Siloson teve uma sorte extraordinária: caminhava pelas ruas de Mênfis usando um casaco de cor flamejante quando Dario, que na época era membro da guarda de Cambises e não era assim tão importante, o viu por acaso e, com um súbito desejo de possuir aquele casaco, aproximou-se dele e quis comprá-lo.
Era tão óbvia a sua extrema ansiedade para ficar com o casaco que Siloson, inspirado, disse: “Não quero dinheiro. Se quiser, pode levá-lo de graça.” Dario agradeceu muito e levou o casaco.
Na hora, Siloson só pensou que, por ser um sujeito de bom coração, acabara perdendo o casaco. Mas, aí, Cambises morreu, houve a revolta dos sete contra Magus, e Dario subiu ao trono.
Siloson ficou sabendo então que o homem a quem dera o casaco flamejante no Egito era o rei da Pérsia. Correu para Susa, sentou-se à entrada do palácio real e reivindicou o seu direito de ser incluído na lista oficial dos benfeitores do rei. O sentinela de plantão foi falar com Dario, que perguntou surpreso quem era o homem e disse: “Pois certamente como assumi recentemente o trono, não pode ser um grego a quem devo algum serviço. Quase nenhum apareceu por aqui ainda, e sem dúvida não me lembro de dever nada a um grego. Mas traga-me esse homem assim mesmo, para que eu saiba o que significa isso.”
O guarda escoltou Siloson até o rei e, quando os intérpretes lhe perguntaram quem era e o que tinha feito para afirmar ser benfeitor do rei, ele lembrou a Dario a história do casaco e disse que era o homem que o havia dado de presente. “Senhor, exclamou Dario, é o mais generoso dos homens; pois quando eu ainda era uma pessoa sem poder ou importância me deu um presente – pequeno, na verdade, mas que merece de minha parte tanta gratidão quanto os mais esplêndidos presentes que recebo hoje. Retribuirei com mais prata e ouro que conseguirás contar, para que jamais lamente ter feito um favor a Dario, filho de Histapes.”
“Meu Senhor, retrucou, Siloson, não me dê prata ou ouro, mas recupere Samos para mim, minha filha nativa que desde que Oroetes matou meu irmão Policrates estás nas mãos de um de vossos servos. Que Somos seja o seu presente para mim – mas que nenhum homem na ilha seja morto ou escravizado.”
Dario concordou com o pedido de Siloson e despachou uma força sob o comando de Otanes, um dos sete com ordens de fazer tudo o que Siloson quisesse.
AS HISTÓRIAS DE HERÓDOTO, SÉCULO 5 a.C
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A LEI OBSERVADA
Logo depois de fazer a sua fortuna em Paris, no início da década de 1820, o barão James Rothschild enfrentou o problemas mais difícil da sua vida: como um judeu e alemão, um total intruso na sociedade francesa, poderia conquistar o respeito das xenofóbicas classes mais altas francesas? Rothschild era um homem que compreendia os mecanismos do poder – ele sabia que a sua fortuna lhe traria status mas, se permanecesse socialmente alienado, nem o seu status nem a sua fortuna durariam muito. Então ele analisou a sociedade da época e procurou saber o que conquistaria seus corações.
Caridade? Os franceses não queriam saber disso. Influência política? Isso ele já tinha e, além do mais, só fazia as pessoas desconfiarem mais dele. O ponto fraco, ele decidiu, era o tédio. No período da restauração da monarquia, as classes mais altas francesas estavam entediadas. E Rothschild começou a gastar quantias extraordinárias para distraí-las.
Contratou os melhores arquitetos da França para projetar seus jardins e o salão de baile; contratou Marie-Antoine Carême, o mais famoso chefe francês, para preparar festas sofisticadas como Paris nunca tinha visto; nenhum francês; nenhum francês resistiria, mesmo que as festas fossem dadas por um judeu alemão. As noitadas semanais de Rothschild começaram a atrair um número cada vez maior de pessoas. Em poucos anos ele tinha conquistado a única coisa que garantiria o poder a um estrangeiro: a aceitação social.
INTERPRETAÇÃO
A generosidade estratégica é sempre uma excelente arma na construção de uma base de apoio, particularmente para alguém de fora. Mas o barão de Rothschild foi ainda mais esperto: ele sabia que o seu dinheiro é que tinha criado a barreira entre ele e os franceses, dando-lhe uma imagem feia e pouco confiável. A melhor maneira de superar isso era gastar o dinheiro mostrando com esse gesto que dava mais importância à cultura e à sociedade francesa do que ao dinheiro. No final, os saraus do barão simbolizavam o seu desejo de se misturar não só ao mundo de negócios da França mas à sua sociedade também. Ele demonstrou que o seu poder transcendia o dinheiro, entrando pela esfera mais preciosa da cultura.
Em resumo, generosidade estratégica é isso – capacidade de ser flexível com a sua riqueza, colocá-la para funcionar, não para comprar objetos, mas para conquistar o coração das pessoas.
A LEI OBSERVADA
Luis XIV tinha um olho de lince para o poder estratégico do dinheiro. Quando subiu ao trono, a nobreza poderosa vinha recentemente se mostrando um tormento para a monarquia e fervilhava de rebeldia. Então ele empobreceu esses aristocratas fazendo-os gastar quantias enormes para manter suas posições na corte. Tornando-os dependentes da generosidade real para a sua subsistência, ele lhes pôs as garras.
Em seguida, Luis subjugou os nobres com a generosidade estratégica. Era assim que as coisas funcionavam: sempre que notava um cortesão teimoso cuja influência precisava conquistar, ou cujas encrencas queria abafar, ele usava a sua vasta fortuna para amaciar o terreno. Os presentes escorriam pelas mãos de Luis, até que, finalmente, semanas ou meses depois, Luis pedia o favor que desde o início estava querendo. O homem que um dia jurara fazer qualquer coisa para acabar com o rei descobria que tinha perdido o desejo de lutar.
INTERPRETAÇÃO
Luis compreendeu que existe um elemento emocional profundamente enraizado nas nossas atitudes com relação ao dinheiro, cuja origem está lá na infância. Quando somos crianças, todos os tipos de sentimentos complicados no que se refere aos nossos pais giram em torno de presentes; vemos o ato de presentear como um sinal de amor e aprovação. E esse elemento emocional não desaparece. Quem recebe presentes, financeiros ou não, fica de repente vulnerável como uma criança, principalmente se eles vierem de uma autoridade. A pessoa não consegue deixar de baixar a guarda; a vontade cede, como Luis fazia o terreno ceder.
A história mostra, em primeiro lugar, um aspecto essencial do dinheiro: foram os homens que o inventaram, e são os homens que lhes conferem valor e significado. Em segundo, com objetos, assim como com o dinheiro, o que os poderosos prezam mais é o valor sentimental e emocional embutido – aí é que está o valor de possuí-los. A lição é simples: Quanto mais os seus presentes e atos de generosidade jogarem com os sentimentos, mais poderosos eles serão. O objeto ou conceito que joga com uma forte emoção, ou toca uma corda sentimental, tem mais poder do que o dinheiro que você esbanja num presente caro, mas sem vida.
Para ter mais sucesso, o presente deve ser inesperado. Deve ser notável pelo fato de ser inusitado, ou de ter sido precedido por uma certa indiferença/desinteresse por parte de quem o deu. Quanto maior a frequência com que você presenteia determinadas pessoas, mais inútil se torna essa arma porque quando elas não se acostumam com seus presentes e tornam-se monstros de ingratidão, acabam magoadas com o que lhes parece ser caridade. O presente inusitado, repentino, inesperado não estragará seus amigos e os manterá sob o seu domínio.