DA SEDUÇÃO  DOS GANHOS FABULOSOS

 

No Congresso de Viena, em 1814, as principais potências da Europa se reuniram para dividir o que sobrara do Império de Napoleão. A cidade estava alegre e os bailes foram os mais esplêndidos de que se tem memória. Entretanto, pairando sobre os procedimentos estava a sombra do próprio Napoleão. Em vez de ser executado ou exilado para bem longe, ele fora mandado para a ilha de Elba, não muito distante da costa da Itália.

 

mesmo preso numa ilha, um homem corajoso e criativo como Napoleão Bonaparte deixava todo mundo nervoso. Os austríacos planejavam matá-lo em Elba, mas decidiram que seria arriscado demais. Alexandre I, o czar temperamental da Rússia, aumentou ainda mais a ansiedade tendo um ataque quando lhe negaram uma parte da Polônia: "Cuidado, eu solto o monstro!", ele ameaçou. Todos sabiam que ele estava falando de Napoleão. De todos os estadistas reunidos em Viena, só Talleyrand, ex-ministro das Relações Exteriores de Napoleão, parecia calmo e despreocupado. Era como se ele soubesse de algo que os outros desconheciam.

 

Naquele inverno, ocorreu uma série de episódios tão estranhos e dramáticos que poderiam constar do roteiro de uma peça de teatro. Elba foi cercada por navios britânicos, com canhões apontando para todos os pontos de saída possíveis. mas de alguma maneira, em plena luz do dia, no dia 26 de fevereiro de 1815, um navio com seiscentos homens a bordo pegou Napoleão e se pôs ao mar. os ingleses saíram atrás, mas o navio conseguiu escapar. Esta fuga quase impossível deixou as pessoas atônitas em toda a Europa e aterrorizou os estadistas no Congresso de Viena.

 

Embora fosse muito mais seguro sair da Europa, Napoleão não só preferiu voltar à França como se arriscou ainda mais marchando sobre Paris com um exército mínimo, na esperança de reconquistar o trono. Sua estratégia funcionou - gente de todas as classes se atirou aos seus pés. Um exército sob as ordens do marechal Ney correu para Paris a fim de prendê-lo mas quando os soldados viram o seu amado ex-lider, mudaram de lado. Napoleão foi declarado novamente Imperador. Voluntários inchavam as fileiras do seu novo exército. O delírio tomou conta do país. Em paris, as multidões estavam enlouquecidas. O rei que tinha substituido Napoleão fugiu do país.

 

Nos cem dias que se seguiram, Napoleão governou a França. Em breve, porém, a vertigem passou. A França estava na bancarrota, seus recursos quase exauridos e não havia muito o que Napoleão pudesse fazer a respeito. Na Batalha de Waterloo, em junho daquele ano, ele foi finalmente derrotado de vez.  Agora seus inimigos tinham aprendido a lição: ele foi exilado para a ilha árida de Santa Helena, na costa oeste da África. Dali ele não tinha mais esperanças de escapar.

 

INTERPRETAÇÃO

 

Somente anos depois, os fatos da dramática fuga de Napoleão da ilha de Elba foram esclarecidos. Antes de se decidir a cometer este ato de ousadia, ele recebeu a visita de pessoas que lhe disseram que ele continuava mais popular do que nunca na França e que o país o aceitaria de novo. Um desses visitantes foi o general austríaco Koller, que convenceu Napoleão de que, se ele escapasse, as potências européias, Inglaterra inclusive, o receberiam de volta ao poder. Napoleão foi informado secretamente de que os ingleses o deixariam sair e, na verdade, a sua fuga se deu no meio da tarde, bem à vista das lunetas inglesas.

 

O que Napoleão não sabia é que por trás disso tudo estava um homem manipulando as cordas e que este homem era o seu ex-ministro, Talleyrand. E Talleyrand estava fazendo tudo isso, não para trazê-lo de volta aos seus dias de glória, mas para acabar de uma vez por todas com Napoleão.

 

Considerando a ambição do imperador que desestabilizava a Europa, ele havia se voltado contra ele há muito tempo. Quando Napoleão foi exilado para Elba, Talleyrand protestou. Napoleão devia ser mandado para mais longe, argumentou ele, ou a Europa jamais teria paz, mas ninguém escutou.

 

Em vez de forçar a sua opinião, Talleyrand esperou. Trabalhando em silêncio, ele acabou convencendo Castlereagh e Metternich, os ministros do Exterior da Inglaterra e da Áustria.  Juntos esses homens jogaram a isca e Napoleão engoliu. Até a visita de Koller, para sussurrar a promessa de glória aos ouvidos do exilado, fazia parte do plano. Como um perito jogador de cartas, Talleyrand imaginou tudo com antecedência. Ele sabia que Napoleão cairia na sua armadilha. Previu também que Napoleão levaria o país a uma guerra, a qual, dada a situação de debilidade em que se encontrava a França, só poderia durar poucos meses. Um diplomata em Viena, que  compreendeu que Talleyrand estava por trás de tudo, disse: "Ele tocou fogo na casa para salvá-la da peste."

 

MORAL DA HISTÓRIA

 

Cuidado com a sedução de terceiros sobre a possibilidade de ganhos fabulosos. Pode ser que não seja você que esteja dando as cartas !

 

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Quando eu lanço a isca para o cervo, não atiro na primeira corça que aparece, mas aguardo até que todo o rebanho esteja reunido.

 

Otto Von Bismarck, 1815 - 1898

 

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O caçador de ursos não caça a sua presa; é quase impossível pegar um urso que sabe que está sendo caçado, e ele fica feroz se encurralado. Em vez disso, o caçador  coloca armadilhas com iscas de mel. Ele não se exaure nem arrisca a sua vida. Coloca a isca e fica esperando.

 

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Texto compilado extraído de livros dos autores Robert Greene e Joost Elffers